O Brasil está em crise. Uma crise ambiental sem precedentes, e, ao contrário do que muitos acreditam, não por falta de aviso. Perguntas como "Onde está o Ministério do Meio Ambiente?", desviam a atenção do verdadeiro problema: por que, apesar de décadas de alertas, não agimos antes? A crise climática que enfrentamos agora é o resultado inevitável de anos de inação e prioridades equivocadas, e não deve ser reduzida ou polarizada em uma pauta eleitoral.


O campo ambientalista há muito alertava que os impactos da mudança climática chegariam à vida cotidiana das pessoas, alterando as estações, as chuvas e o nível dos oceanos. A realidade dolorosa é que já não é possível evitar essas mudanças. Desde 1972, na Conferência de Estocolmo, cientistas já apontavam o colapso global iminente. No entanto, suas vozes foram ignoradas diante da perigosa ideia de que um crescimento econômico das nações pode ser contínuo para solucionar os problemas da pobreza e desigualdades gerados pelo nosso modelo de desenvolvimento.


Na década de 1980, vale lembrar, inúmeros partidos verdes foram fundados ao redor do mundo, justamente por encontrarem uma barreira tanto nos desenvolvimentistas liberais quanto socialistas, já que ambos modelos seriam ineficientes para barrar os prognósticos evidenciados pela ciência. Nesse sentido, adotamos o conceito de “desenvolvimento sustentável”, a partir da Conferência das Nações Unidas pelo Meio Ambiente de 1992, no Rio de Janeiro, que maquiou a realidade nos fazendo acreditar que era possível manter o ritmo de crescimento e preservar o planeta simultaneamente.


Enquanto discutíamos como minimizar os efeitos do aquecimento global de 1,5°C na década de 1990, as ações concretas só começaram a surgir mais de 20 anos depois com a assinatura do Acordo de Paris em 2015. Apesar desse avanço, já estávamos muito atrasados. Hoje, o objetivo é impedir que a temperatura global aumente mais de 2°C. Embora meio grau possa parecer irrelevante para muitos, essa pequena diferença é a linha tênue entre colapsos ambientais e o funcionamento básico das cidades da forma que conhecemos. É a diferença entre centenas ou milhares de pessoas morrerem por doenças respiratórias derivadas da seca e das queimadas, e poucas ou muitas cidades ficarem embaixo d’água, como visto no Rio Grande do Sul no primeiro semestre do ano.


A responsabilidade por essa crise não pode ser atribuída a um único governo ou figura política. Ela é o resultado de 50 anos de inação e prioridades equivocadas, tanto de governos de direita quanto de esquerda. A ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, tem sido uma das poucas vozes consistentes na defesa do meio ambiente, sempre destacando, ao longo de sua trajetória pública, que nenhum dos lados estava verdadeiramente comprometido com a causa ambiental.


Neste mandato, o governo Lula tem avançado de maneira significativa ao construir um plano mais alinhado com a agenda ambiental, com o desenvolvimento de políticas públicas e estratégias de financiamento para a restauração florestal, além de apoio a projetos de empoderamento local e que buscam aumentar a resiliência das comunidades e territórios afetados. especialmente após anos de desmonte de ministérios e órgãos cruciais como o Ibama, a Funai e o ICMBio. Entretanto, é fundamental relembrar que o campo ambientalista – cientistas, ONGs, ativistas – vêm atuando há décadas frente aos impactos da crise climática, muitas vezes sem apoio ou visibilidade adequada.


Em um ano eleitoral como 2024, em que boa parte das economias do mundo vão às urnas, a crise climática é palco e principal narrativa de muitas eleições. Com cidades sufocadas por fumaça e eventos climáticos extremos, estamos diante de um “novo normal”. A política deve buscar construir políticas públicas que nos ajudem a nos adaptar a essa nova realidade e a mitigar os impactos já em curso. Contudo, polarizar a crise climática como uma pauta exclusiva de um campo político específico não fará mais do que atrasar as soluções necessárias. Não temos mais tempo a perder.


Buscar culpados imediatos pode ser uma resposta compreensível diante do desespero coletivo, mas não resolve o problema. Enfrentar o “novo normal” climático exige aceitar o luto pelo mundo que perdemos e agir com determinação para adaptar e mitigar as consequências que já fazem parte da nossa realidade. As eleições de 2024 devem ser um momento para focar não apenas neste momento da crise, mas em todas as questões que moldam nosso futuro a partir das mudanças do clima, garantindo que não nos deixemos cair novamente na polarização política.

 

Luciana Sonck

Mestra em planejamento territorial, especialista em governança e sócia-fundadora e CEO da Tewá 225