O Senado deve votar hoje a proposta de emenda à Constituição (PEC) que limita decisões individuais de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e muda regras sobre pedidos de vista em julgamentos. O requerimento para a votação em regime especial, ontem, recebeu o aval de 48 senadores; 20 foram contra. Para ser aprovada em plenário, com três quintos dos votos, precisa apenas do apoio de mais um senador. O governo tenta barrar a votação.

O presidente do senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), minimizou o conflito com o Supremo, com o argumento de que a PEC não é “retaliação” nem “afronta”. Caso seja aprovada, a PEC impedirá que o Supremo suspenda leis que afetem a coletividade, bem como leis ou atos dos presidentes da República, da Câmara e do Senado com o mesmo teor. A regra também vale para decisões cautelares ou “de qualquer natureza” em ações que questionem a constitucionalidade de leis.

A mudança proposta pelo Senado altera a dinâmica de funcionamento do Supremo Tribunal Federal e limita o poder da corte, cujos ministros perderão a possibilidade de adotar medidas cautelares para evitar prejuízos coletivos ou individuais, até que o caso seja apreciado pelo plenário. Relator do texto, o senador Espiridião Amim (PP-SC), ainda pode flexibilizar seu parecer, retirando do texto propostas que já constam do regimento do Supremo, como é o caso dos prazos de pedidos de vista, mas há muito mais coisas envolvidas.

A principal é um ajuste de contas da base bolsonarista no Senado, liderada pelo senador Rogério Marinho (PL-RN), com o Supremo, em razão da atuação da corte em defesa das instituições democráticas, inclusive o julgamento dos envolvidos na tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro, com objetivo de destituir o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Desde a Constituição de 1988, o Supremo exerce o papel de poder moderador, quase sempre em razão de abusos de poder do Executivo ou omissão legislativa do Congresso.

Com as novas restrições às medidas cautelares, a capacidade de os ministros evitarem que decisões ou leis inconstitucionais causem prejuízos à sociedade fica muito limitada. Uma série de decisões polêmicas de ministros do Supremo, algumas dais quais avançaram em relação à autonomia do Congresso, produziram o ambiente favorável à emendas constitucional, que já havia sido rejeitada na legislatura passada, mas foi reapresentada.

O senador Amim nega a retaliação ao Supremo: “Isso não é revanche contra ninguém. Isso não é do grupo bolsonarista ou do grupo do Lula. Esse debate é importante para o direito brasileiro, para a Justiça, para que haja segurança jurídica e para que nós digamos à sociedade o seguinte: lei é para ser cumprida A decisão tem que ser do colegiado. Isso vai ser bom para o Supremo”, argumenta.

Sucessão

O autor da PEC, Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), também afirma que o projeto não tem o objetivo de prejudicar a harmonia entre os Poderes, mas sim de valorizar as decisões tomadas em conjunto pelos ministros. “Eu acho o Supremo Tribunal Federal tão importante que me parece absurdo que apenas um homem possa decidir por ele. As decisões do Supremo devem ser colegiadas sempre que possível”, ironiza.

O governo tenta evitar a aprovação da proposta, mas está fragilizado, porque houve uma mudança de posicionamento do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, em razão de sua sucessão. O senador Davi Alcolumbre (União-AP), presidente da poderosa Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), pretende voltar à Presidência do Senado e conta com o apoio de Pacheco. Como há outros possíveis pretendentes no PSD e no MDB, que têm grandes bancadas, aliou-se a bancada bolsonarista, que sempre quis pôr uma cangalha no Supremo.

Na reeleição de Rodrigo Pacheco, no ano passado, a candidatura do senador Rogério Marinho (PL), ex-ministro de Bolsonaro, isolou seus aliados. Foi um erro estratégico, porque os 32 senadores de oposição ficaram de fora da Mesa do Senado e das direções de todas as comissões. Agora, ao se aliarem a Pacheco e Alcolumbre, a bancada de Bolsonaro é a força hegemônica dessa nova maioria em formação, com 48 dos 81 senadores.

O senador Humberto Costa (PT-PE) considera a PEC inoportuna e capaz de criar um clima de conflito com o Supremo, como ocorria durante com o governo Jair Bolsonaro, mas corre atrás do prejuízo. “Acabamos de sair de um período em que foi forjado um conflito que envolveu os poderes pelo então chefe do Poder Executivo contra o Legislativo e o Judiciário. Trazer esse debate agora reacende essa tentativa de ataque ao Supremo, que garantiu o estado de direito e a nossa democracia”, argumenta.

 

 

 

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