Henry Gee, biólogo e escritor -  (crédito: JOHN-GILBEY - divulgação)

Henry Gee, biólogo e escritor

crédito: JOHN-GILBEY - divulgação

Que tal uma viagem de volta ao nosso passado, desde a origem do Sistema Solar até a humanidade moderna, para entender o que aconteceu nos últimos 4,6 bilhões de anos? A proposta é ousada, mas é o que pretende o escritor e editor inglês Henry Gee com o livro “Uma história (muito) curta da vida na Terra” (Fósforo).

 

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Como um bom guia turístico, ele usa os serviços da melhor máquina do tempo de que se tem notícia, a literatura, para conduzir o leitor por um passeio de 12 capítulos que sobrevoam o nascimento do universo e a evolução de répteis, aves, dinossauros, mamíferos e primatas. Mas, se embarcar, aperte o cinto, pois a viagem não é necessariamente tranquila: placas tectônicas agitadas, erupções de magma, eras glaciais e correntes marítimas instáveis estão à sua espera.

 

Henry Gee é paleontólogo, biólogo evolutivo e editor sênior da revista científica “Nature” há mais de três décadas. Formou-se nas universidades de Leeds e Cambridge e é autor de livros sobre a evolução, a origem dos vertebrados, história do genoma humano, dinossauros, entre outros. Em entrevista ao Pensar, revela ser fã do Sepultura, grupo mineiro de heavy metal criado em 1983 na cidade de Belo Horizonte, e que diz ser “uma das maiores bandas de rock do mundo”.

 

 

Ele demonstra, ainda, estar animado com a versão brasileira de “A (very) short history of life on earth: 4.6 billion years in 12 chapters”, lançada originalmente em 2021 e vencedora do prêmio de livro científico de 2022 da Royal Society. “Tem uma capa fantástica”, afirma.

 

Com a ajuda de uma linha do tempo, Henry explica como se deu o nascimento do Sol e a formação dos oceanos, aborda o surgimento de animais que posteriormente dariam vida aos répteis, mamíferos e aves, e consegue esmiuçar vulcões, dinossauros e o “pool genético” humano. Se na sabedoria popular “o que não mata, engorda”, fica claro no livro a resiliência de diferentes formas de vida a cada período de adversidade, como, por exemplo, frio extremo, asteroides e movimentação de placas tectônicas.

 

 

Não ficam de fora os protagonistas e coadjuvantes da fauna e da flora, de cianobactérias a cobras gigantes, o fogo, a agricultura e até as primeiras ferramentas usadas para a sobrevivência da vida humana.

 

Mas o livro não fala apenas do passado. O autor reserva parte de seu tempo para escrever e refletir, mesmo que de forma leve, e por que não dizer bem-humorada, sobre a extinção da humanidade e imaginar como será o Planeta Terra daqui a 250 milhões de anos.

 

“Qual será, então, o legado humano? Toda a história humana, tão intensa e tão breve, todas as guerras, toda a literatura, todos os príncipes e ditadores em seus palácios, toda a alegria, todo o sofrimento, todos os amores, sonhos e realizações, não deixarão mais que uma camada, com milímetros de espessura, em alguma futura rocha sedimentar até que ela também seja erodida a pó e acabe no fundo do oceano”.

 

 

Leia, a seguir, a entrevista de Henry Gee ao Estado de Minas.

 

Quando começou sua paixão pela ciência e pela história do Planeta Terra? O que desperta seu interesse em estudar a evolução dos seres vivos? Por quê?


Tenho curiosidade sobre o mundo desde que era uma criança. Nasci e cresci em Londres, que possui muitos excelentes museus de história natural. Foi aí que tudo começou. Quando eu era MUITO pequeno, ainda em um carrinho, minha mãe me levou a um museu em Londres chamado Museu Horniman. Isso era perto da nossa casa.

 

O Horniman era um museu muito antiquado, cheio de animais empalhados, esqueletos e múmias egípcias. Minha mãe diz que eu insistia em ser levado para as exposições mais assustadoras e macabras.

 

Seu livro tem uma proposta ousada: resumir 4,6 bilhões de anos em 12 capítulos. Qual foi o maior desafio para alcançar esse objetivo? Se pudesse, gostaria de acrescentar algo a ele? Por quê?


Eu escrevi vários livros. Mas este foi o livro mais fácil de escrever. A história da Terra é tão maravilhosa que se escreveu sozinha na página.

 

Você aborda a extinção da humanidade de uma forma muito sóbria, confortável, até mesmo natural. Anos de estudo e pesquisa te levaram a esse distanciamento? Ou essa é uma impressão incorreta? Por quê?


Tentei escrever o livro de uma maneira 'distante'. Os humanos são parte da Terra, assim como os dinossauros ou qualquer uma das outras criaturas que descrevo. Depois que escrevi o livro, pensei mais sobre a extinção dos humanos e escrevi um livro inteiro sobre isso. Esse livro se chama 'A queda e a extinção do império humano'. Ele será publicado em 2025.

 

Como um homem de ciência, como você lida com as notícias relacionadas ao aquecimento global? Até que ponto os danos ainda podem ser revertidos? Por quê?


O aquecimento global é real e perigoso. Já está causando muitos problemas. Não acho que os danos possam ser revertidos. Precisamos aprender a nos adaptar a isso.

 

Como a literatura entrou na sua vida? Quem são seus autores favoritos? O que um livro precisa ter para chamar sua atenção? Por quê?


Sempre amei livros. Se você não consegue me encontrar, estou na livraria. Aprendi a ler cedo. Minha mãe me apresentou aos livros quando eu era muito jovem. Meus autores favoritos são J. R. R. Tolkien e Jorge Luis Borges. Aprendo sobre livros com meus amigos e família. Meu pai me apresentou à ficção científica, através de H. G. Wells... e me deu ‘Labyrinths’ de Borges (uma versão em inglês de “Ficções”) quando eu estava me recuperando no hospital de uma lesão.


Minha mãe me ensinou meu primeiro latim, e sempre amei a velha mitologia clássica. Um professor da escola primária me apresentou Tolkien com “O Hobbit”. Hoje em dia, são meus filhos que me contam sobre novos autores. Minha filha me apresentou “O circo da noite” de Erin Morgenstern e meu filho recomendou “Os anéis de Saturno” de W. G. Sebald. Esses são meus novos livros favoritos.

 

Por que as pessoas, mesmo aquelas que ainda não foram apresentadas ao assunto, deveriam ler ‘Uma história (muito) curta da vida na Terra’? Por quê?


Porque a história da Terra é uma história realmente incrível. Espero ter escrito de uma forma simples para que muitas pessoas possam entender. A edição brasileira, da Fosforo, tem uma capa fantástica! Muitas pessoas dizem que queriam mais ilustrações. Estou trabalhando em uma versão ilustrada para crianças que será lançada em 2026. 

 

Trechos

 

“Os primeiros seres vivos não passavam de membranas espumosas em fendas rochosas microscópicas. Eles se formaram quando as correntes marítimas ascendentes se tornaram turbulentas e se transformaram em redemoinhos que, ao perder energia, despejaram sua carga de detritos ricos em minerais em frestas e poros das rochas. Essas membranas eram imperfeitas, semelhantes a peneiras, e permitiam que algumas substâncias as atravessassem, mas outras não. Embora fossem porosas, o ambiente dentro delas se tornou mais calmo e mais ordenado que o turbilhão furioso do lado de fora. As membranas fizeram de sua permeabilidade uma virtude, usando fendas como porta de entrada para energia e nutrientes e como saída para eliminar resíduos”.

 

“O isolamento de dinossauros em ilhas criou estranhas coleções de animais selvagens, como em ‘Alice no país das maravilhas’. Durante o Jurássico, por exemplo, a Europa era um arquipélago de ilhas naturais, muito parecido com a Indonésia atual, com uma fauna única de saurópodes em miniatura, como o Europasauros, que tinham no máximo seis metros de comprimento. Madagascar, assim como agora, era um refúgio de seres exóticos. No Cretáceo, muitos nichos ecológicos da ilha, inclusive o vegetarianismo, foram ocupados por crocodilos”.

 

“A vida está se preparando para a próxima transição de complexidade na evolução. Assim como bactérias se associaram para criar eucariotas e assim como eles se combinaram para criar animais multicelulares, plantas e fungos, esses organismos também se combinarão para produzir, nas últimas etapas da vida na Terra, um tipo totalmente novo de organismo, com poder e eficiência que nem sequer podemos imaginar. As sementes foram plantadas há muito tempo”.

 

“Uma história (muito) curta da vida na Terra”


De Henry Gee
Tradução de Gilberto Stam
Editora Fósforo
274 páginas
R$ 69,50 (e-book R$ 62,90)

 

Capa do livro

Capa do livro

Reprodução