Adélia, o que você destacaria nos quatro livros que acabam de ser reeditados: “Bagagem”, “Terra de Santa Cruz”, “O pelicano” e “O homem da mão seca”?
Relendo os livros, vejo que os escreveria do mesmo jeito. Nada a acrescentar ou retirar; portanto, prontos para serem reeditados.
Quais as recordações mais marcantes do lançamento de “Bagagem”?
A presença de meus ídolos literários e amigos amados.
Drummond afirmava que sua poesia é “lírica, bíblica, existencial”. Com qual dessas características mais se identifica ou há outra que supera todas as citadas?
A lírica é sine qua non. A Bíblia é um manancial. Pode imaginar como me senti. E, quanto a ser existencial, não tenho também como fugir, uma categoria fundamental. Me identifico com todas.
O que a levou a escrever “O homem da mão seca”? O que é mais fácil de dizer na prosa do que na poesia?
Ao escrever esse livro, descobri que era eu o homem da mão seca, o que foi motivo de muita dor, mas também de salvação. É um livro muito especial para mim. Não acredito que haja qualquer tipo de facilidade atrelada ao gênero literário. A dor do nascimento será igual.
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Em “O homem da mão seca”, você cita o Livro de Jó e narra a história de uma mulher do interior que “mistura Deus em tudo”. Acredita que, em seus livros, também há sempre uma mistura de Deus com tudo que escreve e ele acaba sendo, como disse em vídeo recente, “o autor real das coisas”?
Sim, acredito. Em minha escrita não há como alijar Deus, que é o objeto maior de minhas inquietações. Comecei a escrever “O homem da mão seca” e, depois de um tempo, empaquei. Tive então meu primeiro deserto criativo. Foi necessário, mas muito difícil de atravessar. O Livro de Jó foi um paralelo inevitável.
Qual o seu santo de devoção e qual sua oração de maior predileção?
Santo Antônio e São Francisco. Minha oração de cabeceira é o Salmo 50.
Em “Cacos para um vitral”, de “Terra de Santa Cruz”, você escreve os seguintes versos: “Tenho os mesmos desejos de trinta anos atrás, / imutáveis como os mosquitos na cozinha ensolarada, / minha mãe fazendo café / e meu pai sentado, esperando.” Com o tempo, quais desejos mudaram e os que permanecem como os de 30, 60 anos atrás?
Os desejos são os mesmos, só que em mais vasta profundidade.
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Em “Limites”, também em “Terra de Santa Cruz”, você escreve que “possuía uma história, / contínua, desde o meu nascimento indesligável de mim”. Nessa história contínua, acredita que haja uma ligação entre todos os seus livros? Como se dá a conexão entre eles?
Acredito que o autor escreve sempre o mesmo livro. Trata-se de uma única vida, uma única pessoa, uma única memória. No tempo cósmico escrevemos um único poema.
Como fez a travessia do “deserto criativo” e chegou ao novo livro?
Na verdade, vivi essa experiência por duas vezes. Atravessei esses desertos implorando pela misericórdia divina, que não me faltou, mas importante dizer também que tive a ajuda de algumas pílulas e sessões de análise (rs). O livro que estou escrevendo chegou através de gavetas fechadas há muito tempo. Os manuscritos me apanharam no mesmo lugar, apenas continuei a escrever.
O que mais gosta de fazer atualmente? E o que mais a incomoda?
Estou vendo pela segunda vez a série “The Chosen (Os Escolhidos)”. Jonathan Roumie (ator que interpreta Jesus Cristo na série) é encantador! Sobre incômodos, nunca superei minha intolerância a barulhos. Ruídos são insuportáveis.
Quais as recordações da infância e da juventude que guarda até hoje?
Nossa, são tantas! Tive a sorte de ter tido uma infância muito feliz. Está gravada como uma experiência de conforto, sempre retorno a ela.
Sem Divinópolis, sem Minas, não haveria a sua poesia?
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A minha, não, pois faz parte de quem sou.
Como reage quando vê seus leitores fazendo vídeos nas redes sociais citando seus poemas?
Com uma alegria imensa. Sinal de que a poesia andou com as próprias pernas e não precisa mais de mim. O que escrevo pertence a todos.