Ministro do STF, Alexandre de Moraes -  (crédito:  Jane de Araújo/Agência Senado)

Ministro do STF, Alexandre de Moraes

crédito: Jane de Araújo/Agência Senado

LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) - O tema da democracia se sobrepôs ao juridiquês na última rodada de mesas do Fórum de Lisboa. A fala de abertura foi do ministro Alexandre de Moraes, que traçou um paralelo entre os autoritarismos do passado e do presente. 

 

"Mussolini e Hitler chegaram ao poder pelas regras do jogo, o que ensinou uma lição aos democratas. Depois da guerra criou-se um obstáculo aos autoritários: a Jurisdição Constitucional", afirmou. "Por isso o Judiciário é o grande inimigo daquilo que chamo de 'novos populistas extremistas digitais', como pudemos ver nos casos recentes da Hungria e da Polônia", completou Moraes.

 

Para o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), esses populistas encontram terreno fértil em sociedades que têm problemas.

 

 

"O gatilho do descontentamento naquela época foi o empobrecimento da população alemã por causa do Tratado de Versalhes. A guerra acabou, a classe média ascendeu, e agora na Europa vivemos um período de estagnação. A estratégia dos populistas é culpar os imigrantes, os negros, as mulheres, aqueles que supostamente estariam tirando o emprego dessa classe média", disse Moraes.

 

"Para isso os novos populistas usam as redes sociais". Por causa disso, o ministro defende a regulação das plataformas. "Tenho conversado com os representantes das big techs e eles me dizem que é possível remover das redes, usando algoritmos, 93% dos vídeos de pedofilia e democracia", completou.

 

 

"Eu me pergunto por que não fazem o mesmo com os que espalham notícias falsas desvirtuando as eleições. Existem claras razões econômicas. Há duas coisas que fazem sucesso nas redes sociais. O discurso de ódio e o discurso fofo. A raiva contra os adversários e os cachorrinhos com cara de coelhinhos", disparou Moraes.

 

 

Para Moraes, o Judiciário não é a única vítima preferencial dos extremistas digitais. Existe outra: a imprensa. "Eles querem desacreditar a mídia tradicional, que tem responsabilidade pelo que publica. Já as redes sociais são irresponsáveis. Influenciadores que falam sobre tudo sem conhecer nada têm mais audiência que especialistas", afirmou o juiz do STF.

 

 

"Se as big techs não sabiam que estavam sendo instrumentalizadas antes do 8 de janeiro, agora não é possível que não saibam". E concluiu: "Que não se enganem, os responsáveis pelo 8 de janeiro serão punidos."

 

Avanço da extrema-direita

 

A fala seguinte foi do cientista político italiano Riccardo Marchi, que deu um panorama do avanço da ultradireita nas eleições para o Parlamento Europeu.

 

 

Marchi mostrou que radicais e extremistas crescem consistentemente, mas não ainda a ponto de ameaçar as maiorias de centro. Em sua conta, eles dominavam 15% do Parlamento Europeu em 2014, avançaram para 18% em 2019 e chegaram agora a 20%. "Mais que os números finais, o preocupante é que eles chegaram em primeiro lugar em alguns países", diz Marchi.

 

Ele cita os casos da Itália, França, Áustria, Bélgica e Hungria. A primeira-ministra italiana Giorgia Meloni está entre as mais moderadas no universo da ultradireita, mas seu partido, Irmãos da Itália, é descendente direto do fascismo.

 

Na Alemanha, por sua vez, a Alternativa para a Alemanha, que tem neonazistas em suas fileiras, superou os social-democratas e chegou em segundo lugar nas eleições para o Parlamento Europeu.

 

 

No encerramento do debate, cujo tema era "O mundo em eleições e o futuro da democracia representativa", o advogado e político Vitalino Canas, presidente do Fórum de Integração Brasil-Europa, destacou o avanço da ultradireita para além da Europa e América Latina.

 

"Um caso importante é o da Índia, a democracia com mais eleitores no mundo", disse Canas. Ele destacou, no entanto, que o primeiro ministro do país asiático, Narendra Modi - conhecido por criar leis que permitem levar jornalistas e demais vozes críticas à cadeia - perdeu lugares no Parlamento na eleição deste ano.

 

 

Para Alexandre de Moraes, é possível combater os autoritarismos na medida que suas estratégias são conhecidas. "No caso do Judiciário, primeiro eles tentam a cooptação. Depois, usam a velha estratégia de aumentar o tamanho das Cortes, ou tirar de cena os juízes que não foram nomeados por eles, encurtando o tempo da aposentadoria compulsória. Por último, como fizeram no Brasil, atacam os juízes e suas famílias", diz Moraes.

 

"O poder Judiciário brasileiro, no entanto, é independente e corajoso em sua tarefa de defender a democracia."