A Câmara Municipal de Belo Vale, na Região Central, aprovou nesta terça-feira (6/2), de maneira unânime, a criação de uma comissão processante para avaliar o pedido de cassação do vereador Everton Elias Silva (MDB), conhecido como Tico Enfermeiro.
O parlamentar foi o mais votado da cidade nas últimas duas eleições e é acusado de quebra de decoro por ter divulgado fotos de pacientes do Hospital e Maternidade Henrique Penido sem autorização e desviado medicamentos e materiais do estabelecimento.
A reportagem do Estado de Minas teve acesso ao material que motiva as acusações e conversou com testemunhas que afirmam ter recebido centenas de registros sem consentimento de cirurgias, partos e óbitos nos consultórios. Os mesmos registros também foram utilizados para acionar o parlamentar na Polícia Civil, Ministério Público e no Conselho Regional de Enfermagem (Coren).
As denúncias apontam que o vereador, que trabalhou no hospital até 2023, mantinha grupos de conversa online em que divulgava imagens e informações sigilosas de pacientes. O material enviado à reportagem inclui fotos de cirurgias, pacientes desacordados, recém-nascidos e órgãos humanos. Há também registros de conversas em que o acusado, supostamente, negociava medicamentos controlados pertencentes ao hospital.
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Testemunhas afirmaram à reportagem que o enfermeiro divulgava, além das imagens, informações sigilosas sobre ocorrências policiais e exames médicos de pessoas da cidade. Há ainda relatos de que o acusado conseguia influência política através do desvio de medicamentos do hospital.
A defesa de Everton diz que os denunciantes têm conflitos antigos com o governador e que as acusações são feitas com motivações políticas. O parlamentar teve cerca de 10% dos votos de Belo Vale nas últimas duas eleições municipais e é pré-candidato a vice-prefeito da cidade em chapa ao lado de Lapinha (MDB), que já comandou o município entre 2013 e 2020.
Segundo Maikon Villaça, advogado do vereador, as denúncias foram feitas de forma ilegal. Ele afirma que seu cliente nunca divulgou as imagens e diz que elas foram acessadas pelos denunciantes a partir de um arquivo que o vereador mantinha em nuvem.
“Por se tratar de um ano eleitoral, começaram com essa perseguição. Em momento nenhum foi transmitido nenhuma imagem, é preciso perguntar a eles (os denunciantes) como acessaram esse material. A defesa irá comprovar, com todos os fatos, que Everton é inocente e está sendo perseguido”, disse à reportagem.
Em contato com a reportagem, um dos denunciantes disse que sequer conhece o vereador e que a versão da defesa é uma admissão de culpa de que as fotos foram tiradas sem autorização dos pacientes. Além disso, ele aponta que a defesa deverá comprovar o acesso à nuvem, o que configuraria crime de invasão cibernética.
A comissão agora reunirá materiais e acionará testemunhas de defesa e acusação para elaboração de um relatório que deve ser votado em plenário para decidir sobre a manutenção ou cassação do cargo de Everton.
Denúncias em outras instâncias
No fim de janeiro, o Ministério Público de Minas Gerais enviou à Polícia Civil uma notícia fato pedindo a abertura de inquérito para apurar a prática de condutas não éticas pelo enfermeiro Everton Elias da Silva nas dependências do Hospital e Maternidade Henrique Penido. Em resposta à reportagem, a corporação afirmou ter recebido a informação e iniciado as apurações.
Em despacho, o promotor de Justiça Mateus Beghini Fernandes considerou que parte das denúncias apresentadas eram passíveis de investigação policial. A primeira delas relativa ao envio de imagens de pacientes submetidos a procedimentos cirúrgicos e internações, o que configura crime de acordo com artigo 325 do Código Penal Brasileiro. Além disso, o documento aponta violação do sigilo profissional obrigatório determinado pela Resolução nº 554 do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen).
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A segunda trata sobre as denúncias de que o suspeito desviava medicamentos do hospital, administrado em parte pelo Poder Público e em parte por entes privados, no período em que Everton trabalhava no local. O documento aponta que as acusações apresentadas ao Ministério Público podem configurar peculato, crime previsto no artigo 312 do Código Penal.
Uma denúncia também foi aberta no Coren. As acusações e os materiais enviados foram os mesmos. Em resposta à reportagem, o conselho disse que o caso ainda não passou pela apreciação do colegiado de conselheiros, a primeira fase após o recebimento da acusação.