FOLHAPRESS - O julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que livrou o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) da cassação levantou discussões a respeito da necessidade de regulamentação do período da pré-campanha eleitoral e de quais gastos podem ser feitos nessa fase.

 

Na terça-feira (21/5), o tribunal rejeitou por 7 a 0 ação que acusava Moro de abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação em 2022. As acusações contra Moro tratavam, principalmente, de temas relacionados aos gastos no período que antecedeu a campanha oficial ao Senado.

 

O PL e o PT argumentaram que os valores foram desproporcionais porque ele almejava inicialmente a Presidência da República, gerando desequilíbrio entre os concorrentes.

 

A conclusão do julgamento foi célere por pressão do Senado sobre o TSE e pela intenção do presidente da corte, Alexandre de Moraes, de fazer um aceno ao Legislativo. Mas também gerou preocupações no Judiciário de que o tribunal acabasse passando o recado a políticos de todo o país, em ano de eleição municipal, de que os julgamentos sobre gastos de pré-campanha serão afrouxados com essa decisão.

 

A própria ministra Cármen Lúcia, que assumirá a presidência do TSE em junho e comandará o tribunal nas eleições municipais, deu recados ao votar sobre o assunto. Ela disse que analisava apenas sobre o caso concreto de Moro, e que não foram apresentadas provas suficientes para que houvesse caracterização de conduta irregular.

 



"Este período de pré-campanha traz uma série de dificuldades, o que se mostra até na nossa jurisprudência", disse a ministra. "Nesta fase não se tem, rigorosamente, de maneira exaustiva e fechada, o que pode e o que não pode [fazer]", afirmou. "[Mas] É preciso alertar que este período [de pré-campanha] não é algo tolerável para qualquer tipo de comportamento."

 

Moraes

 

Ao votar, no fim do julgamento, Moraes também cobrou regulamentação do tema. "Há necessidade de uma alteração no sistema eleitoral brasileiro em relação à pré-campanha", disse, acrescentando que essa divisão em relação à campanha não existe em países como França, Inglaterra e Estados Unidos.

 

"Aqui nós temos essa figura da pré-campanha que gera alguns problemas. Por exemplo, alguém que é ligado a associações comerciais e é um pré-candidato a deputado federal", exemplificou.

 

"Ele, durante dois ou três anos faz palestra em todas as associações comerciais e a associação comercial convida, paga o hotel e o transporte, e isso não é considerado pré-campanha. Quem é ligado a universidade é convidado pelas universidades. Há necessidade de uma regulamentação melhor", afirmou.

 

Moro

 

O próprio Moro disse, num evento de comemoração organizado pela oposição do Senado após a decisão do TSE, que é necessário acabar com a "incerteza jurídica" sobre pré-campanhas. Ele sugeriu que essa discussão seja feita no âmbito do novo Código Eleitoral, que já foi aprovado pela Câmara dos Deputados e teve o texto modificado pelo Senado. O relatório sobre o tema deve ser votado na Comissão de Constituição e Justiça no dia 5 de junho, e pode ser levado ao plenário no mesmo dia.

 

"No meu caso, a tentativa de cassação não era porque a gente tinha excedido gasto de campanha, não foi por caixa dois, mas foi questionamento em cima da pré-campanha, que no fundo está mal regulada", disse Moro.

 

 

"Por ter um certo vazio de regras, muitas vezes o intérprete quer criar regras, e aí vão criando regras meio absurdas e querem aplicar retroativamente." A partir da minirreforma eleitoral de 2015, as vedações às pré-campanhas, que eram mais rígidas, foram flexibilizadas. A regra principal é a de que não se pode pedir voto explícito ao eleitor.

 

Justiça Eleitoral

 

A partir de entendimentos da Justiça Eleitoral, outro tipos de restrições foram sendo formadas, como a vedação a pedidos implícitos de voto (como dizer "em outubro conto com vocês"), além do uso de outdoors para exaltar qualidades pessoais dos candidatos. Também não é permitido gasto excessivo que tire a isonomia do pleito.

 

Especialistas consultados pela Folha ressaltam a importância dessas regras, apesar da falta de regulamentação sobre esse período. "Na pré-campanha é permitido anunciar a intenção de concorrer nas eleições, projetos políticos, ideias e posicionamentos sobre assuntos de interesse do debate público, inclusive pela internet, e participar de eventos partidários", diz Amanda Cunha, coordenadora da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político).

 

Também é possível "impulsionar conteúdos online e usar anúncios pagos, desde que identificado o CNPJ do partido ou CPF do pré-candidato e moderação de gastos ?que nas decisões eleitorais gira em torno de 10% [do total de despesas na campanha], mas isso não está na lei, nem nas resoluções".

 

 

O advogado eleitoral Walber Agra, também membro da Abradep, diz que não considera a prestação de contas na pré-campanha "um terreno sem leis, uma anomia". Ele aponta que resolução do TSE mostra que os gastos da pré-campanha não são "um indiferente eleitoral", mas que devem observar "os impedimentos da campanha" (por exemplo, contribuição de pessoa jurídica) e "devem ser moderados, proporcionais e transparentes".

 

"Dessa forma, os gastos não podem ser exorbitantes, devem ser escriturados, públicos e não configurar qualquer tipo de ilícito eleitoral", afirma. A principal discussão a respeito de necessidade de regulamentar a pré-campanha é a possibilidade de estabelecer um teto sobre os gastos que podem ser feitos.

 

Isso é defendido por parte de acadêmicos e observadores do processo eleitoral, já que a métrica de 10% não está prevista em norma. "Isso clama por uma regulamentação mais detalhada do Congresso", diz o advogado Fernando Neisser, doutor pela USP e professor de direito eleitoral da FGV-SP.

 

Para ele, não há necessidade de que haja sistemas de prestação de contas como acontece durante a campanha, mas que se crie um limite para as despesas. "Um parâmetro de gastos é uma solução mais inteligente e menos burocrática. Uma prestação de contas da pré-campanha vai criar centenas de processos para a Justiça Eleitoral. Há muito mais pré-candidatos do que candidatos."

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