Brasília – O ex-presidente Jair Bolsonaro, por meio de sua defesa, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a devolução do seu passaporte apreendido pela Operação Tempus Veritatis, que investiga uma suposta organização criminosa que teria planejado um golpe de Estado no país. Os advogados argumentam que a apreensão não preenche requisitos legais, por não ter sido demonstrado, segundo a defesa, risco real de fuga, por exemplo. Eles pedem que a retenção do passaporte seja substituída pela obrigação de pedir autorização para deixar o país por mais de sete dias.
No pedido, a defesa sustenta que Bolsonaro “desde o início do processo tem cooperado de maneira irrestrita com as autoridades, comparecendo pontualmente a todos os chamados e colaborando ativamente para o esclarecimento dos fatos”. A apreensão do passaporte foi determinada pelo ministro Alexandre de Moraes a pedido da Polícia Federal e com aval da Procuradoria-Geral da República. Essa foi a única medida cautelar tendo Bolsonaro como alvo. Os demais investigados, incluindo militares de alta patente, também tiveram os passaportes apreendidos, bem como foram proibidos de se comunicar entre si.
A defesa do ex-presidente sustenta ainda que a retenção do passaporte viola o direito à locomoção e teria adquirido caráter de antecipação de pena. Para os advogados, Bolsonaro “está sendo tratado como culpado, não só por este juízo como também pelos veículos de comunicação”. Na petição, os advogados acrescentam que durante todo o ano de 2023 Bolsonaro precisou se ausentar do país apenas uma vez, para comparecer à posse do presidente argentino Javier Milei, e que avisou sobre a viagem ao Supremo com antecedência.
A operação da PF realizada na última quinta-feira aumenta a pressão no entorno de Jair Bolsonaro. Caso seja processado e condenado pelos crimes de tentativa de golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático de direito e associação criminosa, o ex-presidente poderá pegar pena de até 23 anos de prisão e ficar inelegível por mais de 30 anos.
O ex-presidente já foi condenado pelo Tribunal Superior Eleitoral por uso da máquina na última disputa presidencial e por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral e é alvo de diferentes outras investigações no STF. Ele está inelegível ao menos até 2030. Em vídeo em que convoca apoiadores para uma manifestação no próximo dia 25, na Avenida Paulista, Bolsonaro diz que estará presente para se defender de todas as acusações imputadas contra ele nos últimos meses.
Em entrevista à TV Record, veiculada na última sexta-feira, Bolsonaro falou sobre o vídeo em posse da PF da reunião ministerial realizada em 5 de julho de 2022, a três meses das eleições, ocasião em que ele e auxiliares discutem claramente cenários golpistas. “A divulgação dela [reunião] não vejo nada demais. Tem trechos ali muito importantes que eu vou fazer os recortes e vou divulgar. Eu nem sabia que existia essa gravação. Se alguém tivesse pedido para gravar eu autorizaria”, disse.
MAURO CID
A Polícia Federal utilizou dados de celulares e de entrada e saída do Palácio da Alvorada, residência oficial do presidente da República, na investigação sobre a minuta de decreto que determinava um golpe de Estado, a prisão de Alexandre de Moraes e a convocação de novas eleições após a derrota de Jair Bolsonaro em 2022. A existência do documento foi revelada à PF pelo tenente-coronel Mauro Cid, que foi ajudante de ordens de Bolsonaro, na delação premiada homologada pelo STF.
Os registros da movimentação no Palácio da Alvorada e os dados de Estações Rádio Base permitiram à PF confirmar o relato de Mauro Cid e conseguir mais detalhes sobre os participantes dos envolvidos na elaboração da minuta e como eles se comunicaram. A partir dessas informações e de dados descobertos no celular de Cid, a PF afirma que Jair Bolsonaro sabia da existência da minuta, pediu e fez ajustes no conteúdo e a apresentou a militares também investigados pela tentativa de golpe de Estado para manter o ex-presidente ilegalmente no poder.
De acordo com a PF, a cronologia foi a seguinte: em 19 de novembro de 2022, a minuta foi apresentada a Bolsonaro no Palácio da Alvorada; em 7 de dezembro, foi apresentada a Bolsonaro novamente e a militares no Alvorada; em 9 de dezembro, Bolsonaro elimina tópicos do decreto e apresenta a militares favoráveis ao golpe. “É hoje o que ele fez hoje de manhã? Ele enxugou o decreto, né? Aqueles considerando o que o senhor viu e enxugou o decreto, fez um decreto muito mais, é... resumido, né?”, afirmou Cid ao então comandante do Exército, general Freire Gomes, segundo informações do Exército, em 9 de dezembro. O decreto não chegou a ser publicado. A PF agora pretende ouvir Freire Gomes para confirmar a cronologia da minuta do golpe.