O Fundo Eleitoral de R$ 4,9 bilhões das eleições deste ano, valor 150% maior do que na disputa municipal de 2020, tem atraído uma gama de interessados em prestar serviços para os candidatos. Diferentemente da campanha passada, quando foram eleitos deputados, senadores, governadores e o presidente da República, o pleito de 2024 vai definir vereadores e prefeitos das 5.5568 cidades brasileiras.
Dessa forma, os recursos são mais pulverizados nos municípios, gerando emprego, renda e oferta de mais diversos serviços – desde curso para advogados atuarem na área eleitoral até aulas de impulsionamento de campanhas nas redes sociais, passando pelos tradicionais santinhos que prometem aumentar o faturamento da indústria gráfica.
A expectativa da Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf) é que o valor recorde do Fundo Eleitoral tenha impacto positivo para as empresas do segmento no país, diz o presidente, Julião Flaves Gaúna. "As eleições municipais movimentam um enorme número de candidatos e, neste ano, os partidos contarão com valor recorde para investir nas campanhas”, afirma.
Segundo ele, em ano eleitoral, é registrado um aumento médio no faturamento mensal de até 30% em cerca de 73% das gráficas do país que fabricam folhetos, adesivos, santinhos e banners.
Apesar das redes sociais terem um papel fundamental nas eleições, para ele o material impresso ainda “é muitíssimo utilizado”. “Tudo que é impresso se torna um documento e, portanto, gera maior credibilidade na exposição do perfil dos candidatos para grande parte da população, pois é menos sujeito a fake news”, defende.
A verba do Fundo Eleitoral pode ser usada para cobrir quase todas as despesas da campanha, mas é preciso cuidado com a prestação de contas para não cair na malha fina da Justiça Eleitoral. Nas eleições de 2022, somente em Minas Gerais, até agora 124 candidatos já tiveram que devolver aos cofres públicos R$ 1,4 milhão devido à desaprovação de suas contas pelo Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG).
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A advogada Merylin Ferreira, proprietária da Fórmula Eleitoral, empresa especializada em assessoria jurídica e contábil para candidatos, afirma que a prestação de contas das campanhas deve ser feita em 72h, o que demanda muitas vezes ajuda de especialistas, abrindo campo para quem presta serviço nesta área. Mas os gastos, segundo ela, não podem ser ilimitados, mesmo que o valor do fundo para as eleições deste ano seja mais elevado.
De acordo com Merylin, todos os anos a Justiça Eleitoral divulga o percentual máximo que os candidatos de cada município podem gastar com os serviços contratados. Esse valor, segundo ela, leva em conta o eleitorado de cada cidade. “Há um limite, de acordo com o número de eleitores, para, por exemplo, contratar cabos eleitorais”, explica a advogada, que aposta em um crescimento na prestação dos serviços em função do maior volume de recursos.
Mas, segundo ela, o fundo não é dividido de maneira igualitária entre os diretórios municipais, pois o comando das legendas tem autonomia para direcionar as verbas para as candidaturas que considerar mais estratégicas. “Por isso, a verba tende a ficar mais concentrada nas capitais e cidades polo”.
Uma modalidade de serviço para candidatos que tem crescido são os cursos especializados em marketing, principalmente para aqueles que não exercem cargos eletivos. As ofertas nessa área vão de cursos presenciais a aulas online para quem tem pouca experiência e recursos.
O Eu Vereador, por exemplo, é uma plataforma que vende cursos para quem busca uma das 58,2 mil vagas que estarão em disputa nas eleições deste ano, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Administrador da serviço, Daniel Mendonça, afirma que a expectativa para este ano é de 20 mil alunos contra 13 mil da eleição municipal anterior.
Sem financiamento privado
O Fundo Eleitoral foi criado com o pomposo nome de Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC) após o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir, em 2015, pela ilegalidade do financiamento privado para as campanhas.
Usado pela primeira vez nas eleições de 2018, ele é alvo de críticas e propostas de alteração no Congresso Nacional. No entanto, na avaliação de Edson Rezende, que durante 31 anos foi promotor eleitoral do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), a modalidade é necessária, pois a falta de recursos acaba privilegiando quem já exerce algum cargo eletivo ou tem maior poder aquisitivo, desequilibrando a disputa.
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“Em 2016, tivemos a primeira experiência de eleições sem financiamento privado, em que já estava vedada a doação de pessoa jurídica e ainda não havia o fundo, e as campanhas municipais sofreram muito”, afirma. Para ele, diante da vedação de financiamento privado, o FEFC é “necessário para concretizar aí o ideal mínimo de democracia, a busca de igualdade de oportunidade entre os candidatos”.
No entanto, Rezende defende uma regulamentação mais criteriosa dessas verbas, pois a legislação atual que rege seu uso diz apenas qual é a fonte do recurso, o Orçamento da União, como é feita a distribuição entre as legendas, “mas não desce ao detalhe sobre como os partidos devem gastar esses recursos”.
Não há, por exemplo, vedação à contratação de empresas e serviços fornecidos por parentes dos candidatos. “Por ser um recurso público, eu acho que a lei poderia especificar melhor o uso desse dinheiro e as vedações, até para dar aos candidatos bem intencionados uma melhor segurança com relação ao uso”, conclui.