O novo ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, assumiu o cargo com a missão de enfrentar o crime organizado, entre outras tarefas da pasta. Como se sabe, não existe crime organizado sem infiltração das organizações criminosas no aparelho de Estado. Esse é o xis da questão, mas não apenas. A política de segurança pública precisa de novos paradigmas, quando nada porque os resultados obtidos até agora deixam muito a desejar. Quando as coisas estão dando errado, é preciso mudar; se tudo continuar como antes, os resultados serão um novo fracasso.

As tarefas do Ministério da Justiça são complexas: primeiro, a defesa da ordem jurídica, dos direitos políticos e dos direitos constitucionais, da política de acesso à Justiça, do diálogo com o Poder Judiciário e com os demais órgãos de Justiça; depois, a articulação e coordenação das ações do Sistema Nacional de Política sobre Drogas, na qual o governo federal tem a responsabilidade de promover a informação e a capacitação para a repressão do uso de drogas lícitas e ilícitas, além da reinserção social dos dependentes do uso de álcool e de outras drogas.

O Ministério da Justiça também cuida do combate à lavagem de dinheiro e ao terrorismo, da ordem de defesa nacional e dos direitos do consumidor, migrações e refúgio, da política penal do sistema penitenciário brasileiro e da proteção de dados pessoais, dos direitos digitais, da demarcação de terras em território indígena. Mas prioridade hoje é crime organizado. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na posse do novo ministro, chamou o crime organizado de “indústria multinacional”. É mesmo.

“O país e o mundo enfrentam o desafio da criminalidade organizada, como as milícias, subdivididas em inúmeras facções, ora aliadas, ora rivais. Antes restritas às áreas periféricas, hoje elas se desenvolvem em toda parte, à luz do dia, em moldes empresariais”, disse Lewandowski ao assumir o cargo.

O encarceramento em massa, devido ao endurecimento das penas, não resolve o problema, pois os presídios brasileiros se tornaram bunkers dos chefes de quadrilha e, ao mesmo tempo, escolas de delinquência. Exploração da prostituição, tráfico de drogas e de armas, ligações clandestinas de internet, controle da venda do gás e dos jogos de azar só existem porque têm apoio em setores corrompidos da segurança pública e da política.

Tem razão Lewandowski, quando afirma que dificultar a progressão do regime prisional dos detentos, do fechado para o semiaberto e, depois, para o aberto não resolve o problema, somente agrava. Há que se discutir uma nova política antidrogas. Não é um debate fácil, porque o senso comum vai na direção contrária. Mas há exemplos no mundo que merecem ser estudados, entre os quais o de Portugal, que obteve excelentes resultados.

No combate ao crime organizado, a cooperação com estados e municípios, que detém a primazia constitucional na gestão da segurança pública, deve ser ampliada e intensificada, com compartilhamento de dados e trabalho de inteligência, com a plena utilização dos meios tecnológicos disponíveis. A recusa ao uso de câmeras por policiais e suas viaturas em operações, por exemplo, é uma espécie de negacionismo, que mascara uma concepção autoritária de ação policial cujos resultados sempre foram o aumento da violência.

Apesar dos seus limites constitucionais, o governo federal pode fazer muito, por exemplo, integrar esforços para a investigação do poderio financeiro das organizações criminosas e seu modus operandi, por meio da Receita Federal, dos Tribunais de Conta, o Coaf, Detran e outras entidades. O que está acontecendo no cotidiano das grandes cidades, entre as quais São Paulo e Rio de Janeiro, com a ocupação de territórios por traficantes e milícias, está muito próximo de um ponto de não-retorno, incompatível com um Estado democrático, o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança e o bem-estar dos cidadãos.