Segundo um velho jargão do planejamento estratégico e da boa governança, quando algo está dando errado, se as mesmas coisas forem feitas, continuará dando errado. É o que acontece com a segurança pública no nosso país, que não consegue conter o crime organizado nem a violência. A territorialização do crime organizado, com ocupação de grandes áreas urbanas das nossas cidades, e a internacionalização das organizações criminosas, principalmente as que comandam o tráfico de drogas, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV), nos mostram que estamos enxugando gelo.


Não existe crime organizado sem infiltração no aparelho de segurança do Estado, o que frustra as políticas de segurança pública e tornam vulneráveis as ações repressivas. Não se trata apenas de fechar os olhos às atividades criminosas, como a contravenção e o tráfico, mas de agentes públicos participarem do que acontece, como se viu no caso da vereadora Marielle Franco. O delegado Rivaldo Barbosa, então chefe da Polícia Civil fluminense na época das investigações, é réu. Os acusados de serem os mandantes também são autoridades: os irmãos Chiquinho, deputado federal, e Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro.


Na quinta-feira, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva apresentou uma proposta de reforma do sistema de segurança pública cujo objetivo central é aumentar a cooperação entre a União e os estados no combate ao crime organizado. A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Segurança Pública, apresentada pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, sugere alterações nos artigos 21, 22, 23 e 24 da Constituição Federal. Trata-se de dar status constitucional ao Sistema Único de Segurança Pública (Susp), criado durante o governo do presidente Michel Temer, por proposta do então ministro da Segurança Pública Raul Jungmann.


A proposta atribui à Polícia Federal a investigação de organizações criminosas e milícias com repercussão interestadual e internacional. A Polícia Rodoviária Federal (PRF) passaria a ser chamada de Polícia Ostensiva Federal, com competência para atuar em rodovias, ferrovias e hidrovias federais, além de prestar auxílio às forças de segurança estaduais. A emenda também propõe a unificação do Fundo Nacional de Segurança Pública e o Fundo Penitenciário, permitindo que mais recursos sejam utilizados no sistema prisional, onde se sabe que estão os líderes das principais facções criminosas. O governo busca, ainda, uniformizar protocolos de segurança, como boletins de ocorrência e certidões de antecedentes criminais.


Entretanto, a reforma enfrenta resistência de governadores, que sugeriram mudanças no projeto para combater a lavagem de dinheiro, por exemplo. Tarcísio de Freitas (SP) propôs a estadualização das leis penais. Elmano de Freitas (CE) argumenta que deixaria o arcabouço jurídico-legal do país ainda mais confuso. Ronaldo Caiado (GO) queixa-se da perda de autonomia. Três governadores não foram à reunião: Romeu Zema (MG), Ratinho Júnior (PR) e Jorginho Mello (SC).


Negociar com os governadores é muito importante, mais ainda com os 308 deputados federais e 49 senadores que aprovarão a emenda constitucional. A oposição teme perder controle sobre a atuação das polícias civil e militar. Alguns se queixam de vazamento de dados ao compartilhar as informações com outros estados, sobretudo os notoriamente infiltrados pelo crime organizado, como é o caso do Rio de Janeiro.


O governo Lula enfrentará desafios para convencer a oposição a apoiar a reforma, mas a medida é vista como um passo importante para combater o crime organizado e o fortalecimento da segurança pública no país. É exatamente por isso que o sistema de segurança pública deve ser reformado, pois é preciso ajuda federal àqueles que perderam o controle da situação.

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