Capa do livro

Capa do livro "Dá pé", de Luisa Bahia

crédito: Reprodução

“Urgências”

Ligar para uma amizade que possa te dar um banho quente à distância
Rezar para alguma raiz que te alimente
Dançar pelada no escuro
Drenar o excesso de pensamento
Fazer uma lista de abraços imprescindíveis
Aceitar a baderna das borboletas no estômago
Transbordar a mágoa sem medo da água
Comprar uma roupa brilhante para a próxima estação
Respirar como um bebê, mesmo sendo a grávida da vez
Inaugurar um novo cep à beira do rio
Acordar a vizinhança com os berros entalados
Fazer um chá diluindo a última inveja
Queimar a raiva vendo a cera da vela derreter
Fugir para a caverna mais próxima
Cantar um chorinho
Entender que alimento é medicina, sonho é medicina
Acreditar que poesia é profecia
Rabiscar i love you no espelho do banheiro público
Soltar o quadril e firmar a ideia
Deixar o verso vir da víscera

 

“Exausta”

queria uma placa de pare
bem no centro do juízo
para ver se assim eu me entrego
ao descanso saciado do fim

 

Cortar vidros é:

a) furar a parede do aquário
b) sonhar encostar no ar
c) diminuir o copo da bebida
d) preparar a arma do crime
e) esculpir o prato de comida conforme a fome

 


“Calcule o tempo”

da queima de um cigarro
de um beijo ideal
do rastro de um perfume
da vida de um hipopótamo
da vida de um coração infartado
da dor do orgulho
de um poço de raiva
para o pé de tâmara dar tâmaras
para chupar todo o milkshake com canudinho
do amarrotado das mãos de tanto mergulhar
do machucado das mãos de tanto apedrejar
de uma batida policial
do esmalte nas unhas dos pés
da reputação do novo vizinho
de um racha entre dois carros
do primeiro orgasmo
até a próxima guerra
da oferta do supermercado
de uma ideia genial
de uma ampulheta com a areia de um deserto inteiro

 

• “Dá pé”
• Luísa Bahia
• Impressões de Minas
• 76 páginas
• R$ 52
• Lançamento neste sábado (09/12), das 16h às 21h, no Espaço Cultural Mama Cadela (Rua Pouso Alegre 2048, Santa Tereza, Belo Horizonte)

Sobre a autora

Os poemas nesta página estão em “Dá pé”, primeiro livro de poesia da artista Luísa Bahia. Nascida em Congonhas (MG) em 1989, ela é formada em teatro pelo CEFART – Fundação Clóvis Salgado e Escola de Belas Artes da UFMG. Luísa faz videopoemas e realiza performances poéticas, além de apresentar o show autoral “Coisa de bicho”. Com edição da Impressões de Minas, “Dá pé” começou a ser escrito durante a pandemia e concluído em 2023. “O nome do livro surgiu em 2021, no meio da pandemia. Fiquei imaginando aquele fôlego que sentimos quando conseguimos colocar o pé no fundo do mar e dizemos ufa, aqui ‘dá pé’. Ao mesmo tempo significa botar fé na caminhada. Achei que seria um bom norte para construir um apanhado de poemas que, mesmo tratando de diferentes assuntos, têm em comum o ‘dar um jeito’ de caminhar nesse mundo desafiador, de maneira inventiva”, acredita a autora. O lançamento acontece neste sábado, 9/12, a partir de 16h no Espaço Cultural Mama Cadela, com autógrafos e performance de Luísa.