O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completou 34 anos de vigência neste último sábado mantendo-se como um dos dispositivos legais mais completos na defesa dos direitos fundamentais de brasileiros até 18 anos. Princípios como o direito dos jovens à convivência familiar e à participação comunitária, bem como a prioridade na execução de políticas públicas, são alguns pontos basilares do conjunto normativo promulgado em 13 de julho de 1990. Administradores públicos, integrantes das Varas da Infância e da Juventude e especialistas são unânimes em considerar o ECA um instrumento valioso para assegurar cidadania a quem ainda não chegou à idade adulta.

Como lei fundamental na defesa dos direitos da criança e do adolescente, o estatuto adquire importância maior na medida em que o século 21 impõe desafios e complexidades relevantes a serem superados. Exemplo de corolário do ECA é a Lei Henry Borel, de 2022, que estabelece mecanismos de prevenção para denunciar e combater a violência doméstica. Os abusos cometidos em ambiente familiar constituem um dos adversários do ECA. O alto número de denúncias registradas pelo governo federal – foram 145 mil casos somente em 2024, à frente de agressões contra mulheres, idosos e pessoas com deficiência – evidencia como é preciso avançar muito em medidas para impedir que a brutalidade marque uma geração de brasileiros.

Note-se que a violência contra a criança e o adolescente não é apenas intramuros. Passadas mais de três décadas, o país ainda se depara com situações preocupantes, particularmente quando se trata de operações policiais. Na última quinta-feira, durante seminário para lembrar os 34 anos do ECA, o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, fez uma crítica contundente à recente decisão judicial que absolveu três policiais envolvidos na morte de João Pedro Matos no Rio de Janeiro. O jovem de 14 anos foi baleado em casa, durante operação policial. “É uma coisa escabrosa. É um desprezo tão grande à vida humana, de crianças e adolescentes, de um jovem negro, de periferia”, protestou. Em outro episódio, também ocorrido no Rio de Janeiro, o Itamaraty divulgou um pedido formal de desculpas após policiais militares abordarem de forma truculenta filhos de embaixadores negros em um bairro nobre da capital fluminense.

Além das ameaças reais no convívio doméstico e na cidade violenta, as autoridades dedicadas a implementar as diretrizes do ECA alertam para os perigos decorrentes do ambiente virtual. É cada vez mais sonoro o alerta sobre os danos provocados pela superexposição ou pelo despreparo em relação aos meios digitais.  “O uso inadequado da internet pode se tornar um meio de adoecimento físico e mental significativo. É por reconhecer este cenário múltiplo que debatemos o uso consciente de telas e dispositivos, a violência no âmbito digital, as desigualdades digitais, a baixa conectividade e a falta de acessibilidade comunicacional”, alertou Marina Poniwas, presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).

Preservar os direitos dos brasileiros, da primeira infância até a idade adulta, é um dever inalienável do Estado e da sociedade. As dificuldades estruturais do país, somadas à dinâmica de um mundo cada vez mais conectado, exigem uma implementação firme, constante e abrangente de ações ligadas ao ECA que garantam cidadania e perspectiva para a futura geração. São essas crianças e adolescentes que, em poucos anos, se tornarão eleitores e eleitos para tornar o Brasil uma nação mais justa, igualitária e inclusiva.