Rodrigo Augusto Prando
Professor e pesquisador da Universidade Presbiteriana Mackenzie
No último dia 13 de novembro, a capital federal, Brasília, especialmente a Praça dos Três Poderes, defronte ao Supremo Tribunal Federal (STF), foi palco de um novo ataque contra as instituições e, dessa vez, o resultado foi a morte do agressor, Francisco Wanderley Luiz, conhecido como Tiü França, um chaveiro que concorreu ao cargo de vereador em sua cidade, Rio do Sul (SC).
O ex-candidato foi até Brasília com seu carro e nele havia quilos de explosivos, mas apenas uma parte conseguiu ser detonada. Na sequência, dirigiu-se ao STF, onde disparou alguns artefatos e, em um ato final, deitou-se em um dos explosivos que, detonado, o levou à morte.
Antes mesmo da perícia, os jornalistas já tinham tido acesso ao nome, endereço, familiares e seu histórico, mormente, nas redes sociais. Luiz nutriu-se em um ambiente – virtual e, provavelmente, real – de discurso de ódio, no qual o adversário político é transformado em inimigo e, na lógica bélica, inimigo deve ser eliminado.
Ademais, sua conduta vai se radicalizando e seu ódio, não mais retórico apenas, é direcionado ao SFT e, em particular, ao ministro Alexandre de Moraes que, segundo depoimento da ex-mulher de Luiz, havia, por parte dele, a intenção de matar Moraes e, depois, se matar. Cumpriu parte de sua missão. O busílis é que, desta feita, não foi apenas o patrimônio das sedes dos Três Poderes que sofreu danos, como se deu no 8 de janeiro de 2023, mas uma vida foi perdida.
Francisco Wanderley Luiz construiu seu plano, compartilhava suas ideias nos grupos dos quais participava e, segundo sua ex-esposa, tinha obsessão por eliminar Moraes e que, ainda, quase a deixou louca, pois só falava de “política, política e política”. A ação violenta e extremada de Luiz chegou em péssimo momento para o bolsonarismo e para o ex-presidente Jair Bolsonaro, visto que, há pouco, estavam todos efusivos com a vitória de Donald Trump, nos EUA, e, com isso, crendo em uma possibilidade de anistia aos presos do 8 de janeiro e, não menos importante, conseguir a reversão da inelegibilidade de Bolsonaro.
Politicamente, essa agenda (anistia e reversão da inelegibilidade) perde força; juridicamente, as respostas dos ministros do STF foram contundentes. Alexandre de Moraes asseverou não se tratar de um “lobo solitário” ou mero suicídio, mas de um evento articulado e que se iniciou, segundo suas palavras, lá atrás, com o famigerado “gabinete do ódio”, tendo sequência com os ataques do 8 de janeiro e, agora, com as explosões e morte na Praça dos Três Poderes. Nas palavras de Moraes: “não existe possibilidade de pacificação com anistia a criminosos”. Discurso mais claro não há.
Para além das dimensões política e jurídicas do ato, há, não menos importante, uma possível análise sociológica, amparadas em dois autores clássicos da Sociologia: Émile Durkheim e Max Weber. Durkheim, em sua obra acerca do suicídio, constitui uma tipologia e, no caso em tela, teríamos o chamado suicídio altruísta (também nomeado de suicídio heroico ou religioso), pois graças à força do grupo frente ao indivíduo, este não faz valer seu direito à vida e se mata por imperativos sociais e pela sua forte ligação ao grupo que pertence (exemplos: homens bombas, kamikazes etc.). Já Weber ao focar no sentido que os indivíduos atribuem às suas ações sociais aduziria que houve uma ação social racional com relação a valores, já que o ator sabia, racionalmente, o resultado a ser atingido, bem como usou os meios adequados para tal intento e, por fim, teve sua motivação ligada aos valores que considera fundamentais em sua vida, uma ética da convicção, por assim dizer, assentada em uma ideologia extremista.
O extremismo político – no caso, valores de uma extrema direita – alicerçado no discurso de ódio, fake news, negacionismo, pós-verdade e teorias da conspiração criam um ambiente tóxico para a democracia, em um coordenado ataque aos pressupostos civilizacionais e às instituições. Temos – e teremos – assegurada a liberdade de expressão e, paralela a esta, a responsabilidade por nossos discursos e ações. O momento reclama cautela e maior presença do Estado Democrático de Direito e não de ódio e violência.