Atos da esquerda ocorreram em diversas captais pelo Brasil, e não apenas em São Paulo -  (crédito: Rovena Rosa/Agência Brasil)

Atos da esquerda ocorreram em diversas captais pelo Brasil, e não apenas em São Paulo

crédito: Rovena Rosa/Agência Brasil

Líderes da oposição ao presidente Lula (PT) avaliam que o esvaziamento dos atos deste sábado (23/3) refletem erros da esquerda e reforçam a capacidade de mobilização popular de Jair Bolsonaro (PL).

 

Para dirigentes de partidos aliados a Bolsonaro, por mais que Lula em si não tenha se engajado na convocação dos protestos, é inevitável compará-los às manifestações que têm se mobilizado em torno do ex-presidente - investigado, dentre outras coisas, por tentativa de golpe de Estado no final do seu governo.

 

A mais notória delas foi no final de fevereiro, na avenida Paulista, em ato chamado pelo ex-chefe do Executivo Federal para que ele se defendesse das acusações de que teria tramado um golpe de Estado. Na ocasião, o próprio Lula admitiu que o evento foi "grande".

 

Além de o "timing" ter sido considerado um equívoco por políticos de oposição -e por integrantes do próprio governo-, para os oposicionistas ouvidos pela Folha, a esquerda está com dificuldade de se conectar com as ruas, ao contrário de Bolsonaro, apesar da série de acusações que pesam contra ele.

 

Nos últimos dias, a PF indiciou Bolsonaro no caso que apura a falsificação de certificados de vacinas contra a Covid-19, por suspeita de inserção de dados falsos em sistema público e associação criminosa. Também diz que a fraude pode ter sido realizada no escopo da tentativa de aplicar um golpe para impedir a posse de Lula.

 

 

Neste sábado, movimentos de esquerda fizeram uma série de atos dispersos pelo país, convocados em resposta ao ato de fevereiro do ex-presidente, apesar do distanciamento do governo e do racha na visão de partidos e militantes sobre a pertinência da mobilização.

 

Os protestos foram anunciados por partidos e entidades após ato no mês passado que reuniu uma multidão na avenida Paulista, em São Paulo.

 

Os temas da manifestação deste sábado acabaram pulverizados, incluindo a lembrança aos 60 anos do golpe militar e pedido de que não haja anistia para golpistas.

 

A pauta contra a anistia contrasta justamente com o que foi pedido por Bolsonaro no ato da avenida Paulista. Na ocasião, ele defendeu perdão aos condenados por penas exacerbadas no dia 8 de janeiro de 2023, quando houve ataques aos Três Poderes.

 

O presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), avalia que a esquerda está desorganizada e que Lula está blindado da realidade.

 

O dirigente atrela que há dificuldade do campo para se conectar com as ruas devido à "frustração de promessas" feitas e não entregues. "A esquerda hoje consegue encher palácios, encher o Diário Oficial com cargos para a companheirada, mas é uma espécie em extinção nas ruas do país", diz.

 

"As manifestações de sábado provam que o vazio de propostas da esquerda produzem o vazio na realidade e na sociedade. Do jeito que vai, a esquerda vai ser declarada espécie em extinção pelo Ibama", provoca.

 

Já o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, vê Bolsonaro com carisma e grande capacidade de mobilização das ruas.

 

"Lula é um camarada que tem prestígio, é a terceira vez presidente da República. Mas o Lula não quis fazer parte de nenhum movimento agora porque não é hora. Depois do tamanho do que Bolsonaro fez, precisavam de 100% de engajamento e ainda assim iam ter dificuldade de fazer igual", disse Valdemar à Folha.

 

Já o líder do PL no Senado, Rogério Marinho (RN), diz que o esvaziamento dos atos mostra uma falta de sintonia da esquerda com boa parte da população.

 

"O que existe hoje é uma falta de conexão do PT e a esquerda com a população, com as ruas. O PT historicamente se acostumou com os recursos provenientes da máquina sindical. Havia sempre um movimento muito forte das centrais sindicais, o que não há mais", afirma.

 

 

"Eles estão com muita dificuldade de voltar. Primeiro porque eles próprios têm dificuldade de defender publicamente as bandeiras defendidas pela esquerda. Eu acredito que o que mobiliza as pessoas é o sentimento de pertencimento. Quem defende publicamente a liberação das drogas e do aborto, por exemplo?", questiona Marinho.

 

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, tentou afastar as comparações com os atos de Bolsonaro durante protesto em Salvador. Ela afirmou que a mobilização da esquerda não tinha o intuito de se equiparar em números ao realizado por Bolsonaro na Paulista, mas sim reforçar o combate a ditaduras e tentativas de golpe.

 

"[O objetivo] é fazer atos pelo Brasil inteiro, independente de tamanho. Para reunir as pessoas e aqueles que lutaram contra a ditadura e deixar aceso na memória que não podemos voltar a esse tempo. E também para dizer que nós não concordamos com a tentativa do golpe do 8 de janeiro."

 

Sobre a ausência de Lula das manifestações, a presidente do PT afirmou que "não é função do governo nem do presidente fazer mobilizações sociais".

 

Havia manifestações programadas para 22 cidades no Brasil e no exterior. As da manhã foram esvaziadas, em capitais como Belo Horizonte, Fortaleza, Curitiba, Campo Grande e Recife, reunindo, em geral, de dezenas a centenas de pessoas. As duas principais, previstas para a tarde, em Salvador e em São Paulo, também registram baixa adesão.