Dom Walmor Oliveira de Azevedo

Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte

 

“A esperança é a última que morre”, eis um ditado popular muito repetido, em diferentes circunstâncias. Mas a esperança não pode morrer nunca. Ela é uma virtude, luz luzente em horizontes tomados por obscuridades e variados desafios. A esperança possibilita ao ser humano encontrar as respostas de que necessita para viver com mais dignidade. Assim, a esperança deve ser sempre fortalecida, pois, sem ela, a família humana sofre com o caos, na contramão da razão, inviabilizando o alcance do sentido que sustenta o viver. Cultivar a esperança exige abrir-se, sempre mais, à reconciliação e ao exercício da paciência – para que oportunidades de edificação da paz não sejam perdidas. É preciso saber esperar, e não desistir da busca por essas oportunidades, encontrando uma força que está além dos próprios recursos, enraizada na espiritualidade e na fé.

A paz, para ser alcançada, precisa ser esperançada – alimentada na certeza de que o semelhante também tem necessidade e está na busca pela paz. Sem essa convicção, o ser humano torna-se, facilmente, contaminado pelo ódio e pelo anseio por vingança. Passa a agir, assim, na contramão do caminho para a paz. De fato, sem o amor, o amor maior que vem de Deus, a paz torna-se meta inalcançável, pois trata-se de componente essencial aos diálogos e à iluminação que vem da inteligência humana. O amor é capaz de vencer o medo que paralisa e que desencadeia conflitos complexos, promovendo a escalada da violência que dizima vidas, nações, culturas. O temor e a mágoa no coração humano precisam ser tratados com o amor de Deus, de incidência radicalmente restauradora. A partir do amor, o ser humano qualifica-se para fraternalmente se aproximar de seu semelhante. E lembra o Papa Francisco, em preciosa indicação: a cultura do encontro tem o poder de romper com o tom destrutivo da cultura da ameaça. Ameaças são capazes de amedrontar e inspirar respostas odiosas, sangrentas, que negam o sentido da fraternidade universal.

Em direção oposta, a cultura do encontro possibilita diálogos e entendimentos pela indispensável experiência de colocar-se no lugar do outro, particularmente daquele que é pobre, vulnerável, inocente e indefeso. A dinâmica de colocar-se no lugar do semelhante alarga horizontes. É investimento humanístico indispensável e inigualável para encontrar caminhos de esperança. Fechar-se nos horizontes estreitados por ideologias, por sentimentos mesquinhos e egoístas, impossibilita trilhar o caminho da paz, pois é atitude que distancia o ser humano da esperança. Inscreve-se, pois, como estação importante investir nos gestos de reconciliação, para debelar o ódio, acabar com distanciamentos ou com a disponibilidade para estabelecer inimizades.

Esperançar a paz é, pois, um compromisso cidadão e de fé muito relevante. Esse compromisso exige a revisão do próprio comportamento. O comportamento humano há de ser balizado por uma qualidade espiritual e humanística que se expressa a partir da competência para dialogar e bem exercer a solidariedade, fecundando de paz as páginas do cotidiano de cada pessoa – consequentemente, da sociedade. Trata-se de uma urgência, especialmente quando são considerados os muitos cenários de guerra no mundo contemporâneo, gerando perdas irreversíveis – de vidas humanas e de dons da Criação, com mapas dolorosos marcados pela fome e pela exclusão social. A sensibilidade para dialogar e bem exercer a solidariedade alimenta sabedorias essenciais ao equilíbrio sociopolítico. Cultivar a esperança, sabendo se colocar no lugar do outro, exige o compromisso de lutar para que sejam mudados os cenários que desrespeitam a dignidade humana, privando muitos homens e mulheres, crianças e idosos do direito à autonomia social e política. Ferindo ainda o direito à liberdade religiosa, em razão de conflitos civis, internacionais, com gente desalmada regendo processos e tomando decisões. As guerras, frequentemente, são consequências da falta de respeito em relação às diferenças do semelhante. Os caminhos de esperança são percorridos quando se procura exercer a fraternidade, alimentando diálogos, construindo relações de confiança. Diálogos que não são, simplesmente, exercício de diplomacia. Constituem investimento daqueles que se inserem no mundo para atuar como artesãos da paz.

Neste dia em que se celebra a memória de São Francisco de Assis, tenha-se presente que a conversão ecológica, uma urgência, é também caminho de esperança. O modo abusivo que caracteriza a relação da humanidade com a natureza já traz sintomas amargos, como a escassez de chuvas ou, ao contrário, as graves enchentes. O ser humano tem sido muito despótico no tratamento da Criação, agindo de modo infiel a Deus, sem respeitar a tarefa de bem exercer a regência de toda a obra do Criador. Falta à humanidade uma sabedoria engolida pela ambição desmedida e pelos estilos de vida esbanjadores. Verifica-se que a hostilidade presente na relação com o semelhante também se repete no tratamento com o planeta. É preciso reconciliar-se com o próximo e com a Criação, pela escuta e contemplação do mundo. Assim, reaprender a fazer da Terra uma casa comum, onde todos podem habitar harmoniosa e dignamente. A preservação da vida de todos precisa de uma conversão integral, transformando relações, tendo o Criador como referência – fonte única e inesgotável do amor que tudo modifica na ótica do bem. Eis o convite para se trilhar em caminhos de esperança.