A violência, já considerada um traço da sociedade brasileira, presente em espaços públicos e privados, afeta uma categoria até então considerada inabalável pela função que desempenha: a dos médicos. Um levantamento divulgado esta semana pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) tomou por base a quantidade de boletins de ocorrência (BOs) registrados nas delegacias de Polícia Civil dos estados brasileiros e do Distrito Federal entre 2013 e 2024. Os dados mostram que o volume de queixas vem aumentando a cada ano.

Desde 2013, o CFM apurou que foram contabilizados 38.074 boletins de ocorrência (BOs) em que médicos relataram terem sido vítimas de ameaça, injúria, desacato, lesão corporal e difamação, entre outros, em locais públicos como unidades de saúde, hospitais, consultórios, clínicas, prontos-socorros e laboratórios. Há, inclusive, registros de mortes suspeitas de médicos dentro de estabelecimentos de saúde. Desse total, há um certo equilíbrio no quesito gênero, sendo que 47% dos registros foram contra mulheres. A média de idade dos médicos que sofrem algum tipo de violência nos estabelecimentos de saúde é de 42 anos.

Enquanto em 2013 foram registrados pouco mais de 2,6 mil BOs em que um profissional da categoria sofreu algum tipo de violência enquanto trabalhava, seja num ambiente hospitalar público ou privado, esse número subiu para 3,9 mil casos em 2023, o que significa dizer que, em média, apenas no ano passado, foram contabilizados 11 boletins de ocorrência por dia no país por conta de situações de violência contra médicos no local onde atuam. A média é de um incidente a cada duas horas.

Em termos de localização, a distribuição de ocorrências entre cidades (sem considerar região metropolitana) mostra que 66% dos casos ocorreram no interior. São Paulo lidera o ranking dos estados, com 18.406 casos em 2023, seguido pelo Paraná (3.935), Minas Gerais (3.617), Rio de Janeiro (1.589), Santa Catarina (1.542) e Pernambuco (1.340). Entre os estados com o menor número de ocorrências estão Amapá (174), Espírito Santo (134), Tocantins (117), Paraíba (68), Maranhão (5) e Acre, sendo que nesse último não houve nenhum caso registrado, talvez pelo fato de a população ser relativamente pequena, inferior a 1 milhão de habitantes.

Em contrapartida, há que se ressaltar que parte dos estados que apresentaram o menor número de ocorrências contra a categoria tem também a menor densidade de médicos do país, a exemplo do Acre – com menos de dois médicos por 1 mil habitantes, 1,41; e o Maranhão, com 1,22.

Com o levantamento, o CFM recomenda que o profissional não fique calado e denuncie os abusos. O conselho também exige que providências urgentes contra a violência sejam tomadas, desde a preservação da segurança física desses profissionais, especialmente nas instalações das instituições da rede pública (onde ocorre o maior número de registros), quanto a garantia de condições de trabalho para que a categoria possa exercer a atividade médica e o acesso dos pacientes a um direito fundamental, que é a saúde.