Uma mulher morre a cada 10 minutos vítima do parceiro ou de familiares, revela o relatório da ONU Mulheres divulgado ontem. Ao longo do ano passado, 85 mil foram assassinadas intencionalmente. Pelo menos 60% desses crimes ocorreram dentro do ambiente familiar, cometidos pelo marido ou pelo ex-companheiro. O feminicídio não tem nacionalidade. Ocorre em todo o planeta e em quaisquer camadas sociais ou faixas etárias.


No Brasil, em 2023, foram registradas 1.463 vítimas, um aumento de 1,6% na comparação com 2022, conforme levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Na série histórica do FBSP, esse foi o maior número desde a entrada em vigor da Lei nº 3.104/2015, a Lei do Feminicídio. Entre 2015 e 2023, 10.655 perderam a vida em razão dessa hedionda covardia dos homens – marido, namorado ou ex-companheiro, casado ou não com a vítima.


O Centro-Oeste aparece como a região mais violenta para as mulheres, com uma taxa de 2 mortes por 100 mil – 43% acima da média –, seguido pela Região Norte, com taxa de 1,6/100 mil mulheres, pelo Sudeste (1,2), Nordeste (1,4) e Sul (1,5). Em números absolutos, o Distrito Federal registrou 34 feminicídios em 2023 – 78,9% a mais do que no ano anterior. Em Minas Gerais, no mesmo período, ocorreram 183, contra 171 em 2022 – aumento de 7%.


Números tão expressivos no Brasil e lá fora exigem uma reação com proporções equiparadas. Nesse sentido, a ONU Mulheres iniciou ontem a campanha 16 dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra as Mulheres, uma iniciativa global que começa no Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres e termina no Dia Internacional dos Diretos Humanos. No Brasil, há campanha semelhante, mas estendida: o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) começou a mobilização de 21 dias no feriado nacional da Consciência Negra, em 20 de novembro.


Essas iniciativas têm relevante importância, sobretudo para alertar o universo feminino e, ao mesmo tempo, cobrar do poder público políticas, programas e ações que garantam segurança às mulheres. São demandas que se impõem, como revela a pesquisa Medo, ameaça e risco: percepções e vivências das mulheres sobre violência doméstica e feminicídio, realizada pelo Instituto Patrícia Galvão e Consulting do Brasil, com apoio do Ministério das Mulheres, e também divulgada ontem.


A sondagem estima que 17 milhões de brasileiras viveram, ou vivem, o risco de serem vítimas de feminicídio. Há ainda uma sensação de desproteção e desamparo: 84,5% das entrevistadas responderam que “não adianta a mulher ter uma medida protetiva se o agressor não respeita e a polícia não garante a segurança dela”. Na compreensão de 60%, “todo feminicídio pode ser evitado se a mulher receber proteção do Estado e da sociedade”.


A cultura de que a mulher é um objeto de propriedade do homem ainda é muito forte no país e alimentada pela discriminação, que leva à rejeição da paridade e da igualdade de gêneros nos mais diferentes escalões nos órgãos públicos e nas empresas privadas. A falta de uma educação alinhada com a contemporaneidade contribui para calcificar essa inverdade prejudicial e letal nas relações de gêneros.
Os organismos de Estado se reúnem, debatem, planejam políticas, mas não eliminam a sensação de que tais providências são ineficazes, pois a matança de mulheres por homens covardes é rotineira. É hora, portanto, de rever estratégias e ações, até agora inócuas, e construir políticas públicas que, realmente, protejam a vida das mulheres. 

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