O Sindicato dos Servidores da Justiça de Primeira Instância do Estado de Minas Gerais (Serjusmig) ajuizou uma ação popular que pede a anulação do acordo firmado entre a União e o governo Zema (Novo) sobre a Lei Kandir. Os sindicalistas argumentam que, nesse processo, o estado renunciou a mais de 90% dos créditos devidos.

À época do acordo, estudos feitos por técnicos da Secretaria de Fazenda e da Advocacia-Geral de Minas Gerais (AGE) estimavam que o estado tinha R$ 135 bilhões a receber. No entanto, o acordo firmado instituiu que Minas Gerais receberia cerca de R$ 8,7 bilhões até 2037 como forma de compensação das perdas financeiras - R$ 126,3 bilhões a menos que o definido. O sindicato destaca que a ação não pede a anulação dos valores já recebidos, mas sim dos 90% dos quais não foram compensados.

A Lei Kandir, promulgada em 1996, retirou a obrigatoriedade da cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), de competência dos estados, sobre exportações de produtos primários e semielaborados ou serviços. Caberia à União compensar financeiramente os entes federativos pela renúncia fiscal.

No entanto, essa compensação deixou de ser paga, quando, a partir de 2004, os repasses passaram a depender de penosa negociação entre os governadores e o Ministério da Fazenda – o que deu início a disputas judiciais entre os entes federativos e o governo federal.

O acordo de compensação tinha o objetivo de encerrar as discussões sobre a reparação dos prejuízos decorrentes da Lei Kandir.

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A ação do sindicato ocorre em meio às discussões do projeto de adesão de Minas Gerais ao Regime de Recuperação Fiscal (RFF), questionado pelo sindicato.

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Os sindicalistas alegam, na ação, que “nem todos os interesses jurídicos estão equacionados e bem representados” no acordo. “Há um latente desequilíbrio, uma desproporcionalidade e uma injustiça que macula a validade do referido acordo, notadamente se considerarmos que os Estados encontram-se em situação de penúria e absoluta hipossuficiência se comparados com o poder federal”, pontuam.




O que pede a anulação?

De acordo com o advogado João Victor de Souza Neves, da Lucchesi Advogados Associados, co-autor da petição elaborada em conjunto com o advogado Humberto Lucchesi de Carvalho, o acordo feito com Minas Gerais ocorreu sob pressão. “Vários estudos sobre os valores indicam que alguns estados, incluindo Minas, tinham altos valores para receber. Como Minas estava precisando de um adiantamento, época em que estava parcelando os salários dos servidores, o governador Romeu Zema abriu mão nos valores da negociação, que é de cerca de 90%”, enfatiza.

“Os diretores do sindicato entraram com uma ação especificamente para Minas, não para anular o acordo inteiro. Na cláusula dois do acordo que foi feito, o governo exonerou as parcelas antigas. Ou seja, o objetivo deles é anular o acordo na questão das parcelas que ele deu quitação. Quando assinou o acordo ele recebeu 10% de adiantamento, abriu mão de 90% e deu quitação do restante”, explica.

O advogado diz que a ação que resultou no acordo homologado é de décadas atrás e que muitos outros estados também abriram mão de grande parte do valor a receber.

“A ação no Supremo Tribunal Federal que resultou no acordo é uma ação de mais de 10 anos. Não chegavam no denominador comum porque a União não queria pagar os valores inteiro, não queria negociar. Ela (União) aproveitou os momentos de carência do estado de arrecadação e conseguiu fazer esse acordo desfavorável para o estado”, pontua. “O objetivo da anulação da cláusula dois do acordo é exatamente de não dar quitação das parcelas retroativas”, completa.

Segundo o especialista, em tese, se a anulação obtivesse sucesso, o estado receberia esses 90%. "O que o sindicato aponta é que é contraditório o estado querer aprovar o Regime de Recuperação Fiscal, sendo que na questão da Lei Kandir fez um acordo com a União e abriu mão de 90% dos valores que eram devidos".

Regime de Recuperação Fiscal

O RRF é apontado pela gestão Zema como o único caminho para manter o equilíbrio financeiro do estado, que tem uma dívida em torno de R$ 164 bilhões com a União. Antes de ser apreciado pelo plenário do Legislativo mineiro, o texto ainda precisa ser analisado nas comissões de Administração Pública e Fiscalização Financeira e Orçamentária. Para evitar o pagamento à vista de R$ 18 bilhões já 2024, o RRF precisa ser sancionado até o dia 20 de dezembro.

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