A repactuação do acordo de indenização pelo rompimento da barragem de Mariana, que no próximo domingo completa oito anos, colocou, mais uma vez, em lados opostos o governador Romeu Zema (Novo) e o governo federal. Em debate com empresários promovido pela Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base (ABDIB), na manhã de ontem, em Belo Horizonte, Zema acusou o governo federal de “má vontade” em relação à repactuação do acordo que vem sendo mediado pelo Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6).

“O governo federal tem colocado obstáculos, mas já deixamos claro que se eles não assinarem até o final no ano, Minas e Espírito Santo vão fazer um acordo que diz respeito aos estados para provar que é possível sim e que o que está havendo do governo federal hoje é uma má vontade enorme. Parece que tudo que é para Minas Gerais tem uma restrição, isso aí está claríssimo. Tudo que é para cá é mais difícil ou impossível”, afirmou Zema.



Mais cedo, o secretário de Estado da Casa Civil, Marcelo Aro, repetiu a mesma crítica, classificou o governo federal como “turma do mal” e afirmou que a motivação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para supostamente atrasar a repactuação é política. “Sabe o que nós queríamos do governo Lula? Que ele assinasse o acordo de Mariana. Essa era a nossa vontade. Temos o Ministério Público de Minas, o Ministério Público do Espírito Santo, a Defensoria Pública e as empresas privadas, todo mundo já aceitou fazer o acordo. Falta apenas a assinatura do governo federal”, afirmou. “Mas, existe uma turma do mal no governo. Essa turminha não quer que Minas dê certo, porque sabe que se Minas der certo, o governador pode ser um concorrente do Lula em 2026”, completou Aro, se referindo a uma possível candidatura de Zema à Presidência da República em 2026.

Mas de acordo com o governador, em debate com empresários, o acordo vai sair “de um jeito ou de outro” e garantir recursos para os cofres do estado, em bases semelhantes ao assinado pelo estado no caso do rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho, ocorrido em 2019, e que matou 270 pessoas.

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O procurador do Ministério Público Federal (MPF), Carlos Bruno Ferreira da Silva, que acompanha o caso, disse que não há nenhum impedimento para a assinatura do acordo e que ele só não será assinado se as empresas não anuírem. O acordo, de acordo com ele, está praticamente fechado e depende apenas do aval das mineradoras em relação ao valor para ser assinado.

Segundo o procurador, o novo governo, quando assumiu, em janeiro deste ano, quis conhecer melhor o acordo, fez sugestões de mudanças, algumas consideradas muito boas por ele, e que falta apenas a anuência das empresas Samarco, Vale e BHP Hill, responsáveis pela barragem rompida, para ser fechado. “Tem ainda algumas dúvidas, mas há um texto praticamente pronto que será entregue para as empresas até o dia 8”, afirmou. Para o procurador, que não deu detalhes dos termos e nem dos valores da repactuação do caso Mariana, em alguns pontos o acordo é melhor do que o de Brumadinho, pois garante mais recursos para as cidades atingidas pelo rompimento.

Repactuação

Ainda não há consenso em torno do acordo com os atingidos pelo rompimento da barragem de Mariana que querem maior participação nas decisões e a destinação de parte dos recursos diretamente para eles e para as cidades atingidas. Um dos coordenadores nacionais do Movimento dos Atingidos pela Barragem (MAB), Joceli Andreoli, disse que Zema quer “politizar a repactuação” e usar os recursos para se cacifar eleitoralmente na próxima eleição presidencial como fez com os recursos do acordo de Brumadinho. “Ele quer pegar um monte de dinheiro para fazer obra eleitoreira. Ele não está preocupado com os atingidos. Essa é a divergência dele com o governo federal”, disse. Andreoli afirmou ainda que o dinheiro do acordo de Brumadinho chegou aos cofres do estado, mas não para as famílias e população afetadas. Segundo ele, os atingidos preparam um ato em Brasília, no dia 5, data do aniversário de oito anos da tragédia, que destruiu a Bacia do Rio Doce, dois povoados e deixou 19 mortos, para exigir novas regras para a repactuação.

Brumadinho


Minas Gerais fechou com a Vale, em fevereiro de 2021, o acordo de reparação da barragem de Brumadinho, no valor de R$ 37 bilhões. Esses recursos serão destinados aos cofres públicos para realização de obras de infraestrutura em todo o estado e não somente na região atingida pelo rompimento da barragem de Brumadinho. Desse total, Minas já recebeu, até setembro deste ano, R$ 9,4 bilhões. O Ministério do Meio Ambiente que representa o governo federal na repactuação de Mariana, foi procurado pela reportagem, mas não atendeu ao pedido de informações.

O prazo final para a repactuação do acordo de Mariana está marcado para 5 de dezembro de 2023, de acordo com cronograma das tratativas em curso no Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6). O governo federal sugeriu algumas mudanças no acordo, não detalhadas pela União e nem pelo Ministério Público Federal, que acompanham a negociação. O governo federal é parte, pois o rompimento da barragem atingiu o Bacia do Rio Doce, um rio nacional, que passa por dois estados, Minas e Espírito Santo, por isso a União tem que ser ouvida.


“Coisa de adolescente”

Deputados de oposição na Assembleia rebateram as críticas do governador Romeu Zema ao governo federal e disseram que ele não sabe fazer política. A deputada Lohanna França (PV) classificou as falas do governador como "coisa de adolescente”. “Eu fico me perguntando como o governo federal tem ‘má vontade com Minas Gerais’? É o segundo estado que mais vai receber recursos federais do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). É o estado que mais tem universidades públicas. É o estado que está tomando boa parte da burocracia dos servidores de todos os ministérios que a gente tem na Esplanada para discutir o acordo de Mariana, todo mundo envolvido pelo melhor acordo possível”, disse a parlamentar.

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