João Cândido foi um dos líderes da Revolta da Chibata, de 1910, que exigia o fim dos castigos físicos na Marinha -  (crédito: Prefeitura de São João do Meriti / Reprodução)

João Cândido foi um dos líderes da Revolta da Chibata, de 1910, que exigia o fim dos castigos físicos na Marinha

crédito: Prefeitura de São João do Meriti / Reprodução

O Ministério Público Federal defendeu a abertura de um processo administrativo para reconhecer o marinheiro João Cândido Felisberto, líder da Revolta da Chibata, em 1910, como anistiado político. Chamado de Almirante Negro, ele foi morto em 1969 e, segundo o MPF, foi alvo de “uma perseguição sem fim” por toda sua vida. O pedido foi enviado para o Ministério de Direitos Humanos e da Cidadania, com um documento formulado pelo filho Adalberto Nascimento Cândido.

 


Com a anistia política, o marinheiro passaria a ter direito às promoções que teria recebido da Marinha se não tivesse sido expulso, em 1912. A decisão também daria direito a uma pensão aos descendentes de João Cândido. Adalberto, filho do Almirante, hoje tem 85 anos. Além da anistia política, o parecer do MPF também solicita a criação de museus sobre sua história.


A Revolta da Chibata foi uma rebelião ocorrida na Marinha brasileira entre 22 e 27 de novembro de 1910, contra os castigos físicos que os militares de baixa patente recebiam. João Cândido se alistou à corporação em 1895, aos 14 anos. Ele criou um comitê clandestino para organizar uma revolta. A ideia era formar grupos nos navios e realizar um motim.


Na época, os marinheiros tiveram suas reivindicações atendidas e a punição com chibatadas foi extinta. Mas, uma semana depois, quase todos foram presos, mortos ou mandados para seringais na Amazônia. Ao ser solto, João Cândido tentou reunir novamente o comitê de marinheiros, mas foi expulso da Marinha.

 


Tempos depois, ele foi detido no Hospital dos Alienados como louco. Em 1912, tornou-se estivador e vendedor de peixes no mercado da Praça XV, em frente ao porto. João Cândido morreu em 6 de dezembro de 1969, aos 89 anos, em decorrência de um câncer.


“Uma série de episódios ocorridos após 1946 indicam não apenas a omissão prolongada do Estado brasileiro em anistiar o almirante negro, mas também uma atuação proativa em vigiar, perseguir e controlar a vida e o legado de João Cândido”, disse o procurador Julio José Araújo Junior.


Esse é o segundo parecer produzido no inquérito civil público, instaurado pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC) no Rio de Janeiro. O órgão acompanha medidas de valorização da memória e do legado do almirante negro, para buscar reparação histórica e enfrentar o racismo no país.


O MPF também encaminhou o documento para a Coordenação de Memória e Verdade da Escravidão e do Tráfico Transatlântico de Pessoas Escravizadas do MDHC. E para a Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados, com pedido de apreciação do Projeto de Lei 4046/2021 (originalmente PLS 340/2018), que prevê inscrição de João Cândido no panteão dos heróis e heroínas da pátria.

O panteão fica na Praça dos Três Poderes, em Brasília. O pedido do MPF cita a pesquisa de Silvia Capanema, que relata episódios de perseguição ao marinheiro enquanto estava vivo, e depois em relação à memória dele.