O presidente da Associação Mineira dos Municípios (AMM) e prefeito de Coronel Fabriciano, Marcos Vinicius Bizarro (sem partido), revelou em entrevista ao programa EM Minas, da TV Alterosa, do Estado de Minas e do Portal Uai, que o governo federal precisa sentar para conversar com os chefes do Executivo dos municípios sobre a desoneração do INSS na folha de pagamento.

 

 

“Uma coisa que é absurda: grande parte dos municípios tem o próprio instituto de previdência e o governo nos coloca para pagar também a contribuição do Pasep (Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público), que é a contribuição para aposentadoria do servidor federal”, ponderou.

Bizarro disse também que a dívida de R$ 500 bilhões dos municípios com a União não tem como ser paga. “Quem perde em não querer sentar e não achar um meio termo é o governo federal, porque nós, municípios, queremos pagar o que a gente deve. Só que a gente quer uma condição que consiga pagar essa dívida e não essa bola de neve, onde corre meio trilhão de reais. Isso é impagável”, afirmou.



Formado em medicina, com especialização em geriatria, Bizarro exerceu a profissão por oito anos antes de ser eleito prefeito. Foi eleito presidente da AMM em 2022 e primeiro vice-presidente da Confederação Nacional de Municípios (CNM) para a gestão 2024-2027. A íntegra da entrevista está disponível na página do Portal Uai no YouTube.


Na última semana, o senhor e tantos outros prefeitos estiveram em Brasília, cuidando de assuntos de interesse dos municípios, especialmente para cobrar a desoneração do INSS na folha de pagamento. Em que pé está isso?
A gente vem fazendo essa romaria desde 2023, quando começa a tramitar e consegue o êxito de colocar os municípios junto com os 17 setores da indústria, serviço e comércio. A gente teve aquela oportunidade e pensamos: “Por que não os municípios?”. Se time de futebol tem isenção de 5%, ONGs que prestam serviços têm até 0% e os municípios que prestam serviço no dia a dia para o cidadão, por que não entrar nesse pacote, sendo que a maioria da folha que hoje os municípios arcam é de funcionários que foram colocados por imposição do governo federal, com tantos programas criados ao longo de décadas. E acabou que esse passivo ficou para os municípios. Por exemplo, as equipes de saúde da família foram um programa do governo federal, mas esse passivo de técnico de enfermagem, enfermeiro e médicos ficou para os municípios. Conseguimos passar, entramos e o governo vetou no fim do ano passado. Fizemos uma mobilização muito grande e a gente derrubou esse veto, mas o governo, não satisfeito, com menos de 24 horas mandou tirar os municípios, através de medida provisória. Então, foi uma afronta à decisão do Congresso.


O senhor também esteve com o senador Cleitinho Azevedo para debater este tema?
A gente sabe também que o projeto, do jeito que estava, não era bom para longo prazo. Precisamos ser razoáveis porque essas pessoas um dia vão se aposentar e a situação da previdência não é das melhores. Vamos ter dezenas de reformas ao longo do tempo, porque a gente está mudando, todo dia está mudando o perfil da população, então é natural que tenha, a cada mudança, uma reforma nova. Então, os municípios, vendo que não estava ideal, aproveitaram para colocar essa parte da desoneração junto com a PEC [proposta de emenda à Constituição] 66 , que está tramitando, e tem outros assuntos envolvidos. O governo novamente não se deu por vencido e mandou, em caráter de urgência, o Projeto de Lei 1027, voltando a bagunça toda.

Foi por acordo de líderes? O senhor ficou decepcionado com os parlamentares, especialmente com a bancada mineira?
Com certeza, infelizmente, hoje, o sistema parlamentar nosso é muito frágil. O líder, às vezes, decide por todo um corpo. Então, o cara está ali de deputado e não sabe nem o que está votando. E um projeto deste, com uma sensibilidade tão grande, com o impacto em bilionário em Minas Gerais, e o cara não lê o projeto e nem deixa que ele faça a tramitação normal pelas comissões, mandando direto para plenário. É muita insensibilidade do parlamentar para com aqueles que levaram eles até lá, que foram a grande maioria dos munícipes e os prefeitos.


Mais da metade dos municípios no Brasil está com a situação financeira no vermelho, com folha de pagamento acima do tolerável. Os municípios seguem sendo o maior empregador no Brasil?
Com certeza. Eu diria que em 70% dos municípios a maior empresa que existe é a própria prefeitura. Hoje, os municípios devem para a União quase R$ 500 bilhões porque foi feito o Refis [Programa de Recuperação Fiscal] para os municípios de parcelamento passado do INSS e colocaram para corrigir a taxa Selic. Como um município vai arrumar recurso para pagar? Essa dívida vem de funcionários que no passado foram impostos aos municípios goela abaixo pela União. Esta é a verdade. O município, ao contrário do governo federal, não tem uma máquina que faz dinheiro.


Esta dívida de R$ 500 bilhões não é só INSS?
Não é. Nós temos precatórios, temos renegociação e tem uma coisa que é absurda: grande parte dos municípios tem o próprio instituto de previdência e o governo nos coloca para pagar também a contribuição do Pasep, que é a contribuição para aposentadoria do servidor federal. A PEC 66 é para corrigir essa distorção, tanto para quem deve INSS como para quem deve precatório, congelar no máximo em 1% da receita corrente líquida do município. Então, saímos de uma coisa que é impagável para conseguir ter um horizonte.


Se a desoneração for aprovada, os 853 municípios mineiros podem reduzir as despesas em 4,3 bilhões até 2027. Qual o impacto desta economia?
Impacta de maneira positiva, porque esse recurso, ao invés de ir para a União, fica no município. E a gente pode dar uma qualidade melhor na saúde, uma qualidade melhor na educação e principalmente infraestrutura. Então, acho que isso é importante. A gente já tem dados concretos de que só e janeiro e fevereiro com a queda para 8%, por incrível que pareça, a União está arrecadando mais da parte dos municípios do que ela arrecadava com 20%. E tem um porquê: o município não estava conseguindo pagar os 20% e agora com 8% ele consegue pagar em dia, rigorosamente.


E como está a relação com o presidente Lula?
A relação é institucional. Apesar de os municípios, até o presente momento, não estarem tendo condição de apresentar os projetos, a gente quer colaborar com o governo federal. O governo federal fez um conselho federativo, mas até o momento só tivemos uma reunião e pouco evoluiu na pauta de país, então o governo ainda não parou para governar, por incrível que pareça. A gente também tem pautas estruturantes. Esta (do INSS) é uma muito pequena perto da reforma tributária. O texto base foi aprovado, mas as leis complementares, que são a parte mais importante, ainda não começaram a tramitar. E isso vai afetar diretamente o cidadão e os municípios.


Na campanha eleitoral de 2022, a AMM fez um grande evento, reunindo muitos prefeitos que manifestaram apoio ao então candidato à reeleição Jair Bolsonaro, que acabou derrotado. Isto gerou alguma animosidade com o governo atual?
Nada, nada. Na verdade, não foi um apoio. Nós fizemos uma pauta municipalista para entregar para os candidatos, tanto que na época o coordenador estadual Reginaldo Lopes e a prefeita de Contagem, Marília Campos, receberam a pauta. Só que quem recebeu a gente para entregar a pauta municipalista a nível nacional foi o governo Bolsonaro. Mas nós oferecemos o espaço para ambos. Mesmo que a gente tivesse ido para um lado, o presidente fala que ele quer administrar para todos, então, o mínimo que ele tinha que fazer para aproximar era falar: “Estamos aqui, passou a eleição”. Vamos falar de forma bem clara: se esse projeto de lei da reoneração da folha de pagamentos for aprovado, os municípios que estão mais impactados de forma negativa são os que ficaram com o presidente Lula no Nordeste do país, que concentra 70% dos problemas de dívida do INSS e regime previdenciário. Ele não está ajudando nem quem é dele, imagina quem não é.


Se der tudo errado e não passar a desoneração, como é que vai ser?
Eu vou falar sobre a experiência de Minas Gerais. Nós viemos de 2018 com um problema sério do então ex-governador do Partido dos Trabalhadores, que deixou um rombo nos municípios de mais de R$ 12 bilhões. Então, essa turma de gestor que está aí, que começou lá em 2017, já anda com o freio de mão puxado e mede muito água com fubá. Tanto é que eu digo, sem sombra de dúvida: a melhor safra de gestores que já passou por Minas Gerais é essa que começou em 2017 e que está terminando agora, porque pegou a crise de 2018 e a de 2020 e sobreviveu. E eu quero que quem venha a suceder a gente que seja melhor ainda. Quem perde em não querer sentar e não achar um meio termo é o governo federal, porque nós, municípios, queremos pagar o que a gente deve. Só que a gente quer uma condição que a gente consiga pagar essa dívida e não essa bola de neve, onde corre meio trilhão de reais. Isso é impagável.

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