O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, nesta quarta-feira (5/6), que parentes de até segundo grau podem ocupar simultaneamente cargos de chefia nos Poderes Legislativo e Executivo da mesma unidade federativa.
Por 7 votos a 4, os ministros avaliaram que este tipo de situação não configura nepotismo, não é vedada pela Constituição e não cabe ao Poder Judiciário firmar regra.
Seguiram esta posição a ministra relatora do caso, Cármen Lúcia, e os ministros Cristiano Zanin, Kassio Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso. Flávio Dino, André Mendonça, Edson Fachin e Dias Toffoli discordaram.
A ação havia sido proposta pelo PSB (Partido Socialista Brasileiro), que queria evitar, por exemplo, que o presidente de uma Câmara dos Vereadores seja filho do prefeito ou, do mesmo modo, o presidente de uma Assembleia Legislativa e um governador.
A sigla argumentou que a prática compromete a moralidade e a impessoalidade da administração pública.
Cármen Lúcia considerou a ação improcedente e destacou que, pela forma republicana de governo, tanto o chefe do Executivo quanto os demais membros do Legislativo cumprem mandato e são escolhidos pelo cidadão.
Desta forma, estabelecer esta proibição poderia restringir o direito político fundamental dos eleitores e dos detentores de mandatos eletivos, pela avaliação da relatora.
A ministra acrescentou que a definição de uma nova hipótese de inelegibilidade é uma atribuição do Poder Legislativo e não do Judiciário. Por isso, uma possível decisão favorável ao partido poderia infringir a independência dos parlamentares, em descompasso com o princípio da separação de Poderes.
"Mais do que atuar como legislador, o que se pleiteia é que avance o Judiciário como Poder Constituinte, limitando direitos fundamentais de eventuais candidatos a cargos eletivos, estabelecendo um novo caso de inelegibilidade", disse.
Zanin concordou com a ministra e acrescentou que eventuais hipóteses de impedimento podem ser analisadas individualmente, em situações concretas, quando o Judiciário for provocado, e se os princípios republicanos de separação de Poderes se demonstrarem comprometidos.
Moraes seguiu os dois, afirmando que a situação não configura nepotismo e é esperado que os parlamentares exercerão seus mandatos com dignidade.
"Não foi o pai, a esposa, que nomearam o chefe do Poder Legislativo, foi o povo e, depois, num segundo momento, por seus pares. Se um governador distribuir cargos para eleger o parente, isto é abuso de poder político e econômico, não nepotismo. Abusos, sim, devem ser evitados", afirmou.
Divergências
Já o ministro Flávio Dino votou contrário a posição dos colegas, afirmando que a ocupação simultânea dos cargos por parentes compromete a independência entre os Poderes.
Isto porque, segundo ele, dentre as funções do Poder Legislativo, está a fiscalização dos atos do Executivo, bem como ao processamento e julgamento de seu chefe nos crimes de responsabilidade, mediante a instauração de processo de impeachment.
"Outro ponto que deve ser observado é que o Poder Legislativo detém a competência para julgamento das contas anualmente prestadas pelo Chefe do Poder Executivo. Essa atribuição também evidencia um potencial, senão inescapável, conflito de interesses", acrescentou.
Fachin seguiu Dino e disse que a ocupação simultânea dos cargos por parentes propicia a oligarquia política nas esferas municipal, estadual e federal em detrimento do interesse público.
Para o ministro, também cabe ao STF guardar os valores inerentes ao republicanismo "e, assim, assegurar que o cargo público-eletivo seja exercido em prol da res publica (coisa pública)".
"Esse contexto demonstra que o monopólio político de um mesmo núcleo familiar poderá comprometer a função fiscalizadora do Poder Legislativo, fundamental para a manutenção do Estado democrático de Direito", acrescentou.
O representante do PSB, Felipe Santos Correa, citou alguns casos da prática durante o julgamento. Em um dos exemplos narrados, o filho do governador de um estado foi eleito para presidir a Assembleia Legislativa do mesmo estado. "A prática demonstra a ânsia de grupos políticos em tomar o controle dos Poderes", afirmou.
Pelo Senado, a advogada Gabriela Pereira defendeu que, apesar dos objetivos de assegurar a probidade, a moralidade e o combate à corrupção, a ação não tem respaldo nos fatos. Segundo ela, em um universo de mais de 5 mil municípios, são relatados apenas oito casos da prática apontada como inconstitucional.