O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, enfrenta simultaneamente a gula do Centrão e o “fogo amigo” do PT. Fosse um economista como Pérsio Arida, e não um político petista “puro sangue”, calejado por administrar o terceiro maior orçamento do país como prefeito de São Paulo, já teria pegado o boné e ido embora para casa. É muito mais confortável dar aulas de ciência política ou filosofia na Universidade de São Paulo do que administrar as pressões que sofre de todos os lados da Esplanada e da Faria Lima.


A gula do Centrão é retroalimentada pela narrativa petista de que Haddad advoga um “austericídio fiscal”, o mote sacado por Gleisi Hoffman, a presidente do PT, na conferência nacional da legenda, para atacar a política econômica e responsabilizar Haddad, por antecipação, pelas dificuldades que o partido enfrentará nas eleições municipais.


“Não faz nenhum sentido, neste cenário, a pressão por arrocho fiscal exercida pelo comando do BC, rentistas e seus porta-vozes na mídia e no mercado. O Brasil precisa se libertar, urgentemente, da ditadura do BC ‘independente’ e do austericídio fiscal, ou não teremos como responder às necessidades do país”, afirma a resolução aprovada ontem, em votação remota.


O grande equívoco dessa estratégia é que goela do Centrão é muito maior. É uma ilusão acreditar que a legenda, pelo mau exemplo, levará vantagem em relação aos políticos do Centrão, sem o qual o governo não tem a menor chance de aprovar suas propostas econômicas, como a reforma tributária, por exemplo. Ainda mais depois do ataque à política econômica e às alianças do Palácio do Planalto na resolução da conferência, aprovada ontem, em votação remota.


“As forças conservadoras e fisiológicas do chamado Centrão, fortalecido pela absurda norma do orçamento impositivo num regime presidencialista, exercem influência desmedida sobre o Legislativo e o Executivo, atrasando, constrangendo e até tentando deformar a agenda política vitoriosa na eleição presidencial “, afirma o documento. Na votação, Gleisi e seus aliados massacraram os líderes do governo na Câmara, José Guimarães (CE), e da bancada, Zeca Dirceu (PR), por 51 votos a quatro.

 

Orçamento


O outro lado da moeda é o texto final do relator da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2024, (PLN 4/23), deputado Danilo Forte (União-CE), que propõe a obrigatoriedade de empenho das emendas parlamentares impositivas no primeiro semestre do ano que vem. Hoje, as emendas individuais e de bancada estadual são de execução obrigatória, mas o governo é quem decide quando isso é feito.
As emendas de comissões permanentes e as de bancadas estaduais deverão ser empenhadas até abril, caso o Orçamento seja sancionado no final do ano. Ou seja, é injeção direta de recursos nas bases eleitorais. O empenho é a contratação da despesa, que deve ter recursos reservados, liquidada e paga. Pelo relatório do deputado, as transferências especiais (recursos transferidos diretamente para governos de estados e municípios) para a área de saúde terão que ser pagas no primeiro semestre.


Forte explicou que a mudança é fundamental para os gestores, porque garante previsibilidade. “No primeiro semestre, a gente resolve a parte da saúde, que é a prioridade do Brasil. Com isso, você melhora a condição financeira dos entes federados. E é bom, por outro lado, porque acomoda e diminui a pressão política, que muitas vezes é condenada pelo toma-lá-dá-cá”, disse Forte.


A saúde, como se sabe, é uma área capilarizada, com muitas instituições privadas que recebem recursos do SUS. Para distribuir “fraternamente” os eventuais contingenciamentos, um dispositivo determina que os cortes de recursos necessários à meta fiscal sejam lineares, ou seja, iguais para emendas parlamentares e demais recursos do orçamento, independentemente de prioridades.


Dispositivo proposto pelo relator determina que os cortes de recursos necessários para garantir a meta fiscal do ano sejam feitos de maneira igualitária entre emendas parlamentares e o restante das programações. “Nada melhor do que a equidade. Então, o que está colocado é que vamos ter uma condicionante. Se for fazer o contingenciamento, fazer uniforme, linear para a área de investimentos”, explicou.


A emenda do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) que estabelecia um limite de contingenciamento em torno de R$ 23 bilhões para 2024, a partir de uma interpretação do novo regime fiscal (LC 200/23), foi rejeitada pelo relator. Segundo o senador, o regime assegura um crescimento mínimo das despesas de 0,6%. Segundo nota técnica da Consultoria de Orçamento da Câmara, para garantir a meta fiscal, o corte pode chegar a R$ 56 bilhões.

 

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