(((Belo Horizonte, MG. O presidente eleito do TJMG para o biênio 2024/2026, desembargador Luiz Carlos Corrêa Júnior durante entrevista ao Programa EM Minas, parceria do jornal Estado de Minas, TV Alterosa e Portal UAI))) -  (crédito: Leandro Couri/EM/D.A Press)

(((Belo Horizonte, MG. O presidente eleito do TJMG para o biênio 2024/2026, desembargador Luiz Carlos Corrêa Júnior durante entrevista ao Programa EM Minas, parceria do jornal Estado de Minas, TV Alterosa e Portal UAI)))

crédito: Leandro Couri/EM/D.A Press

O presidente eleito do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) para o biênio 2024-2026, desembargador Luiz Carlos de Azevedo Corrêa Júnior, revelou no EM Minas, programa da TV Alterosa, em parceria com o Estado de Minas e o Portal Uai, quais considera serem os desafios e metas para o mandato, no qual tomará posse em 1º de julho. Na entrevista, o magistrado também respondeu sobre aborto, saídas temporárias, pouca presença de mulheres nos tribunais e do acordo de reparação pela tragédia de Mariana.



“Eu acredito que o Poder Judiciário tem que falar mais com a sociedade. Viemos de uma época em que havia um ditado e uma prática de que 'o juiz só fala nos autos'. Isso fazia com que os juízes ficassem afastados da sociedade e não dessem satisfações dos seus atos para o conjunto da comunidade para a qual ele trabalha”, afirmou.



Corrêa Júnior tem 58 anos, é natural do Rio de Janeiro e é o atual corregedor-geral do Tribunal de Justiça. Entrou para a magistratura em 1992 e se tornou desembargador 20 anos depois, em 2012. Será o 56º homem a assumir a presidência nos 150 anos de existência da Corte mineira, que ainda não elegeu uma magistrada para o posto.



“Nós hoje temos um número de mulheres que não é grande no tribunal, mas com uma medida afirmativa do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que será aplicada pela primeira vez em nosso tribunal ainda este ano, teremos uma lista exclusiva de mulheres, então uma parte das vagas do tribunal serão ocupadas exclusivamente por mulheres até que isso atinja pelo menos 40%”, revelou.


O senhor acha a Justiça morosa? E, e sim, o que vem sendo feito para resolver isto?

 



É uma realidade. Nós temos ritos processuais, a lei exige que o processo passe por determinados estágios e, por isso, gera também uma morosidade. O que também acarreta a multiplicação de demandas. Nós temos hoje um demandismo muito grande no país; muitas ações são ajuizadas todos os dias, por diversos tribunais e esferas da Justiça.



Durante seu mandato, a tragédia de Mariana vai completar 10 anos. O senhor acredita que teremos um acordo até lá? Como está o processo?

Nós estamos acompanhando, de forma bem próxima. O Poder Judiciário acompanha essas (questões) de repercussão. A questão de Mariana é que houve uma dúvida de competência – se seria da Justiça federal ou da Justiça estadual – mas, de qualquer forma, as juízas da Comarca de Mariana são muito responsáveis e estão preparadas para, caso sejamos reconhecidos como competentes, fazer um mutirão, um trabalho muito forte, para conseguir dar satisfação a essas pessoas que tiveram seus bens e sua vida comprometida com essa catástrofe.



Por que a situação em relação a Mariana (novembro de 2015) travou e no caso de Brumadinho (o desastre com a barragem, em janeiro de 2019) andou mais rápido?

No caso da barragem de Brumadinho, os danos ocorreram apenas em Minas Gerais e a competência foi da Justiça estadual para a reparação dos danos. Nós pudemos fazer um núcleo de cooperação em Brumadinho. Temos juízes e desembargadores trabalhando especificamente nesse processo, então a resposta tem sido dada muito mais rapidamente. Inclusive, recentemente, foi instalada em Brumadinho uma Central de Perícias, para onde levamos médicos, psicólogos e psiquiatras para agilizar o andamento das ações.



O TJMG transferiu R$ 10 milhões para a Defesa Civil do Rio Grande do Sul. Qual a importância dessa articulação ampla da sociedade em tragédias como a catástrofe climática naquele estado?

No momento em que o Rio Grande do Sul mais necessitava de auxílio, transferimos R$ 10 milhões de uma conta destinada ao recebimento de penas pecuniárias, que são casos daquelas pessoas que são condenadas ou fazem acordo após cometerem crimes de menor potencial ofensivo. Nós retiramos R$ 10 milhões dessa conta e mandamos para o Rio Grande do Sul. Além disso, seguindo a orientação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), autorizamos que os juízes das nossas 298 comarcas também encaminhassem valores para a Defesa Civil do Rio Grande do Sul, além dos R$ 10 milhões que foram encaminhados pelo tribunal. Essa articulação é importante, porque todos nós estamos sujeitos a esses eventos climáticos e em um momento de tanta dificuldade dos nossos irmãos gaúchos, nós pudemos dar essa colaboração, ainda que pequena, mas importante para a melhoria das situações.



Como o senhor avalia o projeto de lei que prevê alteração na lei do aborto?

Eu penso que toda alteração da legislação, em especial a penal, não pode ser feita sob paixões, movida por interesses que não sejam técnicos – da análise do processo e do direito penal. Essa modificação, desconhecendo uma realidade de saúde pública que nós temos no nosso país, pode gerar situações em que a vítima seja punida de uma forma muito mais grave que o ofensor. Então, assim como outras alterações que ocorreram – modificações na lei de execução penal – devemos verificar quais as consequências elas estão gerando e, a partir daí, tomar uma decisão. Nada deve ser aprovado de afogadilho.



Eu respeito o Parlamento, nós temos o princípio da separação e independência dos poderes, mas o que eu reitero é que há necessidade de ser estudado com muito carinho, com muito vagar. E – obviamente – quem vai aplicar a legislação é o Poder Judiciário. Toda legislação não pode contrariar princípios e valores que estão na Constituição Federal. O juiz, quando vai aplicá-la, faz um comparativo entre o que diz a Constituição e o que diz a legislação. A Constituição prevê, como um dos princípios mais caros à humanidade a dignidade.



Temos que ouvir médicos, juristas, pessoas que lidam com essa realidade, principalmente em hospitais públicos. É importante que toda mudança que impacte a sociedade passe por esse processo de amadurecimento.



O senhor acredita que existe um desequilíbrio entre os Poderes?

Não, eu não vejo isso. Eu acho que cada Poder está exercendo a sua atribuição constitucional. Enquanto o Legislativo faz as leis, o Executivo administra os órgãos – federal, estadual e municipal – e o Judiciário tem o papel de julgar as demandas que lhe são trazidas. O Poder Judiciário não atua de ofício: sempre que provocado ele dá uma resposta.



Outro assunto em voga, são as chamadas “saídas temporárias” de presos. Qual o posicionamento do senhor em relação ao tema?

Como mencionei, nós temos um sistema legislativo, um conjunto de leis que regulamenta a execução penal. Historicamente, ela vem sendo disciplinada, regulamentada, de uma forma progressiva. A pessoa é presa, no que chamamos de regime fechado no estabelecimento prisional; depois ela evolui para o regime semiaberto, em que começa a trabalhar; no aberto, começa a ir para casa e voltar, para depois receber o livramento condicional, ou seja, livre, mas com o cumprimento de determinados requisitos. Cumprindo o período de prova, acaba a pena dessa pessoa.



A saída temporária, que ficou conhecida como “saidinha”, existe desde 1984 nas leis de Execuções Penais e ela vem sendo executada como forma de ressocialização do apenado. Então, determinadas vezes por ano, o apenado sai do estabelecimento prisional – depois do período inicial fechado, ou seja, em um regime de pena menos rigorosa –, e ele é autorizado a passar alguns dias na sua casa. Normalmente, essas autorizações são dadas em períodos específicos: Dia das Mães, Natal, Páscoa... Isso contribui para a ressocialização.



E quanto ao comportamento desses sentenciados, nessas saídas temporárias?

O que nós temos de estatística é que, das pessoas que saem, mais de 95% não são flagradas cometendo crimes e retornam. Então, essa medida foi tomada em virtude desses menos de 5% que, eventualmente, cometem outro crime na saída. Obviamente, aqueles que descumprem essa autorização sofrem uma punição na própria execução penal.



Bom dizer também que a pessoa presa, quando vai para essa saída, é porque preenche dois requisitos: um temporal, ou seja, já cumpriu determinado período de pena, e um requisito subjetivo, de bom comportamento carcerário. Eu não acho razoável que nós retiremos um direito dos 95% que não são flagrados cometendo crime por causa de uma minoria.



Como pode ser a contribuição do senhor para alterar a percepção da opinião pública de que há privilégios no Poder Judiciário? Por que essa percepção foi disseminada?

Eu acredito que o Poder Judiciário tem que falar mais com a sociedade. Viemos de uma época em que havia um ditado e uma prática de que “o juiz só fala nos autos”. Isso fazia com que os juízes ficassem afastados da sociedade e não dessem satisfações dos seus atos para o conjunto da comunidade para a qual trabalham. Atualmente, temos a percepção de que o juiz decide nos autos, mas tem a obrigação de explicar sua decisão. A partir do momento em que o juiz explica o que faz, que as pessoas conhecerem a vida e a atividade do juiz e da juíza, eu tenho certeza de que verão que é um profissional que está submetido a uma carga de trabalho imensa, com um número de processos sob a sua responsabilidade muito grande. As pessoas vão compreender que o que é dado ao magistrado como benefício da carreira não é um favor, não é um privilégio, é a remuneração a uma pessoa que tem uma atividade diferenciada das demais da sociedade.



Então, a frase de que “o juiz só fala nos autos” tem que ser mudada…

Eu acho que um juiz dá satisfação do que ele fez, mas o juiz não deve adiantar decisão. A parte no processo tem que tomar conhecimento após a decisão ter sido proferida nos autos, mas o juiz é obrigado a explicar a sua decisão. Indo além, acho que a gente tem que usar uma linguagem simples. Já foi o tempo em que o magistrado era visto como uma pessoa diferente, se vestia diferente, não se relacionava com a comunidade, falava uma linguagem incompreensível e era uma pessoa distante de todos. Hoje, nós temos que decidir de forma simples. Nós temos uma campanha no tribunal para o uso da linguagem simples, para todos que leem uma decisão compreendam por que estão ganhando ou perdendo aquela demanda.



A mediação e a conciliação estão ganhando espaço nos órgãos públicos. Como avalia esses processos e qual o impacto no tribunal?

Nós temos centros de mediação e conciliação espalhados por praticamente todas as comarcas do estado, e alguns fora delas, porque o grande caminho hoje para a solução de conflitos é buscar a conciliação e a mediação. A sentença resolve o problema processual, mas nem sempre pacifica aquela relação. A mediação, como a solução é dada pelas próprias pessoas que estão litigando, é muito mais pacificadora. Também estamos instalando no estado de Minas Gerais o que chamamos de fóruns digitais; como o próprio nome diz, não existe nada de papel, e eles estão instalados em municípios que não são sedes de comarca, para que as pessoas não se desloquem (há muitos casos que sequer há transporte público e as pessoas têm que dormir na rodoviária). Esses fóruns também vão proporcionar centrais de conciliação, então a pessoa nem vai precisar viajar para fazer um acordo e resolver sua situação.



Em 150 anos, o tribunal nunca elegeu uma presidente mulher. O que pode ser feito para mudar isso?

Nós hoje temos um número de mulheres que não é grande no tribunal, mas com uma medida afirmativa do CNJ, que será aplicada pela primeira vez em nosso tribunal ainda este ano, nós teremos uma lista exclusiva de mulheres, então uma parte das vagas do tribunal será ocupada exclusivamente por mulheres, até que isso atinja pelo menos 40%.



É como um sistema de cotas…

Exatamente. Um sistema de cotas, uma ação afirmativa. No tribunal nós temos uma promoção por antiguidade e uma promoção por merecimento. Na lista de merecimento, nós teremos uma lista mista e uma lista de mulheres. Inclusive, nas últimas listas mistas, tivemos promoções de mulheres. Vamos aumentar o número de mulheres no tribunal e tenho certeza de que em breve o sistema de Justiça será dirigido por uma mulher.



O senhor é o atual corregedor-geral do TJMG e a partir de 1º de julho assume como presidente. Como está se preparando para essa mudança?

O corregedor atua, na prática, como um administrador da primeira instância. Então, após dois anos trabalhando nesse cargo, fui eleito pelos meus colegas desembargadores para exercer a Presidência no próximo biênio. Nós estamos na fase de transição (entre os dois cargos).



Muda muito…

Muda, porque o presidente além de ser o administrador de todo o Poder Judiciário de Minas Gerais, também é o chefe de um dos poderes do estado. Nós temos um Tribunal de Justiça que é muito grande, com mais de 1 mil magistrados, 13 mil servidores e 298 comarcas instaladas.



Essa configuração está adequada ou ainda existem muitas deficiências na estrutura?

Nós temos condições de realizar um bom trabalho com a atual estrutura. O que nós precisamos fazer é usar de uma forma inteligente, estratégica, essa estrutura que nós temos – tanto material, quanto de pessoal. O Poder Judiciário tem uma missão muito grande de prestar jurisdição em todo o estado de Minas Gerais, mas nós também temos limites fiscais da própria Lei de Responsabilidade, ou seja, limites de gasto com pessoal. Então, nós temos que fazer mais com o mesmo.



Em sua primeira entrevista após a eleição, o senhor destacou que fará uma gestão voltada para a inovação e eficiência tecnológica. Pode detalhar como fará isso e como essa diretriz vai impactar na vida do cidadão mineiro?

Hoje, todos os nossos processos são eletrônicos. A parte, o advogado, tem acesso ao processo de qualquer lugar que esteja, 24 horas por dia, sete dias por semana. Então, nós temos que usar essa facilidade de acesso para agilizar a prestação jurisdicional. Hoje, nós já estamos fazendo cooperações remotas com juízes e também vamos utilizar isso para os servidores.



As obras no Fórum Lafayette estão a pleno vapor. Quando serão concluídas?

Estão de vento em popa. Estive lá recentemente e acredito que no ano que vem vamos conseguir inaugurá-lo de uma forma que vai prestar um serviço de mais qualidade naquele espaço que estava acanhado, separado com inúmeras divisórias. Hoje, na obra, nós temos vãos livres e com isso nós podemos dividir de acordo com a necessidade. A ideia é que fique mais bonito, mais agradável, mas que também atenda bem ao cidadão. (Ígor Passarini)