O desabamento de parte da Igreja de São Francisco de Assis, um dos pontos turísticos mais famosos do Brasil, evidenciou de forma trágica a monumental incúria que se abateu sobre o patrimônio histórico do país. A queda da estrutura matou Giulia Panchoni Righetto, uma jovem de 26 anos que exercia no local uma das atividades mais preciosas para a economia mundial: o turismo. Pagou com a própria vida a profunda negligência sobre a história brasileira. Mais cinco pessoas ficaram feridas em razão da “fatalidade”.


Ato contínuo ao desabamento, veio o conhecido jogo de empurra. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) apressou-se em dizer que a responsabilidade pela manutenção do monumento é da Ordem Primeira de São Francisco. Dois dias antes da tragédia, porém, o frade guardião da igreja havia enviado documento ao Iphan relatando uma dilatação no forro do teto da igreja. Segundo o Iphan, uma visita técnica estaria programada para quinta-feira, um dia depois do colapso da parte superior do santuário católico. Tarde demais.


Uma das construções mais consagradas do barroco brasileiro, a Igreja São Francisco de Assis foi erguida há mais de três séculos. A pedra fundamental do santuário baiano data de 1686. É conhecida como “igreja de ouro”, em razão dos impressionantes adornos em madeira cobertos pelo pó do metal. A Igreja São Francisco de Assis é considerada ainda uma das Sete Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo.


Parece óbvio, portanto, que uma joia arquitetônica tão relevante quanto antiga tivesse uma atenção especial do poder público. É sabido e notório, contudo, que a Igreja São Francisco de Assis sofria com manutenção falha e acúmulo de problemas estruturais. Trata-se de uma situação comum a tantos outros monumentos históricos Brasil afora, castigados pelo descaso dos administradores com esses bens nacionais.


O episódio de Salvador expõe, de forma cristalina, que o modelo de conservação do patrimônio histórico nacional está equivocado. O Iphan precisa ter uma postura mais pró-ativa na conservação de prédios e instalações, e não esperar que os administradores locais se manifestem em eventual anomalia. É preciso também que estados e municípios tenham mais responsabilidade na fiscalização e manutenção de construções que, se bem preservadas, geram receita para os cofres públicos e para os gestores dos espaços.


Por fim, a ruína na Bahia serve para despertar a sociedade, em particular a iniciativa privada. Existem inúmeros exemplos, no Brasil e no exterior, da contribuição empresarial para a reforma e valorização de espaços relevantes. Recentemente, a França protagonizou um evento de repercussão mundial: reinaugurou a catedral de Notre-Dame, em Paris, após receber doações oriundas de 150 países. Mais de 800 bilhões de euros foram arrecadados, com somas vultosas enviadas por multinacionais francesas e outros doadores.
Como se vê, existem providências e soluções a serem tomadas. É preciso agir, a começar pela punição dos responsáveis pela negligência que causou uma morte em Salvador. Não é possível que o turismo no Brasil, já prejudicado pelo problema da violência, se torne uma atividade de alto risco.

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