Cada aumento de 1% nos votos municipais para o ex-presidente Jair Bolsonaro em 2018 e 2022 esteve associado a uma alta de 0,48% a 0,64%, respectivamente, no excesso de mortes dos municípios durante os picos da pandemia, diz estudo -  (crédito: Miguel SCHINCARIOL / AFP)

Cada aumento de 1% nos votos municipais para o ex-presidente Jair Bolsonaro em 2018 e 2022 esteve associado a uma alta de 0,48% a 0,64%, respectivamente, no excesso de mortes dos municípios durante os picos da pandemia, diz estudo

crédito: Miguel SCHINCARIOL / AFP

Cidades onde o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) recebeu mais votos nas eleições presidenciais de 2018 e 2022 tiveram mais mortes durante o pico da pandemia do coronavírus. O levantamento foi feito pela revista Cadernos de Saúde Pública e publicado pela Folha de S. Paulo, nesta segunda-feira (20/5). A pesquisa analisou a relação entre o excesso de mortes registradas em 2020 e 2021 e o percentual de votos obtido por Bolsonaro no primeiro turno das eleições de 2018 e 2022. 


De acordo com o estudo, cada acréscimo de 1% nos votos municipais para o ex-presidente Jair Bolsonaro em 2018 e 2022 esteve ligado a um aumento de 0,48% a 0,64%, respectivamente, no excesso de mortes das cidades durante os picos da doença.

 

 

O professor e pesquisador da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), um dos autores do estudos, explica que a pesquisa mostra uma associação entre um maior excesso de mortes e mais votos em Bolsonaro, não uma relação de causa e efeito.

 

"Houve uma fidelidade enorme no eleitorado. Um núcleo de eleitores continuou a votar nele. A expectativa era que ele seria penalizado eleitoralmente, que a rejeição aumentasse. Isso não ocorreu", explicou Lima. 

 

 

O trabalho aponta que a descrença nos impactos da pandemia, a resistência ao uso de máscara e a demora na implementação de uma campanha de imunização podem ter colaborado para essa associação.

 

Durante a pandemia da COVID-19, a conduta do ex-presidente Jair Bolsonaro foi criticada diversas vezes. Além de ter subestimado a doença, Bolsonaro desestimulou a vacinação, se posicionou contrário ao isolamento social, à época, necessário para conter a propagação do vírus, além de ter defendido o uso de cloroquina para o tratamento da doença, medicamento sem eficácia comprovada

 

 

O pesquisador ressalta que não é possível afirmar se as pessoas dessas cidades eram contrárias ao uso de máscaras ou ao isolamento social por influência do ex-presidente Jair Bolsonaro. Também afirma que não é possível concluir se elas adotaram esses comportamentos por identificação com o ex-presidente e o que era defendido por ele. 


O excesso de mortalidade compara a média mensal de mortes entre 2015 e 2019 com o número de mortes durante os picos da pandemia. O que superar é o excesso. Dessa forma, nem todas as mortes consideradas se deveram a complicações da covid-19. Parte delas, sim, mas outras doenças também entram no cálculo.

 

O professor pontua que "muita gente não tinha acesso a serviços de saúde, porque ele estava sobrecarregado. Essas pessoas morreram de outras causas". De acordo com o estudo, a oposição a Bolsonaro, representada pelos votos no Partido dos Trabalhadores, mostrou uma correlação negativa com o excesso de mortes nos municípios. Ou seja, quanto maior o percentual de votos verificado nos candidatos petistas, menor foi o número de mortes.

 

 

Os pesquisadores associam o fenômeno a polarização afetiva e a política tribal. O primeiro termo se refere a um ambiente político no qual os eleitores apoiam quem defende as pautas étnicas, religiosas e específicas dos grupos deles. Já o segundo se refere a uma tendência de adotarem posições que os diferenciem politicamente, contrárias às da classe política adversária.

 

"Há uma fidelidade até certo ponto cega. Estamos polarizados em um nível político que é o nós contra eles. Você acaba sendo alimentado por informações de dentro do seu grupo. Não conversa com o outro lado", disse o pesquisador.