Apesar da insistência da Frente Parlamentar Evangélica e da bancada católica por um adiamento, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, confirmou para esta quarta-feira a retomada do julgamento sobre a descriminalização da maconha para uso pessoal. Até agora, cinco ministros votaram para liberar a prática sem que o usuário sofra penalidade. Os magistrados avaliam qual será a quantidade limite que não caracterize tráfico. Até o momento, a sugestão mais aceita é de até 60 gramas.
Barroso recebeu os parlamentares das bancadas evangélica e católica, nesta terça-feira, na sede do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília, para tratar do tema. Eles pediram ao ministro que adiasse a votação.
Segundo nota emitida pelo STF, Barroso explicou que a Corte não decidirá sobre liberação das drogas, mas, sim, a respeito dos parâmetros para dizer o que é caracterizado como tráfico ou porte para consumo pessoal. O ministro ressaltou que foi o próprio Congresso Nacional que derrubou a pena de prisão para o porte de drogas.
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Também conforme o comunicado, Barroso afirmou compreender a preocupação, mas disse que sempre que há um tema controvertido em julgamento são formulados pedidos de adiamento. Ele afirmou não ser possível atender, pois a pauta ficaria esvaziada.
"Não vamos liberar a maconha. Eu sou contra as drogas e sei que é uma coisa ruim. E é papel do Estado combater o uso de drogas ilegais e tratar o usuário", enfatizou, durante a reunião.
O presidente do STF se dispôs a discutir em conjunto com as bancadas alternativas para lutar contra o tráfico por meio de políticas públicas. "O tráfico está dominando nosso país e temos que admitir que o que estamos fazendo agora não está dando certo. Precisamos mudar nossos planos. Vamos conversar em conjunto, sem ideologias", frisou.
Antes da reunião, o presidente da Frente Parlamentar Evangélica, deputado Eli Borges (PL-TO), disse ao Correio que o grupo tentaria adiar a sessão do tribunal para que o assunto fosse mais bem debatido e que fossem esclarecidos "os riscos e as consequências da liberação da maconha". "É fundamental que a sociedade se manifeste. E temos certeza de que, diante do que se vê no mundo, onde foi liberado, irá se posicionar contra", assegurou.
Na gestão da ministra aposentada Rosa Weber como presidente do STF, parlamentares evangélicos fizeram pressão para que o tema fosse retirado da pauta de julgamentos ou que a Corte se abstivesse de analisar o assunto e aguardasse manifestação do Congresso.
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O tema foi pautado justamente por Rosa Weber. A medida é vista como importante para reduzir o encarceramento em massa no país e evitar prisões sem justificativa relevante de moradores da periferia, principalmente pessoas negras.
Em uma das sessões sobre o caso, o relator, ministro Alexandre de Moraes, destacou que na ausência de uma definição legal da quantidade permitida por usuário, a polícia está praticando parâmetros por conta própria. O magistrado destacou casos de moradores da periferia presos por tráfico portando menos de 10 gramas, enquanto nos bairros mais ricos, usuários pegos com até 100 gramas não eram acusados de tráfico.
Medidas educativas
Atualmente, o artigo 28 da Lei Antidrogas prevê que é crime adquirir, guardar e transportar entorpecentes para consumo pessoal. No entanto, não fixa pena de prisão, mas, sim, a aplicação de medidas educativas, como a obrigação de fazer um curso contra drogas, prestação de serviços à comunidade ou advertência. O delito de tráfico de drogas, ou seja, porte, armazenamento ou transporte para venda ilegal, não está em análise e continuará sendo punido com pena que pode variar de 5 a 20 anos de reclusão.
O julgamento será retomado com o voto-vista do ministro André Mendonça. No ano passado, ele pediu mais tempo para analisar o caso. Devolve o processo agora em razão do prazo regimental máximo de 90 dias para manter uma ação travada para avaliação pessoal. Outros quatro ministros ainda precisam votar: Dias Toffoli, Luiz Fux, Kássio Nunes Marques e Cármen Lúcia. Se um deles for favorável, a decisão estará tomada.
A Corte julga o caso da prisão em flagrante de um homem que portava três gramas de maconha dentro do centro de detenção provisória de Diadema (SP). A Defensoria Pública alega que a proibição viola direito à privacidade e a liberdades individuais.