As recentes mortes de dois jovens submetidos a procedimentos estéticos evidenciam a existência de um mercado livre de qualquer fiscalização de autoridades sanitárias ou de entidades de classe ligadas à saúde. Em junho, o empresário Henrique Silva Chagas, de 27 anos, morreu em São Paulo após uma sessão de peeling de fenol no rosto. Na semana passada, em Brasília, Aline Ferreira da Silva, de 33 anos, perdeu a vida após aplicação nos glúteos de polimetilmetacrilato, substância conhecida como PMMA, de uso altamente específico e controlado – e não recomendado para tratamentos estéticos. Como já escrito nesta página, em Beleza a qualquer preço (5/7), a disseminação dessas práticas de alto risco para a saúde pública denota uma inadmissível lacuna e leniência das autoridades. É urgente que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e os conselhos regionais e Federal de Medicina, entre outras entidades, adotem medidas rigorosas e inequívocas para limitar ao máximo o uso dessas substâncias de potencial tão nocivo para a saúde, bem como impedir que vigaristas e desqualificados matem ou causem graves lesões em pacientes interessados em algum procedimento estético. O horror cometido em clínicas de estética revela outra face sombria, ainda pouco debatida pela sociedade brasileira: a presença das redes sociais no mercado da vaidade. Em São Paulo, a dona da clínica responsável pelo peeling fatal é conhecida como Natalia Becker, com mais de 200 mil seguidores em uma rede social e um espaço livre para explorar um mercado no qual exibir um corpo esculpido ou um rosto harmonizado significa popularidade, fama e dinheiro. Não se trata aqui, por óbvio, de demonizar a indústria da beleza. É atividade econômica relevante, responsável por milhões de empregos e capaz de contribuir para o bem-estar da sociedade. O que se discute são os desvios, os excessos e as condutas criminosas que contaminam esse mercado. Nesse ponto, é importante refletir, mais uma vez, sobre a responsabilidade das redes sociais. É inegável que elas exercem um apelo cada vez maior em tempos em que muitos estão mais preocupados em exibir uma bela estampa do que compartilhar um conteúdo de qualidade. No Congresso Nacional, onde se empurra com a barriga a regulação das redes sociais, muito se fala sobre o perigo das fake news, em particular no contexto político-eleitoral. Passa em silêncio, contudo, a discussão se é preciso, por exemplo, proibir qualquer propaganda ou divulgação de procedimentos ou tratamentos à saúde nas redes sociais. Contar com a boa fé de charlatães e o excesso de confiança do paciente tem se revelado uma temeridade, particularmente em uma sociedade que tanto valoriza o mercado da vaidade. Assim como existem normas muito claras para a divulgação de substâncias lícitas – como medicamentos, cigarros e bebidas alcoólicas –, é evidente que a popularização de procedimentos estéticos exige um enquadramento regulatório e maior fiscalização. A permissividade reinante nas redes sociais abre um terreno fértil para aproveitadores e sacripantas, ao mesmo tempo em que coloca em risco o legítimo direito da pessoa de querer se enxergar mais bonita – desde que permaneça saudável e viva.