Greve de universidades dura quase dois meses. Técnicos de institutos federais estão parados há mais de 90 dias -  (crédito: José Cruz / Agência Brasil)

Greve de universidades dura quase dois meses. Técnicos de institutos federais estão parados há mais de 90 dias

crédito: José Cruz / Agência Brasil

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os ministros Camilo Santana (Educação) e Luciana Santos (Ciência, Tecnologia e Inovação) se reúnem, hoje, às 10h, com reitores de universidades e institutos federais para traçar novas diretrizes e anunciar reforço de recursos para o ensino superior e, assim, fortalecer as negociações que possam encerrar a greve no setor.

 

A paralisação dura há quase dois meses entre os docentes e passa de 90 dias para os técnicos-administrativos.

 

O Executivo deve anunciar a inclusão do Ministério da Educação (MEC) no Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), além da recomposição orçamentária das universidades. O atual orçamento de custeio das instituições de ensino superior, de R$ 6,8 bilhões, é considerado insuficiente.

 

A Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) estima que um aporte de R$ 2,5 bilhões seria o necessário para dar conta das demandas das universidades. Na semana passada, a Educação anunciou uma recomposição de R$ 250 milhões.

 

"O ministro (Camilo Santana) se comprometeu a imediatamente retomar os valores que estavam no projeto de lei orçamentária de 2023, que ainda estão muito longe dos valores necessários para as nossas universidades, mas consideramos que é um importante início de retomada do orçamento das nossas universidades federais", disse Márcia Abrahão, presidente da Andifes e reitora da Universidade de Brasília (UnB) ao Correio.

 

A docente ressaltou que o encontro com os chefes das pastas decorre de uma demanda feita pelos dirigentes desde janeiro para que o governo cumpra o compromisso que assumiu na campanha eleitoral com os reitores.

 

 

"Também é uma demanda nossa a apresentação das obras do PAC das universidades, a recomposição orçamentária, que é uma demanda das nossas instituições e uma necessidade para fechar o ano e certamente o tema da greve dos docentes e dos técnicos e técnicas das universidades e institutos federais. Nós iremos, na oportunidade, reforçar a importância das universidades para a sociedade e para a reconstrução do país", destacou.

 

A greve envolve outros pontos, além da recomposição orçamentária do ensino superior federal. No entanto, a categoria não conseguiu chegar em um acordo com o governo na questão da recomposição salarial. A reivindicação dos docentes é de reajustes de 3,69%, em 2024; de 9%, em 2025; e de 5,16%, em 2026. Segundo o Comando Nacional de Greve do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN), o impacto financeiro seria absorvido pela União neste ano.

 

"A proposta é possível financeiramente porque não requer um grande montante de recursos para ser atendida e nem mesmo ruptura com as regras do arcabouço fiscal. Para atender a uma das reivindicações importantes da categoria, como a reposição em 2024 da inflação dos últimos 12 meses, seriam necessários cerca de R$ 580 milhões, dos quais ao menos 27,5% retornariam imediatamente aos cofres do governo na forma de arrecadação tributária", diz a nota de Irenísia Oliveira, do Comando Local de Greve da Universidade Federal do Ceará (UFC).

 

Mobilização

 

Até mesmo a Comissão Executiva Nacional do Partido dos Trabalhadores (PT) entrou em cena para tentar mediar o fim da greve. Novas rodadas de negociação estão previstas para ao longo da semana. O Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI) e o MEC também se reúnem, amanhã, com os técnicos paralisados. Os docentes se encontrarão com os representantes das pastas na sexta-feira.

 

"Tivemos uma semana de muitas reuniões, grandes movimentações por parte do PT e parlamentares. Estamos esperançosos que o governo chegue nas reuniões com propostas que se aproximem das nossas reivindicações", ressaltou David Lobão, coordenador-geral do Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica (Sinasefe).

 

Mesmo que a categoria esteja otimista, Lobão classifica como "lamentável" os sindicatos não terem sido chamados para a reunião que tratará do PAC das universidades, sendo que essa também é uma das razões que motivam o movimento.

 

"O lamentável dessa reunião é o governo não convidar os sindicatos para essa reunião. Porém, temos clareza que essa movimentação do governo só ocorre em função da nossa greve", disse. "Nos cabe registrar essa vitória e fazer uma análise, após o anúncio, para ver realmente se o governo vai tratar a educação Federal com o cuidado que ela merece", completou.

Docentes cobram promessas

 

O professor do Instituto Federal de Brasília (IFB) e membro da direção do Sinasefe regional Lucas Barbosa afirmou que haverá, hoje, mobilização em defesa da classe. Ele reiterou que o fim da greve depende "de uma proposta de reestruturação das carreiras docente e técnica e reajuste salarial".

 

"Seria importante que Lula e o ministro também recebessem os servidores em greve e não apenas os reitores. Até porque não vai ser uma reunião com os dirigentes das universidades e institutos que irá pôr fim à greve, porque ela passa também por reajuste salarial e reestruturação das carreiras", afirmou.

 

O ato ocorrerá na Praça dos Três Poderes, durante a reunião do presidente da República com os reitores. "Não tenho dúvida, que o envolvimento do primeiro escalão, principalmente o de Lula, acelera a construção do acordo. O lamentável é a indisposição do governo em receber os sindicatos. O exemplo está na reunião de hoje, Lula vai tratar de uma importante pauta da nossa greve, mas só chama os gestores, deixa os sindicatos de fora", disse Lobão.

 

Sem acordo

 

Há, também, um outro componente da greve. Em 27 de maio, o MGI firmou um acordo com a Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico Técnico e Tecnológico (Proifes), sem o apoio do Andes. O trato foi suspenso na Justiça e prevê um reajuste de 9% em janeiro de 2025 e 3,5% em maio de 2026, mas não indica correção para este ano — ponto que o Andes não abre mão.

 

No serviço público, não há convenções e acordos coletivos de trabalho, típico das negociações na iniciativa privada. O aumento salarial no serviço público só é válido ao se tornar lei. Assim, o trato entre Proifes e o governo não tem valor jurídico, apenas político. "Embora não tenhamos conseguido reajuste em 2024, e protestamos por isso, nossas demandas foram quase que integralmente atendidas: nova classe de entrada, tornando a carreira docente mais atrativa e o reequilíbrio da carreira, com o reajuste", apontou o presidente da Proifes, Wellington Duarte.

 

Lobão, da Sinasefe, avalia que há uma possibilidade de o governo decidir não apresentar uma nova proposta, tendo em vista o aceite da Proifes. "Acredito que essa seria a pior escolha do governo, pois seria um grande desrespeito a milhares de docentes que estão em greve nesse país. Com a direita tentando capitalizar com a greve da educação Federal, seria uma grande irresponsabilidade o governo trilhar esse caminho", observou.

 

A Comissão de Educação da Câmara, comandada pelo deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), aprovou a criação de um grupo de trabalho para "analisar e propor soluções técnicas atinentes às demandas das Universidades e Institutos Federais de Ensino em greve". Por outro lado, parlamentares da base governista, como Érika Kokay (PT-DF), Érika Hilton (PSol-RJ), Lindbergh Farias (PT-RJ) e Guilherme Boulos (PSOL-SP), assinaram uma carta em apoio à greve dos docentes.

 

De acordo com o balanço do movimento grevista, divulgado na última quinta-feira, 62 instituições estão paradas, com outras três com deflagração de greve prevista para hoje. "Na quarta-feira, docentes da UFMG aprovaram a suspensão da greve, mas as mobilizações foram mantidas", disse o boletim informativo do grupo.