É aquela velha história. Quem cuida dos cuidadores? É consenso que os médicos estão precisando de cuidados. E há muito tempo. Quase a metade dos profissionais, especialmente as médicas, apresenta quadros de doença mental, em maior ou menor grau.
Levantamento feito com mais de 2 mil médicos atuantes no mercado, de todas as regiões brasileiras, apontou doenças como depressão, ansiedade e burnout em uma parcela significativa dos entrevistados. De acordo com o estudo “Qualidade de vida dos médicos”, desenvolvido pelo Research Center e apresentado pela Afya, empresa de educação e soluções para a prática médica no Brasil, 39,8% dos profissionais enfrentam algum tipo de doença mental, sendo que duas em cada três pessoas afetadas são do gênero feminino.
Outros aspectos chamam a atenção. Na faixa etária entre 25 e 35 anos, 49,6% dos profissionais sofrem com doenças mentais, ou seja, praticamente metade dos entrevistados. Desses, 3,6% já estiveram internados para tratar alguma condição mental e precisaram ficar afastados do trabalho cerca de 5,1 semanas nos últimos 12 meses. No entanto, boa parte dos “médicos-pacientes” não busca acompanhamento profissional, talvez pelo estigma associado às doenças mentais.
Entre as mais citadas, o transtorno de ansiedade lidera a pesquisa: 33,5% estão com esse diagnóstico e 21,1% apresentaram os sintomas nos últimos 12 meses. Desses, 27,1% estão em tratamento e 6,4%, embora constatado o transtorno, não o tratam. As mulheres são as mais impactadas: quatro em cada 10 médicas sofrem com a doença, enquanto 25,1% são homens. Já 23,9% dos médicos relataram ter sintomas de transtorno de ansiedade, mas sem ter diagnóstico médico.
Em segundo lugar está a depressão: 22,1% dos profissionais já receberam esse diagnóstico, sendo que 19,9% tratam e acompanham com especialistas e 2,2% não tratam. Outros 17,1% apresentam sintomas, mas não têm diagnóstico e não tratam a doença. De acordo com o estudo, 22,4% dos profissionais detectaram a condição nos últimos 12 meses.
O burnout aparece em 6,7% dos casos, e metade foi identificada nos últimos 12 meses. Não fazem acompanhamento 2% dos médicos diagnosticados com a condição. No entanto, em uma avaliação mais ampla, mais de 50% indicam já terem apresentado sintomas da doença, ainda que não tenham um diagnóstico fechado ou já tenham se curado do distúrbio. A carga horária elevada é apontada como o principal motivo destacado: médicos com esse perfil trabalham em média 57,2 horas por semana, cerca de sete horas a mais do que a média geral.
A boa notícia é que os dados indicam uma leve melhora em relação ao último ensaio, realizado em 2022. No entanto, as questões mentais continuam presentes. A partir desses dados, a Afya lançou a campanha: “Está tudo bem?”, para incentivar médicos e estudantes de medicina a buscar ajuda especializada.
Cada vez mais, discussões sobre saúde mental têm ocupado espaço em ambientes corporativos, no meio acadêmico, esportivo, cultural, e em qualquer nível. No caso de quem atua na medicina, é preciso se conscientizar de que também não é infalível. Campanhas de alerta e cuidados devem atingir – e sensibilizar – todos os públicos.