Frederico Vieira

“tabebuia”

imperiosa
rochas a jusante
dos nadas
campeia caule
amonteia verde
hiato tronco

maciça assim
galhadas em delicado
alumbra amarelo
carpido
sem afundos
ao sempre chão

vai semeios
vai seiva santa
nem-sabe-onde
em nuvem cova
deflora anverso
em fé versejo
da gema seda

prenhar ipês
longos líneos
a bruto arreio
sigma sina
sangue solar
isto-geraes
: imensidar-se

 



 

“emboleio”

poesia estancou entremeio
adentrou pensamento longo
desviou pântano entre flores

janela porta escada
por ela o mundo sobe
escorre lento passado

versos assim descabidos
um nada entorno intranquilos
desmentindo o vento da trança
cabelada moça
a saia roda desvela
chuva h-a-i-c-a-i

entorto mares claros
fluxo desordenado
palavras
já pulso vida própria
nadências roubadas
as memórias nunca encontradas
ao fundo do abismo
aquático
tramam longa conversa

isto é amar? Desamor? Que é?
redemoinho desgramado
flor raiz orvalho

 

“enredo”

permita que eu veja
além do vidro do pote

e parta em pedaços
os brilhantes dos olhos

deixa em pupila
a bolha d’água imensa

a boca bate no dente
repara o lábio intensa

abre e guarda para mim
a cada ponto e linha

um desaviso liso
vira farinha

visa a veia cava
aorta viva-morta

corta a cara da quina
e desterra faca sina

ata retalho em nós
depois dá corda

o que sobra e
sai entre mós

 

“morro velho”

Minha terra é minério, minha água é impura
A minha alma de pedra em dureza perdura
Jacyntho Lins Brandão

serra subiu longe
trilha dos homens vis
linha de minério

sólida paixão
montanha crucificada
em nome do pai

piedade de curral
sem serra nem cerradão
só triste destino

cidade em estorno
dá cheque caução
vira cava estéril

irrompes barro
magma areia

tu ardes só
andina desértica seiva
sob o sol do Sinai

 

“bica”

vim pegar rio doce
balde vazio
cabeça de sifão

quero lábio pequeno
quente morena
velha cajuína boa

meu peito chama seu nome
calado naquele vestido florido
cor da laranjeira

molho pés afundo
corrente fria do rolar escuro
seixos carregados em-coxas

atravesso a fome de corredeira-riacho
de areia tomara deus
mergulho desejo macho de fome
braços se achegam
cruza esguelha e cata d’água
passam olhos nada

vamo s’imbora
amanhã mulher
quem sabe

 

“irapuã”

visita melíflua
inesperada palma do presságio
fino favo
linha viva
saia de cigana negra
novo tempo (de)novo

 

“quadrívio”

minhacasa
quatrocantos
cantotemflor
amorsemal

quatrocantos
cantotemflor
minhacasa
amorsemal

cantotemflor
acasaemim
quatrocantos
amorsemal

casaémflor
quatrosantos
minhaérua
semalaamor

muzenza

 

SOBRE O AUTOR

Doutor e mestre em Comunicação Social pela UFMG, Frederico Vieira é aluno do Clipe (Curso Livre de Preparação de Escritores) da Casa das Rosas. O livro “Chão de saibro”, que será lançado neste sábado, ganhou a primeira menção honrosa do prêmio de revelação literária “UCCLA-CMLisboa: Novos talentos, novas obras”, em Língua Portuguesa.

 

Capa do livro "Chão de saibro"

Reprodução

 

“Chão de saibro”
• De Frederico Vieira
• Editora Folheando
• 140 páginas
• R$ 45
• Lançamento neste sábado, às 10h, na Livraria Jenipapo, na Rua Fernandes Tourinho, 241, Savassi, Belo Horizonte

 

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