Sistemas sanitários pouco robustos costumam padecer diante de vírus ameaçadores à saúde humana. Não à toa, durante a pandemia de Covid-19, o Brasil figurou em rankings dos países com maior número de mortos. Dificuldades para o monitoramento do coronavírus e o rastreamento de infectados, além da sobrecarga nas estruturas de atendimento aos doentes, foram apontadas como fatores que levaram ao cenário letal. Mais de quatro anos depois do surgimento do Sars-CoV-2, o país precisa estar atento ao comportamento de outros vírus com potencial para causar novas crises sanitárias e, principalmente, pôr em prática medidas de enfrentamento eficazes.
O mpox é um dos que merecem atenção. A Organização Mundial da Saúde (OMS) ressaltou que o atual surto da doença é considerado uma emergência de saúde pública de importância internacional, mas não “uma nova Covid”, porque as “autoridades sabem claramente como controlar sua disseminação”. Começa a se espalhar, porém, uma cepa do vírus MPXV que, aparentemente, é mais transmissível e perigosa, devido a danos no pulmão, intestino e fígado de infectados. Cientistas da Austrália calculam que a chamada 1B seja até 10 vezes mais letal que a clado 2, responsável pela emergência de saúde decretada pela agência da ONU em 2022.
O Ministério da Saúde instalou um comitê de emergência, na semana passada, para reforçar a vigilância epidemiológica em nível nacional – são 709 casos confirmados ou prováveis da doença neste ano e mais de 10 mil só em 2022 – e anunciou que negocia a compra de 25 mil doses de vacina. Ambas as medidas fazem parte da lista de recomendações da OMS neste novo surto de mpox.
Espera-se postura semelhante no enfrentamento a uma nova variante do HIV que, até o momento, pode ser apenas um problema nacional. Na última sexta-feira, pesquisadores da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) divulgaram a identificação do micro-organismo em amostras de sangue de pessoas soropositivas do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Bahia. Segundo os cientistas, trata-se de uma mistura genética de dois tipos de HIV amplamente difundidos no Brasil que pode ter surgido em um indivíduo e já está presente em, pelo menos, três estados. Não há evidências de que o tratamento atual precisa ser adaptado, mas o grupo enfatiza que é necessário manter os esforços para investigar a variante.
Isso em meio a uma avalanche de doenças respiratórias – os boletins epidemiológicos semanais da Fiocruz têm indicado aumento de casos de síndrome respiratória aguda grave (SRAG) por vírus sincicial respiratório em crianças e adolescentes e por Covid-19 em idosos – e à proximidade de mais uma temporada de dengue. Vale lembrar que, neste primeiro semestre, o país contabilizou mais de 6,1 milhões de casos prováveis da doença e 4.250 mortes, batendo recordes sanitários.
Os impactos das mudanças climáticas, a circulação de subtipos de vírus da dengue em populações imunologicamente desprotegidas e o descompromisso de gestores e cidadãos com as medidas preventivas estão entre os fatores que levaram à situação inédita. Todos eles também são imprescindíveis quando se elabora políticas que contribuam de fato para o bem-estar da população. É indiscutível que não se deve alimentar o terrorismo sanitário que ganhou força com a pandemia. Mas foi a própria Covid que nos ensinou, de forma dolorosa, que, em se tratando de saúde pública, custa muito caro remediar.