Natalia Tsuyama
Especialista em políticas públicas


Túlio Ribeiro
Cientista político e internacionalista

 

Nos últimos dias 18 e 19, o Brasil sediou a tão aguardada cúpula de líderes do G20, um grupo composto pelas 19 maiores economias do mundo, juntamente com a União Europeia (UE) e, pela primeira vez, com a União Africana (UA), em que se discutem propostas sobre os rumos do mundo, buscando apontar caminhos para o futuro das relações internacionais.


Neste ano, teve como especial foco o combate à fome e às desigualdades, o desenvolvimento sustentável e a transição energética, e a reforma da governança global. Ao final dos debates, a declaração foi assinada, e as expectativas eram altas, principalmente por parte dos diversos grupos de engajamento que trabalharam incansavelmente durante o ano para tentar influenciar o texto acordado. Mas o questionamento para a população no geral é: o que realmente muda?. O que a declaração dos líderes do G20 Brasil significa para a nossa realidade global, e como pode impactar o Brasil, que se posiciona como mediador entre os países mais desenvolvidos e em desenvolvimento do grupo?


Como anfitrião do evento, nosso país se destacou ao promover um debate sobre justiça social e combate às desigualdades, alinhando-se aos interesses do Sul Global, e obtendo consenso na declaração final. No entanto, o que pode ser celebrado como um grande feito da diplomacia brasileira também teve seus custos, já que, ao ter que conciliar interesses de nações tão divididas em tantos temas no mundo contemporâneo, a declaração final falta com ambição. As promessas feitas na cúpula não são suficientes para garantir uma necessária reforma no sistema de financiamento climático e da governança global. É nesse contexto de falta de ambição que caminharemos para a próxima presidência do grupo: a África do Sul, sendo a última de um país do sul-global, e a primeira de um país africano, antes de passarmos o bastão para os Estados Unidos presididos por Donald Trump, que se opõe às discussões multilaterais.


Após concluir a presidência do G20, os internacionalistas brasileiros ainda não podem tirar suas merecidas férias. Ainda temos que lidar com uma longa jornada, rumo à presidência do Brasil nos Brics e da COP30. Saímos dessa primeira provação, o G20, com entregas históricas e colocando o Brasil como uma nação chave na diplomacia internacional. Contudo, a questão que persiste é: o que acontecerá após os compromissos feitos nas cúpulas internacionais? A resposta vai depender da capacidade dos líderes mundiais em transformar os compromissos em ações e principalmente ações concretas.


Nesse sentido, se o governo brasileiro se posicionar como um dos que realmente irão conduzir tais compromissos rumo à concretude, o Brasil tem, mais uma vez, uma oportunidade de ouro de se tornar referência nos temas que são caros à política externa brasileira atual. Para isso, o melhor caminho é, certamente, a boa condução de políticas domésticas por parte do Poder Executivo, que sirvam de exemplo para o resto do mundo, além de um chamado para que outros atores se envolvam ativamente nessas agendas, em especial a Câmara dos Deputados e o Senado.


No que tange aos compromissos ambientais, o documento final reforçou o compromisso dos países com a sustentabilidade ambiental e climática, e uma boa maneira de consolidar isso seria aprimorar as políticas nacionais de enfrentamento às secas e enchentes – evitando situações como a do Rio Grande do Sul e das intensas queimadas no Sudeste deste ano, além da persistência do quadro de diminuição do desmatamento na Amazônia, e de políticas mais incisivas para a preservação do Pantanal. Da parte do Legislativo, é imprescindível que o Congresso – de maioria conservadora – entenda a pauta ambiental como a mais urgente que temos nos dias de hoje, e pare de travar as discussões na área, como aconteceu com a recente tentativa de aumentar as penas para crimes ambientais no país. Com isso, o Brasil tem condições de ditar – para além do discurso – ainda mais os rumos da agenda da COP do ano que vem, se consolidando, inclusive, como um polo de atração de investimentos internacionais em energia limpa e sustentável.


Já em relação à Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza, o Brasil já sai maior do que nunca como liderança no tema, tendo incluído demandas ousadas, como a proposta de taxação dos super-ricos. De acordo com os dados do Relatório das Nações Unidas sobre o Estado da Insegurança Alimentar Mundial (SOFI, 2024), divulgado no último mês de julho, a insegurança alimentar severa caiu 85% no Brasil em 2023, tendo melhorado em relação aos anos anteriores. No entanto, o dado animador não anula o fato de que o país tem na desigualdade social o seu maior desafio histórico, cabendo ao governo atual o enfrentamento direto à desigualdade por meio de novas políticas públicas relacionadas ao tema (um exemplo seria, justamente, a taxação de bilionários a nível doméstico). Não é de se duvidar que já existam boas ideias nesse sentido, mas, novamente, ainda é preciso um apelo mais incisivo na relação com o Congresso para que tais temas sejam efetivamente discutidos e, de alguma maneira, aprovados.


Em suma, o Brasil pode aproveitar ainda mais o sucesso da presidência do G20, ao assumir a presidência dos Brics, no ano que vem, assim como receber a próxima COP, em Belém, consolidando-se ainda mais como uma liderança internacional. Os próximos passos envolvem mais do que continuar o diálogo iniciado na cúpula do G20, sendo preciso garantir que o Brasil não apenas lidere coalizões globais, mas também implemente políticas internas alinhadas às prioridades debatidas.


Ao equilibrar a atuação em conferências globais com avanços internos, nosso país pode não apenas fortalecer sua posição no cenário internacional, mas também alavancar mudanças estruturais em outras regiões. Essa é a hora de transformar discursos em resultados palpáveis para a população, seja na preservação ambiental, na luta contra as desigualdades ou na criação de um sistema econômico mais justo. Se o Brasil aproveitar esse momento com a ousadia necessária, poderá marcar uma nova era de protagonismo global, mostrando que é possível aliar crescimento econômico não só à sustentabilidade, mas à justiça climática e social. O futuro não está apenas em declarações dos líderes mundiais, mas também nas ações. É na implementação de acordos e políticas que moldaremos um mundo mais inclusivo e sustentável.