A oposição ao governo obstruiu a votação de dois projetos do Executivo que propõem alterações nas alíquotas de contribuição para os institutos de previdência dos servidores do Estado (Ipsemg) e dos servidores militares (IPSM). A iniciativa ocorreu nessa quarta-feira (07/5), na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Assembleia Legislativa (ALMG). Nessa empreitada, os parlamentares contrários a Zema ganharam, mais uma vez, o apoio de nomes que representam as forças de segurança.

 

Os seis anos de Romeu Zema (Novo) à frente de Minas Gerais são marcados por uma relação conflituosa com o funcionalismo público. Ante uma política econômica calcada na responsabilidade fiscal e um discurso reiterado de gerir um estado encalacrado por dívidas de gestões anteriores, servidores, de uma forma geral, cobram por reajustes que cubram as perdas inflacionárias. Neste contexto, agentes da segurança pública estão entre as categorias que mais antagonizam com o Executivo. O Estado de Minas recorda as raízes da rusga que motiva protestos há, ao menos, dois anos na capital mineira.

 

As negociações com servidores da segurança pública começaram logo no primeiro ano de governo, em 2019. À época iniciando seu sexto mandato na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), o deputado Sargento Rodrigues (PL) conduziu as reuniões pela recomposição salarial dos agentes, que reclamam um descompasso com a inflação desde 2015. Segundo o parlamentar, os encontros entre sindicatos da categoria, parlamentares, comandantes das forças e membros do Executivo se sucederam entre fevereiro e novembro daquele ano até que os valores fossem acertados.

 



 

Em fevereiro do ano seguinte, o governo do estado enviou à Assembleia o Projeto de Lei (PL) 1451/2020, que trazia o reajuste aos servidores da segurança divididos em três parcelas, sendo a primeira de 13% e as duas seguintes de 12%. A proposta foi aprovada em segundo turno no mesmo mês e chegou para sanção de Zema em 11 de março. O governador vetou parcialmente a medida. Entre as negativas estavam os dois reajustes de 12%.

 

Três meses depois, após negociações ocorridas já durante a pandemia de COVID-19, o veto de Zema foi mantido com 33 votos a favor e 35 votos contrários. Eleito ininterruptamente à Assembleia Legislativa desde 1998 como representante das forças de segurança, Sargento Rodrigues diz que a manutenção da negativa do governador, considerada pelo deputado como um calote, foi obtida após promessas de liberação de emendas parlamentares.

 

“Foram longos dez meses de negociação para chegar ao reajuste acordado. Em 2020, após o veto, o governador mandou seu secretário de Governo, Igor Eto, de gabinete em gabinete para assegurar a manutenção. Ele ofereceu verbas de emenda e conseguiu o resultado”, disse à reportagem.

 

As negociações se mantiveram nos bastidores ao longo de 2021 e, diante da negativa do governo estadual frente às reivindicações, os agentes da segurança pública passaram a organizar protestos gradualmente mais numerosos, eclodindo em atos com milhares de servidores em 2022.

 

Novas promessas, novo mandato

 

Diante dos protestos e da entrada em estado de ‘estrita legalidade’ pelos agentes de segurança, Zema anunciou, em 2022, o pagamento de 10,06% de reajuste relativo ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do ano anterior. Rodrigues lembra também que, durante a campanha pela reeleição, obtida no primeiro turno, o governador voltou a fazer promessas de reajustes anuais pela inflação.

 

“Em plena campanha, Zema compareceu à Associação dos Oficiais e falou que não é possível que servidores da Assembleia e do Tribunal de Contas tenham reajustes anuais pela inflação e isso não se estenda aos outros funcionários. Isso deu uma amenizada. Certamente alguns bobões acabaram votando nele de novo. Ele foi reeleito e simplesmente esqueceu de tudo que falou. E o governo passou a falar que a Lei de Responsabilidade Fiscal impedia o reajuste, o que é uma mentira deslavada, porque ela não proíbe recomposição pela inflação”, afirmou o parlamentar.

 

Questionado sobre o impacto eleitoral do embate com as forças de segurança para Zema, o deputado afirma que o governador não está alinhado ideologicamente à direita e que sua tentativa de se afirmar nacionalmente como nome do campo conservador é uma estratégia artificial.

 

“Essa figura de bom moço do Zema é produto de marketing, essa temática de ser do interior, o capiau da roça. Ao mesmo tempo que faz isso, ele beneficia seus amigos empresários como é o caso de Salim Mattar e companhia limitada. A visão dele de ser de direita é só conversa fiada, tem vários projetos que ele manteve a mesa de dialogo que beneficiou invasores do MST, uma medida, que só serve para que o dono da terra que foi invadida fique décadas no processo de reintegração e depois de o juiz decidir, ainda ter mais uma barreira. A base do governo é orientada a votar em projetos que têm ideologia de gênero, que fala sobre LGBTQIA+, que direita é essa?”, pergunta.

 

A reportagem solicitou um posicionamento do Governo de Minas Gerais sobre o tema. Até o fechamento desta edição, não houve resposta.

 

Em declarações recentes, Zema tem se caracterizado como um nome da direita mais associado ao liberalismo econômico que à pauta de costumes. Em café da manhã com jornalistas realizado em abril, o governador chegou a enfatizar diferenças com o ex-presidente e dizer que a proximidade com Bolsonaro está calcada no fato de que ambos têm “um adversário em comum”, se referindo à esquerda. Adriano Cerqueira, cientista político e professor da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), acredita que o governador mineiro precisa ser mais abrangente ao abraçar as pautas bolsonaristas para ter chances eleitorais.

 

“Hoje a maior liderança de oposição no Brasil é Bolsonaro e ele tem esse potencial eleitoral evidente por conta principalmente dos valores tradicionais e do que a gente pode chamar de pauta dos costumes. Então, o liberalismo econômico por si só não desperta tanta atenção eleitoral no Brasil do que o conservadorismo tem feito. Então a chance de Zema é se aproximar mais do eleitorado de Bolsonaro. Isso pode acontecer como uma alternativa mais viável em relação às demais presentes ou de uma forma mais afirmativa, abraçando mais os valores e ideais. A gente sabe que o Zema tem uma certa dificuldade nesse sentido, ele é mais liberal do que efetivamente conservador, mas para abraçar esse eleitorado de Bolsonaro ele vai ter que inverter essa lógica”, destacou.

 

LINHA DO TEMPO

 

  • Entre fevereiro e novembro de 2019, servidores da segurança negociam proposta de reajuste com governo e chegam a acordo por recomposição dividida em parcelas de 13%, 12% e 12%
  • 06/02/2020 - Projeto de Lei com os termos é enviado à ALMG
  • 19/02/2020 - Projeto é aprovado em 2º turno na ALMG
  • 11/03/2020 - Zema veta parcialmente o projeto, negando pagamento das duas parcelas finais
  • 17/06/2020 - ALMG mantém veto do governo
  • Março de 2022 - Forças de segurança organizam maiores protestos pela recomposição salarial em BH - manifestações seguem acontecendo esporadicamente até hoje
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