Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte
O Papa Francisco volta a “gritar” sobre a crise climática, para alertar as pessoas, no mundo todo, sobre a responsabilidade humana a respeito desse grave problema que ameaça o planeta. Esse alerta é indispensável para inspirar ações mais assertivas de governantes, de construtores da sociedade, dos cidadãos. A superação da crise climática exige, especialmente, mais compromisso com a efetivação de um novo estilo de vida, em harmonia com a natureza. Nos últimos 50 anos, houve uma forte aceleração na emissão de dióxido de carbono. No mesmo horizonte trágico, houve um grande aumento da temperatura, em velocidade impressionante, sem precedentes nos últimos 2 mil anos – realidade que tem provocado alarmantes prejuízos para humanidade. Há de se investir na sensibilização do ser humano para tratar adequadamente a crise climática, ou todo o planeta sofrerá as consequências, muitas irreversíveis.
Na exortação apostólica Laudate Deum, o Papa Francisco sublinha que ponderações sobre as mudanças climáticas podem parecer óbvias, mas ainda são necessárias, pois não há suficiente sensibilização para inspirar novas posturas e novos marcos regulatórios dedicados à preservação ambiental. Particularmente triste é esta situação apontada pelo Papa: até mesmo dentro da Igreja Católica existem pessoas resistentes ao adequado tratamento das mudanças climáticas. Há também quem considere assunto de menor importância. Urgente é uma visão mais ampla, capaz de maravilhar-se com o real progresso técnico da humanidade e, ao memo tempo, dedicar atenção aos fenômenos provocados pelo ser humano que causam prejuízos de todo tipo. Não se pode esquecer que a pandemia da COVID-19 e suas consequências tornaram ainda mais evidente a estreita relação da vida humana com os outros seres vivos e com o ambiente, conforme sublinha o Papa Francisco, fazendo um alerta: o que acontece em qualquer parte do planeta repercute em todo o mundo. Por essa razão, o pontífice sempre afirma que tudo está interligado e ninguém se salva sozinho.
De modo especial, o Papa Francisco expressa a sua preocupação com o crescente paradigma tecnocrático que enfraquece o sentido de responsabilidade ambiental de todos. O paradigma tecnocrático está na base do atual processo de degradação ambiental. Aponta-se a existência de um modo desordenado de conceber a vida e a ação do ser humano que arruína a realidade pela força de um equivocado entendimento compartilhado entre as pessoas. O que seria esse entendimento equivocado? Considerar que o bem e a verdade somente são alcançados a partir do poder da tecnologia e da economia. Isso leva à errônea crença de que é possível buscar um crescimento infinito e ilimitado de riquezas, levando a um entusiasmo e a uma preponderância hegemônica de economistas, dos teóricos das finanças e da tecnologia. O paradigma tecnocrático, fortalecido pela inteligência artificial e outros recentes avanços tecnológicos, vem alimentando a ilusória convicção de que não há limites para o ser humano. Esse paradigma alimenta-se, monstruosamente, de si próprio, conforme a indicação do Papa Francisco.
Pensa-se que a tecnologia pode levar o ser humano ao impossível. Há, pois, uma ideologia na base desse entendimento equivocado, quando se pretende aumentar o poder humano para além de tudo o que se possa imaginar. Esse entendimento incapacita a humanidade para a indispensável compreensão de que tudo o que existe é uma dádiva que se deve apreciar, valorizar e cuidar, afirma o Papa Francisco, e não para se tornar escravo ou vítima dos caprichos da mente humana. O “grito” do Papa aponta a necessidade urgente de se repensar o modo como se utiliza e se exerce o poder. Por isso, lembra que nem todo aumento de poder significa progresso para a humanidade. Basta pensar nas tecnologias sofisticadas a serviço do extermínio de pessoas.
O progresso técnico é admirável, mas, lamentavelmente, carrega no seu reverso muitos horrores, pois não tem sido acompanhado de uma irrenunciável responsabilidade: o apreço por valores que direcionam a consciência para um inegociável sentido humanitário. O ensinamento papal, com força de grito, aponta a necessidade de confrontar o paradigma tecnocrático com o entendimento de que o meio ambiente não é simples objeto de exploração e utilização desenfreada. O ser humano deve compreender-se como parte do meio ambiente. Preciosa é a argumentação do Papa que leva a compreender a vida, a inteligência e a liberdade humana como parte da natureza, a serviço do seu equilíbrio. Um planeta saudável depende da adequada interação humana com o meio ambiente, a exemplo do que ocorre na cultura indígena e do que ocorreu durante muitos séculos em diferentes lugares do planeta.
O “grito” do Papa Francisco, convocando, mais uma vez, para se efetivar novo paradigma que priorize a relação equilibrada da humanidade com o planeta, inclui o confronto com o paradigma tecnocrático. Isso significa buscar o desenvolvimento do sentido humanitário que recoloca o ser humano na sua real condição vocacional e missionária. Levar em consideração o “grito” do Papa Francisco é rever critérios e fomentar novas posturas. Seja ouvido o apelo do Papa, inspirando investimentos para salvar a humanidade. Ecoe o “grito” do Papa Francisco.