As boas relações históricas entre Brasil e Portugal passarão pelo teste das urnas neste domingo. O país europeu terá eleições para definir a nova composição da Assembleia da República, e tudo indica que haverá uma forte guinada à direita, depois de oito anos de um governo socialista. Não por acaso há uma grande atenção por parte do Palácio do Planalto quanto ao resultado do pleito, que deve definir maior ou menor proximidade entre os dois países. Caso a opção dos votantes seja por uma direita moderada, representada pela Aliança Democrática (AD), pouco mudará, ante o diálogo aberto entre o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o possível primeiro-ministro Luís Montenegro.

Brasil e Portugal têm agendado para este ano uma reunião de cúpula. A princípio, o encontro aconteceria em abril, em Brasília. Contudo, diante das incertezas eleitorais, optou-se por não bater o martelo sobre a data efetiva do evento. Os dois lados terão de digerir o que sair das urnas. Pelas pesquisas de intenção de votos, a Aliança Democrática não fará maioria no Parlamento. Se confirmado esse quadro, Montenegro terá de buscar apoios para garantir o comando do governo. O Palácio do Planalto teme que o político português acabe se unindo ao partido de ultradireita Chega, de André Ventura. Até agora, o líder da AD nega tal intenção.

Não é apenas o resultado das eleições portuguesas que tem atraído a atenção do governo brasileiro. Em junho, o Parlamento europeu será renovado. E a direita mais radical vem conseguindo mobilizar parte importante dos votantes. Uma Europa mais conservadora tende a se distanciar de países com governos de esquerda, como o Brasil. É preciso lembrar que a ultradireita europeia está por trás das manifestações crescentes de representantes do agronegócio, que são contra o acordo entre o Mercosul e a União Europeia e críticos ferozes de medidas voltadas para o enfrentamento das mudanças climáticas.

Nos Estados Unidos, também são reais as chances de a direita radical voltar ao poder com Donald Trump, praticamente confirmado como representante do Partido Republicano na disputa eleitoral marcada para novembro. Ele aparece com quatro pontos percentuais à frente do democrata Joe Biden, que buscará a reeleição. Essa onda da direita tende a provocar sérias turbulências nas relações entre a maior economia do planeta e a China, com repercussão geral no Sul global. O mundo já não vive seu melhor momento, com duas guerras a perturbar o sono de governantes. Rússia e Ucrânia estão em conflito há dois anos e Israel e o grupo terrorista Hamas se enfrentam numa batalha que já custou mais de 30 mil vidas em cinco meses.

O Brasil, sabe-se, tem muitos problemas internos a resolver, inclusive, o de garantir um crescimento maior da economia. As estimativas caminham para uma expansão de 2% do Produto Interno Bruto (PIB), ainda insuficiente para convencer a população de que o país está no rumo certo. Com um mundo mais conturbado, os desafios brasileiros se agigantam, pois os reflexos das tensões serão sentidos em todo o globo. Países emergentes como o Brasil costumam ser mais castigados por crises internacionais. Não será diferente desta vez, se as disputas entre Estados Unidos e China, por exemplo, se acentuarem.

Resta ao governo brasileiro, em meio a esse quadro de grande incerteza, controlar os ânimos, com medidas que garantam a previsibilidade e deem a máxima confiança possível para que os investimentos produtivos deslanchem e a população em geral se sinta confortável para satisfazer suas necessidades de consumo. Não há espaço para aventuras neste momento. Quanto mais calmaria interna a economia tiver, menor será o contágio perante possíveis crises externas. O Brasil surpreendeu o mundo no ano passado com um crescimento de 2,9%, quando as projeções iniciais apontavam para um avanço de 0,8%. Há chance de uma nova surpresa positiva. Porém, é preciso muita cautela a sangue-frio.

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