O ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, criticou a privatização de presídios e alegou que a violência no sistema carcerário tem resquícios da ditadura militar. "O problema todo do sistema carcerário, ao contrário do que se pode pensar, é a ausência do Estado. Ele se tornou um celeiro para a ampliação do crime organizado", afirmou, em café da manhã com jornalistas. "Se a gente não for capaz de colocar o sistema penitenciário nos termos da lei, do que determina a Constituição, não seremos capazes de lidar com a segurança pública do Brasil."

 

Em setembro do ano passado, um decreto, assinado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, concedeu incentivos tributários para projetos destinados ao sistema prisional e outros setores (saúde, educação etc.). Dessa maneira, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) apoiou a privatização do presídio de Erechim (RS). À época, Almeida criticou a iniciativa dos integrantes do governo federal e afirmou que iriam fazer uma discussão interna acerca do tema. Nesta sexta-feira, ele declarou que o assunto está sendo debatido dentro da gestão.

 

"Não se pode privatizar execução penal. O que eles dizem que privatizam são as construções dos estabelecimentos, a prestação dos serviços. O que, na prática, acaba havendo é uma privatização da execução penal, o que é absolutamente vedado pela Constituição", frisou. "Só o Estado brasileiro pode exercer o poder punitivo. Isso acaba fazendo com que as pessoas lucrem com a prisão. São os alertas que estou dando", disse.



O titular da pasta de Direitos Humanos também comentou sobre a origem da violência no país. "As raízes estão nesta vida miserável que estamos produzindo com a pobreza, na falta de perspectiva para as pessoas, com permissividade na esfera pública. Estamos criando uma sociedade do ódio", disse. "Vejo com muita preocupação que o debate político, em torno da violência e da segurança pública, se dê em torno de medidas de endurecimento da pena, sem pensar em outras camadas do problema", acrescentou.

 

Entre as origens desse contexto, no caso dos presídios, ele lembrou da Casa da Morte — centro clandestino de tortura, em Petrópolis (RJ). O local será transformado em um memorial da ditadura militar e, segundo o ministro, poderá revelar reflexos daquela época existentes no sistema carcerário atual. "É preciso que nós entendamos o que foi a Casa da Morte e como ela se presentifica no sistema prisional. Ela não se refere só ao passado, ela se refere também ao futuro", afirmou.

 

Extrema direita


Ele comentou o fato de que o golpe militar está prestes a completar 60 anos. "O golpe foi contra a democracia, mas também contra o futuro do Brasil. Foi um golpe que envolveu interromper o Brasil no seu caminho de desenvolvimento econômico, colocar o Brasil de joelhos perante poderes estrangeiros. Foi um falso nacionalismo, um golpe de entregar o Brasil para outros países", enfatizou. "Estamos em um momento de disputa da memória. E olha como a extrema direita está muito mais unificada e organizada, eles estão disputando até a memória do 8 de janeiro. Imagina o que eles fazem com o que aconteceu em 1º de abril de 1964."

 

Almeida também adiantou que pretende conversar, nas próximas semanas, com o ministro da Justiça, Ricardo Lewandoski. "Vamos pensar como podemos atuar de maneira mais firme num debate de segurança pública e direitos humanos. Não existe contradição entre eles. Precisamos desmistificar algumas ideias de direitos humanos de que proíbe o uso da força, o que é mentira", ressaltou.

 


O ministro ainda destacou a importância de as políticas públicas de direitos humanos serem permanentes e estáveis. "A gente tem que começar a dizer que a política de direitos humanos é questão de gestão pública e administrativa, temos que ver como transformar nossos sonhos mais altos de direitos humanos em política pública, colocando a técnica a serviço do brasileiro", comentou.

 

Entre as propostas permanentes, ele anunciou a criação da Rede Nacional de Direitos Humanos, que vai receber denúncias e acompanhar todos os passos do que acontece com a pessoa. Para isso, Almeida garantiu que unidades do MDHC serão criadas em diversas regiões do Brasil e vai unir forças com organizações que já fazem esse trabalho de garantir os direitos humanos nos estados.

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