Os casos de intolerância religiosa não cessam no Brasil. Entre 2021 e 2022, o número de denúncias no país aumentou 106%, sendo a maior parte das vítimas os praticantes de religiões de matriz africana, como umbanda e candomblé. Seis em cada 10 pessoas afetadas são mulheres. Os dados, que fazem parte do 2º Relatório Sobre Intolerância Religiosa: Brasil, América Latina e Caribe, da Unesco, mostram também relatos e informações de casos de intolerância divulgados pela imprensa nos últimos anos. Chama a atenção diversos fatos que ocorreram especificamente no ambiente de trabalho, a exemplo de situações vexatórias impostas pelo empregador ou por colegas de trabalho contra colaboradores.
Embora o “fazer religioso” se restrinja a determinados ambientes, como templos, igrejas, sinagogas, mesquitas, terreiros e, assim por diante, ele também é reflexo do comportamento da sociedade, seja pelas roupas, acessórios, termos e outros códigos. Em um país eminentemente marcado por uma colonização religiosa de base católica, não é raro que em alguns locais públicos alguns rituais, como orações feitas pela manhã, a colocação de uma Bíblia ou imagem cristã em cima da mesa, sejam desenvolvidos sem que haja a preocupação em perguntar se alguém é ou não de alguma outra religião ou crença.
A questão é que se um funcionário faz parte de uma religião que não encontra nenhum preconceito direto, a relação no ambiente de trabalho também tende a ser tranquila, mas o contrário quase nunca é verdade, no caso de religiões afro-brasileiras ou de matriz africana. Daí o fato de determinadas posturas violentas levarem a ocorrências como o assassinato de uma líder quilombola em agosto deste ano, no interior da Bahia, assim como a morte do filho da religiosa, seis anos antes, ainda que a intolerância religiosa tenha sido pano de fundo para outros aspectos.
É verdade que nunca poderíamos pensar o local de trabalho como um espaço de conversão religiosa, mesmo porque as pessoas não estão ali com esse intuito e muito menos é interesse dos empregadores suscitar esse tipo de discussão. Mas é importante destacar que as questões religiosas precisam ser consideradas como pontos fundamentais em programas de diversidade nas empresas, caso contrário corre-se o risco de que o enfrentamento desse tema seja banalizado ou deixado de lado.
Já é mais que sabido que a intolerância religiosa é crime, previsto no Código Penal, e que a liberdade religiosa é assegurada pelo artigo 5º da Constituição Federal. É um erro discutir temas tão sensíveis a uma parte dos seres humanos, a ponto de se eleger qual é a melhor ou a pior denominação religiosa, se Deus existe ou não, qual é o dogma demoníaco ou a verdade universal, quem está certo ou errado. Em religião não há certo ou errado. Há o respeito e a tolerância.