Figurando entre os maiores produtores de lixo do mundo, o Brasil tem dificuldades para cuidar das próprias sobras. Gera por ano mais de 80 milhões de toneladas de resíduos, mas recicla apenas 4% desse total, segundo relatório da Universidade de São Paulo (USP). Como se não bastasse o problema interno, o país tem a prática de importar a sujeira dos outros.


Dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) mostram que, só nos cinco primeiros meses deste ano, foram compradas 28,3 mil toneladas de lixo internacional. A importação tem como principal justificativa o menor preço dos materiais de fora, quando comparados aos coletados aqui. Mas, além de contraditória, evidencia que os ganhos financeiros seguem ofuscando as prioridades climáticas e ambientais.


A questão do plástico deixa o contrassenso evidente. Em 2023, enquanto reciclou apenas 28% das embalagens descartadas, conforme o Movimento Plástico Transforma, o Brasil trouxe para casa 3,4 mil toneladas de sobras produzidas por outros países. Um dos principais vendedores é os Estados Unidos, que compartilha conosco a alta produção – somos o quarto produtor do mundo e eles, o primeiro – e o baixo reaproveitamento – 5% dos resíduos plásticos domésticos foram reciclados no país, em 2021, segundo o Greenpeace.


A venda de lixo para o Brasil contempla outros materiais – vidro, papel e alumínio –, que são usados como matéria-prima secundária para a produção de itens com material reciclado. Há, dessa forma, um impacto na chamada economia circular, que, entre os seus princípios, tem a adoção de processos que beneficiem diretamente os mais vulneráveis aos efeitos da produção e do consumo – nesse caso, as comunidades atingidas pelo descarte irregular e os catadores que abastecem a indústria da reciclagem.


Patrícia Iglesias, professora e superintendente de gestão ambiental da USP, ressalta outro ponto da importação de lixo que desperta preocupação: a forma como eles chegam ao país. "Esses resíduos vêm de navio. Então, os impactos vão das emissões de carbono, riscos de acidente, contaminação tóxica, até a falta de rastreabilidade dos resíduos", adverte.


Não se pode desconsiderar que o problema era mais grave. Entre 2019 e 2022, devido à alíquota zero implementada na gestão de Jair Bolsonaro, a importação desses resíduos alcançou o maior número. O atual governo aumentou a taxa de importação para 18%, na tentativa de desincentivar a prática. Nesse sentido, espera-se que a Presidência da República sancione o projeto de lei proibindo a importação de resíduos sólidos, aprovado nesta terça-feira no Senado.


Não só isso. A conta segue aberta sem um setor privado que entenda as práticas de ESG (Ambiental, Social e Governança, na sigla em português) para além das estratégias de marketing. A adoção de embalagens retornáveis, a incorporação da reciclagem nos processos produtivos e o descarte correto do mínimo possível de resíduos são algumas das estratégias com benefícios que extrapolam os balanços financeiros. 

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