Lula – ao lado de Janja – enfrenta desgaste na relação com o Congresso Nacional -  (crédito: Pablo PORCIUNCULA/AFP)

Lula ao lado de Janja

crédito: Pablo PORCIUNCULA/AFP

(com Ígor Passarini e Rafael Bernardes)

“O governador não precisa gostar de mim. Não precisamos ser amigos, precisamos ser parceiros, por Minas e pelo povo mineiro”, disse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em entrevista exclusiva ao Estado de Minas e ao Portal Uai, após desembarcar ontem em Belo Horizonte. A declaração é referente ao chefe do Executivo mineiro, Romeu Zema, que apoiou a tentativa de reeleição do então presidente Jair Bolsonaro e tem feito oposição à gestão petista. Na manhã de hoje, Lula divulgará os investimentos federais para o estado, inclusive na BR-381. “Em Minas Gerais, os recursos saltaram de apenas R$ 276 milhões em 2022 para R$ 517 milhões em 2023, com previsão de aplicação de R$ 1 bilhão em 2024. Com isso, estamos revertendo a degradação da malha e as pessoas vão ver as obras e os resultados”. A seguir, a íntegra da entrevista.

 
Todas as vezes que o senhor ganhou a Presidência, venceu em Minas Gerais. A que considera este vínculo?


Minas é uma espécie de síntese do Brasil. Está no centro do país e faz fronteira com São Paulo, o Centro-Oeste, a Bahia e o Espírito Santo. Venho sempre a Minas, desde os anos 1970. Eu visitei muito todas as regiões ao longo dos anos, a Zona da Mata, o Vale do Aço, o Triângulo, o Norte de Minas, o Vale do Mucuri, a Região Metropolitana de Belo Horizonte, todas as regiões do estado, sempre dialogando com a população. Acho que o meu resultado em Minas tem a ver com esse forte vínculo político que construí ao longo dos anos com a população de Minas.

 


O dia 8 de janeiro entrou para a história do país. Ao pensar nos livros de história do futuro, como o senhor imagina que esta data e a sequência dos fatos serão narrados?


Eu acho que ficará para a história como o ponto máximo de uma onda de insanidade e ódio que varreu este país durante quatro anos. O 8 de janeiro será lembrado como a tentativa frustrada de destruir nossa democracia e perpetuar no poder um aprendiz de ditador. Mas será também lembrado como o momento em que as instituições e os setores progressistas se uniram em defesa da democracia. Estará nos livros de história que no final da tentativa de golpe as instituições e a própria democracia saíram ainda mais fortes.


Quais resultados os mineiros podem esperar do seu terceiro mandato? Existem áreas que o senhor identificou como mais sensíveis a Minas Gerais?


Logo depois da minha posse, chamei os governadores de todos os estados em uma reunião para construirmos juntos as prioridades em cada estado. Com isso, vamos investir R$ 121,4 bilhões em Minas, incluindo investimentos regionais. Deste total, R$ 36,7 bilhões serão aplicados em empreendimentos exclusivos no estado, outro dentro de projetos também de outros estados. No processo de seleção do novo PAC, já recebemos mais de 4 mil propostas para projetos em 94% dos municípios de Minas, que vão resultar em melhores serviços públicos, mais qualidade de vida, mais desenvolvimento e mais emprego. No novo Minha casa, minha vida, já selecionamos 110 empreendimentos em 40 municípios, que vão assegurar 16 mil moradias para a população de baixa renda. Temos toda a disposição de fazer com o governo de Minas as parcerias necessárias. Nosso compromisso é melhorar a vida e gerar cada vez mais oportunidades.

As estradas são um dos grandes problemas no estado, tal como a “Rodovia da Morte” (BR-381). Quais investimentos serão efetivados nestes três anos, para que possamos diminuir o número de vítimas?


Primeiro, sobre a BR-381, que é um compromisso que assumimos. Fizemos a primeira chamada de concessão em novembro, mas não apareceram interessados. Vamos fazer obras públicas em dois trechos delas, enquanto preparamos um novo leilão este ano. E estamos trabalhando para melhorar a atratividade do projeto sem pressionar o valor da tarifa. A malha rodoviária federal ficou abandonada nos últimos anos, sofrendo deterioração contínua. Em Minas Gerais, que tem a segunda maior malha rodoviária federal do país, o descaso dos governos anteriores teve um imenso impacto. Ano passado, já retomamos os investimentos. Em Minas Gerais, os recursos saltaram de apenas R$ 276 milhões em 2022 para 517 milhões em 2023, com previsão de aplicação de R$ 1 bilhão em 2024. Com isso, estamos revertendo a degradação da malha e as pessoas vão ver as obras e os resultados. Com o Novo PAC, em termos de novos investimentos, teremos 18 obras rodoviárias públicas no estado de Minas Gerais, que totalizam R$ 4,08 bilhões. São obras de pavimentação, construção de viadutos, ampliação e melhorias em todo o estado, com reflexos na segurança do usuário e na redução do custo do transporte. Além disso, em 2024, iremos conceder quatro novos trechos rodoviários para o setor privado, numa extensão de 1.797 quilômetros, com investimentos totais previstos da ordem de R$ 20,7 bilhões. Em Belo Horizonte, especificamente no Anel Rodoviário, nós vamos investir inicialmente R$ 65,7 milhões na construção de um viaduto, uma passagem inferior, alça rodoviária e passarela. O investimento, com recursos federais, se dará por meio de convênio entre o Dnit e a Prefeitura de Belo Horizonte, a ser formalizado ainda em fevereiro. Então, as pessoas, no fim desse governo, poderão comparar como estarão as estradas de Minas Gerais e como estavam em 2022.


Qual nota o senhor daria para a relação com o Congresso Nacional, no primeiro ano de mandato? O que destacaria das relações com os presidentes Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e Arthur Lira (PP-AL)?


Nós somos poderes independentes, que têm que ter relação harmônica, não cabe um dar nota para o outro. A relação com o Congresso tem sido de diálogo e respeito. O Congresso aprovou em 2023 medidas importantes, em especial a reforma tributária, que era um assunto discutido faz décadas. Na realidade, já em 2022, antes mesmo da posse, o Congresso aprovou a PEC [proposta de emenda à Constituição] da Transição, que foi fundamental para fecharmos o Orçamento de 2023, com todos os investimentos necessários para trazer de volta programas sociais que haviam sido extintos ou desfigurados pelo governo anterior. Eu destacaria uma reunião que tivemos com investidores americanos em Nova York, eu, Lira e Pacheco na mesma mesa. Os americanos disseram que isso seria impossível nos Estados Unidos, devido à polarização do país. Nós conseguimos mostrar que existe respeito mútuo. Divergências são normais. O importante é conseguirmos superá-las para trabalhar juntos no que interessa ao Brasil.

 
O senhor acredita que os governos federal e estadual chegarão a um acordo, em 2024, para o pagamento da dívida de Minas com a União? O que falta para este acordo ser efetivado?


Nós temos uma proposta para lidarmos com essa questão feita pelo presidente do Senado Rodrigo Pacheco, e pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, que está sendo analisada pelo ministério da Fazenda e assim que ela for consolidada queremos discutir esse assunto com o governo de Minas Gerais.


Como avalia a disputa pela prefeitura de Belo Horizonte neste ano? Qual a possibilidade de uma frente única, com Fuad Noman e Rogério Correia juntos?


O cenário eleitoral em Belo Horizonte ainda está se desenhando. Eu espero que a gente consiga juntar as forças democráticas, de preferência no primeiro turno, contra a extrema direita negacionista, essa gente que aparece nas redes digitais com um discurso maluco, e que na hora de governar não sabe o que fazer.


Por que Minas Gerais está entre os últimos estados a serem visitados pelo senhor como presidente?


No primeiro ano foi importante recuperar a imagem do Brasil no exterior, que foi muito desgastada pelo governo anterior. O Brasil tinha se transformado num pária mundial. E aqui no Brasil estávamos reorganizando o governo. Foi preciso muito trabalho para reorganizar o governo depois da bagunça deixada pelo governo anterior, preparar projetos, retomar obras paradas. Então, não consegui visitar todos os estados que eu queria no primeiro ano.


Como o senhor entende que é possível melhorar a relação com o governador Romeu Zema? O senhor confirma o convite feito ao governador para o evento nesta quinta-feira?


Fui eleito para governar para todos os brasileiros. Fomos todos eleitos pelo povo, com o compromisso de melhorar a vida das pessoas. O governador não precisa gostar de mim. Não precisamos ser amigos, precisamos ser parceiros, por Minas e pelo povo mineiro. O governador Zema foi convidado para o evento, da mesma forma que foi várias vezes convidado para ir a Brasília defender os interesses do estado.


Aqui está uma das maiores incidências de dengue no país, com 12 mil casos confirmados, e estado de emergência declarado. Será feita alguma ação específica neste momento? E como evitar futuras epidemias?


A dengue é um problema de saúde que é responsabilidade de todos. Desde cada morador evitar criar focos em casa, os prefeitos, governadores e governo federal. O mosquito não viaja de uma cidade para outra. Se cada pessoa cuidar de casa e da rua, se os governos locais, a tendência é conseguirmos reduzir os focos do mosquito. O governo federal está ajudando. Somos o primeiro país do mundo a oferecer a vacina no seu sistema de saúde, mas ainda não há a produção das doses disponíveis para o país todo. A partir deste mês, vamos atender regiões e públicos prioritários, na faixa de 10 a 14 anos, conforme cronograma definido pelos gestores técnicos do SUS, com base na incidência de casos de dengue em cada local. Esperamos que muito em breve a vacina seja produzida também no Brasil, além da vacina do Butantan que está em fase de testes, para ampliarmos a oferta.