A operação da Polícia Federal dessa quinta-feira (8/2), que mirou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e aliados, incluindo ex-ministros de seu governo, está vinculada ao inquérito das milícias digitais, que tramita em sigilo no STF (Supremo Tribunal Federal) sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes.
Foi no âmbito deste inquérito que foi feito o acordo de delação premiada do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid.
Investigações neste inquérito abarcaram desde a venda de joias presenteadas por autoridades até a suposta falsificação de cartão de vacina.
Na operação desta quinta, a PF cumpre mandados de busca e prisão contra ex-ministros e assessores de Bolsonaro, além de militares envolvidos na suposta tentativa de golpe para manter o ex-presidente no poder. Um dos alvos é o próprio ex-mandatário - ele terá que entregar o passaporte.
Inquérito das milícias
O inquérito das milícias digitais foi instaurado por Moraes em 2021, em um drible à Procuradoria-Geral da República (PGR), que tinha solicitado o arquivamento do inquérito dos atos antidemocráticos.
Na decisão desta quinta, Moraes afirma que a investigação sobre a suposta organização criminosa tem cinco eixos.
Leia: 'Bolsonaro estava redigindo e ajustando decreto para golpe', diz Moraes
Um deles é o de ataques virtuais a opositores. Outros dois são de ataques às instituições, às urnas e ao processo eleitoral, além de um eixo sobre os crimes de tentativa de golpe de Estado e de abolição violenta do Estado democrático de Direito.
Outra linha seriam os ataques às vacinas contra a Covid-19 e às medidas sanitárias na pandemia. E, por fim, um eixo sobre o suposto uso da estrutura do Estado para obtenção de vantagens que possui uma série de subdivisões.
Nelas que estão as frentes sobre os cartões de vacina e sobre as joias.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, à época do avanço das investigações sobre as joias, a inclusão da investigação no inquérito no STF gerou questionamentos sobre a competência da corte na apuração por especialistas em direito penal.
Eles destacavam, porém, que devido ao sigilo, não há conhecimento sobre quais são os eventuais elementos de conexão entre as condutas dos alvos ou provas.
Cartão de vacina
Em maio, Moraes determinou a prisão preventiva de Cid em decisão relacionada às suspeitas em torno da falsificação do cartão de vacinação dele, da esposa, da filha mais nova de Bolsonaro e do próprio ex-presidente. Ele disse em decisão haver fortes indícios dos crimes de falsidade ideológica, uso de documento falso e inserção de dados falsos em sistema de informações.
À época da prisão, em depoimento à PF, Cid não respondeu às perguntas, e sua defesa alegou não ter tido acesso a todo o conteúdo da investigação. Bolsonaro elogiou o militar e disse à PF que, se Cid cometeu algum crime, teria sido à sua revelia.
Nesta frente, Bolsonaro já tinha sido alvo de busca e apreensão em um de seus endereços em maio do ano passado, quando Mauro Cid foi preso.
Joias
Em decisão do ano passado em que autorizou busca e apreensão contra diferentes agentes, entre eles, o pai de Mauro Cid, relacionada às joias presenteadas por autoridades internacionais ao ex-presidente, Moraes cita a investigação do crime de peculato e ainda lavagem de dinheiro.
Em agosto, Cezar Bitencourt, advogado do tenente-coronel, afirmou que Cid confessaria ter vendido as joias a mando de Bolsonaro, mas apresentou um vaivém de versões em seguida, até a proposta de delação. Segundo a revista Veja, Cid teria dito em delação que entregou o dinheiro obtido da venda de dois relógios a Bolsonaro em mãos.
Em entrevista, Bolsonaro já chegou a dizer que Cid tinha "autonomia" como seu ajudante de ordens e que não mandou ninguém vender nada nem recebeu nada.
Para ficar configurado o crime de peculato é preciso que os presentes vendidos sejam entendidos como bens públicos, o que a defesa de Bolsonaro contesta.
Golpismo
No inquérito das milícias digitais, ao descrever o que seriam os eixos de atuação da suposta organização criminosa investigada, Moraes cita os crimes de tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito e também o de tentativa de golpe de Estado.
De acordo com relatório da PF divulgado em 2023, foram encontrados nos celulares de Mauro Cid uma minuta de um decreto de estado de sítio, além de uma espécie de estudo para a viabilidade para a intervenção das Forças Armadas para reverter o resultado das eleições de 2022.
À época, a defesa de Bolsonaro afirmou em nota que os diálogos encontrados reforçavam que o ex-presidente não participou de articulações golpistas e que o celular do ex-assessor havia se tornado uma "simples caixa de correspondência" para as "mais diversas lamentações".
Em sua delação premiada, Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, citou uma minuta que teria sido entregue pelo ex-assessor Filipe Martins para convocar novas eleições e prender adversários.
A decisão de Moraes, nesta quinta-feira (8) afirma que o ex-presidente teve acesso e pediu modificações na chamada "minuta do golpe", mantendo a previsão de prisão de Moraes.