Lula com Boric: na contramão do presidente brasileiro, o chileno disse ser "difícil acreditar" na reeleição do ditador da Venezuela -  (crédito: Rodrigo Arangua/AFP)

Lula com Boric: na contramão do presidente brasileiro, o chileno disse ser "difícil acreditar" na reeleição do ditador da Venezuela

crédito: Rodrigo Arangua/AFP

Cresce a pressão para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se posicione firmemente sobre as eleições da Venezuela. Nessa segunda-feira, 30 ex-chefes de Estado e de governo — integrantes da Iniciativa Democrática da Espanha e das Américas (Idea) — enviaram ao petista uma carta cobrando que denuncie o que classificam como fraude perpetrada pelo presidente Nicolás Maduro. O Brasil não se posicionou oficialmente sobre o assunto, apenas pediu que o governo de Caracas apresente as atas eleitorais.

 

No Chile, onde se reuniu, nesta segunda-feira, com o presidente Gabriel Boric, Lula se ateve a cobrar "transparência" e falou em "respeito à soberania popular".

 

"Expus (com Boric) as iniciativas que tenho empreendido com os presidentes Gustavo Petro (Colômbia) e López Obrador (México) em relação a processo político na Venezuela. O respeito pela tolerância, o respeito pela soberania popular é o que nos move a defender a transparência dos resultados", disse, em pronunciamento conjunto. "O compromisso com a paz é que nos leva a conclamar as partes aos diálogos e a promover o entendimento entre governo e oposição."

 

 

Lula ressaltou que, "nos últimos anos, o Brasil experimentou uma versão tacanha da mesma combinação de autoritarismo político e neoliberalismo econômico".

Ele comentou sobre as relações entre os dois países no passado e afirmou lamentar que "o Brasil tenha a triste mácula de ter apoiado a ditadura chilena". Usou seu partido como exemplo para explicar como deve funcionar a política externa, na busca por consenso.

"No meu partido, chegamos a ter 19 tendências, que pensavam diferente. Toda reunião a gente ia lá e fazia um trabalho para que a gente conseguisse aprovar uma posição única. Na política externa é a mesma coisa. Cada país tem a sua cultura, cada país tem os seus interesses, cada país tem as suas nuances políticas", frisou. "A gente não pode querer que todo mundo fale a mesma coisa, que pense a mesma coisa. Nós não somos iguais. Nós somos diferentes, isso é extraordinário. A diferença permite que a gente procure encontrar as nossas similaridades."

Já Boric adotou uma posição dura contra o regime de Maduro logo após o anúncio do resultado, dizendo ser "difícil acreditar" na reeleição venezuelana.

No último dia 30, em sua primeira declaração a respeito das eleições na Venezuela, Lula afirmou que "não tem nada de grave e assustador" ou "anormal" no pleito. Segundo ele, para "resolver a briga", é preciso que o governo de Maduro apresente as atas — documentos que registram todos os votos computados por seção. No entanto, apesar da pressão de países e órgãos internacionais por transparência, o governo venezuelano se recusa a fazê-lo.

 

Carta

Na carta a Lula, os 30 ex-presidentes enfatizam: "Exortamos a Luiz Inácio Lula da Silva, presidente da República Federativa do Brasil, a reafirmar seu inquestionável compromisso com a democracia e a liberdade, as mesmas de que gozam seu povo, e a fazê-la prevalecer também na Venezuela".

 

Os ex-chefes mundiais acusam Maduro de fraudar o resultado do pleito para se manter no poder. Eles também repudiam a repressão e as violações dos direitos humanos pelo regime chavista. Além disso, criticam as prisões de opositores que ocorreram após o pleito, e apoiam os protestos liderados por María Corina Machado, principal líder da oposição.

 

Mais do que questionar a reeleição de Maduro, a carta reconhece a vitória de Edmundo González Urrutia nas urnas. "Não exigimos nada diferente do que o próprio presidente Lula da Silva preserva em seu país", diz o documento, que também foi publicado no site da Iniciativa.

 

O Idea reúne 37 ex-chefes de Estado, além de instituições e representantes da sociedade civil. Entre os signatários, estão Maurício Macri, da Argentina; Carlos Mesa, da Bolívia; Juan Carlos Wasmosy, do Paraguai; e Guillermo Lasso, do Equador. O ex-presidente do Brasil Fernando Henrique Cardoso, que também participa do grupo, não assinou a carta.

 

A vitória de Maduro foi proclamada pelo Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, alinhado politicamente com o chavista. Segundo o órgão, o atual presidente obteve 52% dos votos, contra 43% de Edmundo González. Nesta segunda-feira, o candidato da oposição assinou uma nota pública como "presidente eleito".

 

 

Macron

 

Apesar da pressão, Lula recebeu mais um apoio público nesta segunda-feira. O presidente da França, Emmanuel Macron, telefonou para o petista e elogiou o posicionamento do Brasil em relação às eleições venezuelanas. Segundo ele, é admirável que o chefe do Planalto mantenha diálogo tanto com Maduro quanto com a oposição.

 

"Com o presidente Lula, apoiamos o anseio do povo venezuelano por uma eleição transparente. Essa demanda está no cerne de qualquer democracia", escreveu o francês em sua conta no X, em português, francês e espanhol. No telefonema, ele também agradeceu a presença da primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, na abertura das Olimpíadas de Paris. O petista atendeu ao telefonema enquanto estava em Santiago, pouco antes do início de sua agenda de compromissos.