editorial

Faltou decoro na troca de Nísia

Nísia foi alvo de um longo e desnecessário processo de fritura, costurado por aliados e reportado pela imprensa. A dinâmica se assemelha à substituição de outra

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Durante o evento de sanção da lei do Mais Médicos, em julho de 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi categórico ao avisar aos interessados em mexer no comando do Ministério da Saúde: “Tem pessoas e funções que são uma coisa da escolha pessoal do presidente da República. Eu já disse publicamente: a Nísia não é ministra do Brasil, ela é minha ministra".

Nesta terça-feira, cerca de um ano e meio depois, também em um evento para anunciar políticas da pasta – dessa vez, uma vacina contra a dengue 100% nacional –, não faltou demonstração de estima a Nísia Trindade. Mas vinda de outra frente. A ministra foi ovacionada por servidores da pasta presentes no salão do Palácio do Planalto e, com voz trêmula, fez um discurso com tom de despedida. Lula ficou em silêncio. Horas depois da cerimônia constrangedora, a demissão foi anunciada.

Na nota oficial que chancelou a troca por Alexandre Padilha, titular de Relações Institucionais, a partir de 6 de março, o chefe do Executivo “agradeceu à ministra pelo trabalho e dedicação à frente do ministério". Ontem, Nísia afirmou que processos de substituição “fazem parte da vivência de qualquer governo" e criticou a imprensa por “antecipar decisões que cabem ao presidente".

É, de fato, prerrogativa de qualquer gestor público, sobretudo de um presidente da República, que mantenha sua equipe condizente com as demandas do momento, ou com as dimensões técnico-políticas, nas palavras de Nísia. Da mesma forma, espera-se dos próximos uma relação de cuidado, principalmente em situações de criticidade.

Pressionado pela queda da popularidade, Lula passou a cobrar mais visibilidade aos feitos do governo. Com isso, a cobiça pela pasta que tem orçamento de R$ 239,7 bilhões e capacidade de adotar medidas facilmente percebidas pela população obviamente aumentou. É de se estranhar, porém, o descompasso entre a declaração explícita de camaradagem em 2023 e o silêncio na cerimônia desta terça-feira.

Nísia foi alvo de um longo e desnecessário processo de fritura, costurado por aliados e reportado pela imprensa. A dinâmica se assemelha à substituição de outras mulheres do primeiro escalão do terceiro mandato de Lula – Daniela Carneiro, no Turismo, em julho de 2023; e Ana Moser, no Esporte, em setembro do mesmo ano.

Há de se ressaltar que todas as ministras que seguem no governo – Anielle Franco (Igualdade Racial), Cida Gonçalves (Mulheres), Esther Dweck (Gestão e Inovação em Serviços Públicos), Luciana Santos (Cîencia, Tecnologia e Inovação), Macaé Evaristo (Direitos Humanos e Cidadania), Margareth Menezes (Cultura), Marina Silva (Meio Ambiente e Mudança do Clima), Simone Tebet (Planejamento) e Sônia Guajajara (dos Povos Indígenas) – declararam, nas redes sociais, a admiração ao trabalho desempenhado por Nísia à frente da Saúde, contrastando com o movimento de atribuir a demissão a uma suposta incompetência da então ministra.

Fortalecimento do SUS, valorização dos profissionais de saúde, aumento da cobertura vacinal, comprometimento com a ciência e combate às desigualdades estão entre os feitos destacados pelas ministras. Também destacados pelo movimento de desagravo que ganhou força logo depois do anúncio da demissão.

Primeira mulher a chefiar a Saúde, Nísia, que tem perfil técnico, aceitou o desafio de reconstruir um setor historicamente crítico e ainda mais enfraquecido por forte desmonte promovido pela gestão anterior, de Jair Bolsonaro. Errou, acertou e, como qualquer pessoa que aceite conduzir um projeto de governo vitorioso nas urnas, está sujeita a críticas. Mas é lamentável, como já expresso neste espaço, o ataque especulativo a que foi submetida e que a reforma ministerial tenha começado sem o devido respeito que Nísia, os demais servidores da saúde e os brasileiros merecem.

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