Neste último 11 de setembro, houve poucas razões para comemorar o Dia Nacional do Cerrado. A temporada de incêndios que assola o país há semanas tem devastado o bioma, também conhecido como “coração das águas” e que abrange dez estados e o Distrito Federal. A savana mais biodiversa do planeta se estende por uma área duas vezes menor do que a Amazônia, mas tem enfrentado um calvário equivalente, sem a mesma visibilidade da maior floresta equatorial do mundo.
É no Cerrado que se encontra o estado de Mato Grosso, o recordista em focos de incêndios nesta temporada, com mais de 20 mil ocorrências. É no Cerrado, ainda, que se encontra o conjunto de fatores que leva a uma reflexão sobre as prioridades nacionais em meio à crise climática. O bioma em estado de agonia abriga o coração do agronegócio, tido ora como vilão ora como vítima da tragédia ambiental em curso; reúne uma biodiversidade única, além de ser o epicentro de bacias hidrográficas vitais; e, mais importante, é o ambiente natural onde estão incrustados os Poderes da República.
Pasma e paralisada com o avanço destruidor das chamas, a fumaça que encobre cidades inteiras e as doenças respiratórias provocadas pelo ar seco e com fuligem, a opinião pública assiste a uma ação descoordenada das autoridades brasileiras. O Executivo tem mostrado certo grau de diligência no enfrentamento da tragédia, embora esteja patente que o esforço tem sido insuficiente para conter as queimadas. O Judiciário, particularmente na figura do ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino, tem cobrado providências da União e dos estados para combater o que o magistrado diagnosticou como “pandemia de incêndios” a castigar o país. E o Legislativo? Está omisso. Os parlamentares estão mais preocupados com as eleições municipais ou com a sucessão na Câmara dos Deputados, marcada para fevereiro de 2025. Está evidente que o Congresso Nacional tem prioridades outras do que a calamidade ambiental que se abate sobre o país.
Em uma iniciativa que remete aos tempos de outra catástrofe nacional – a pandemia de COVID-19 –, setores da sociedade civil estão empenhados em sensibilizar o poder público sobre a agonia do Cerrado. Na semana passada, representantes de entidades científicas e do terceiro setor entregaram ao presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, a Carta de Brasília 2024 em Defesa do Cerrado. No documento, os signatários afirmam que o bioma tem sido negligenciado há décadas, e as consequências estão cada vez mais próximas de se tornarem irreversíveis.
Entre as propostas para salvar o Cerrado, há uma sequência tão didática quanto desafiadora. Primeiro, é preciso interromper o processo de aniquilação do bioma, por meio de combate rigoroso a ações criminosas e à negligência. Em seguida, urge implementar políticas e práticas para abolir o modelo predatório de exploração econômica e estimular o desenvolvimento sustentável. Por fim, faz-se essencial manter uma campanha permanente de valorização e preservação do bioma, em nome das futuras gerações e da sobrevivência do patrimônio ambiental brasileiro.
Em alto e bom som, o Cerrado pede socorro. É dever do Estado e da sociedade atender a esse chamado.