Não deveria surpreender ninguém que os ecos da mais acirrada e violenta corrida presidencial brasileira desde a redemocratização ressoassem pelos pleitos seguintes. O embate entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) nas urnas há dois anos segue vivo em diferentes manifestações sociais e políticas e não foi diferente no primeiro debate dos concorrentes à Prefeitura de Belo Horizonte, transmitido pela Band na última quinta-feira (8).
Como mostrou o Estado de Minas, os nomes do atual e do ex-ocupante do Palácio do Planalto foram citados em 39 oportunidades nas cerca de duas horas do programa. Se a recorrência do tema não espanta, a forma como o tema foi explorado, no entanto, pode ter guiado a percepção de quem assistiu o embate entre os sete disputantes pela cadeira de prefeito.
Embora os sete pré-candidatos à PBH tenham, em algum nível, participado da disputa presidencial de 2022, os nomes mais umbilicalmente associados a Lula e Bolsonaro no pleito atual da capital mineira são o deputado federal Rogério Correia (PT) e o deputado estadual Bruno Engler (PL). A postura dos dois em relação aos seu principal cabo eleitoral, foi bastante distinta durante este primeiro debate e já pode revelar uma estratégia, ainda que incipiente, para a disputa que se encerra nas urnas em outubro.
Desde a primeira pergunta do debate, endereçada pela deputada federal Duda Salabert (PDT) a Engler, o bolsonarista teve a necessidade de desviar de cascas de banana jogadas por seus oponentes, que o incitaram a abraçar as características de seu líder e seu séquito mais fervoroso. Ao contrário de um parlamentar boquirroto, irascível, insensível e negacionista, o que se viu nos estúdios da Band foi um candidato que evitou (inclusive de forma pronunciada) entrar em debates ideológicos e ataques mais ríspidos aos seus oponentes. O deputado foi sereno e praticamente se limitou a elencar as propostas de seu plano de governo.
Se Engler não estressou sua admiração e proximidade com Bolsonaro, a quem é tratado por “meu gordinho preferido”, Rogério Correia não encerrou nenhuma fala no debate sem citar Lula. Além de abrir sua apresentação incluindo o presidente em uma lista de abraços inusitada para quem tem um tempo curto para se manifestar, o deputado chegou a pedir direito de resposta por uma fala em que não foi citado, mas o nome do líder petista foi citado. O parlamentar também foi responsável por um dos poucos momentos de desequilíbrio de Engler no programa ao citar a possibilidade de prisão que ronda Jair Bolsonaro e sugerir que o concorrente se acalmasse tomando uma cloroquina, medicamento que o ex-presidente sugeriu reiterada e irresponsavelmente para curar a COVID-19 durante a pandemia.
A campanha oficial sequer começou, portanto ainda é cedo para traçar cenários na corrida pela prefeitura de BH. Mas a primeira impressão é que a batalha nacional se refletirá na capital mineira com um lulista bem mais aguerrido e, por que não, desinibido que seu principal rival ideológico/partidário. Do outro lado, com um líder inelegível e cada dia mais encalacrado em inquéritos judiciais, o que se vislumbra é um Bruno Engler mais razoável. A estratégia parece fazer sentido, uma vez que o eleitorado radicalmente bolsonarista já está assegurado e o papel de oferecer uma retórica beligerante e paranoica é melhor desempenhado pelo deputado federal Nikolas Ferreira (PL), muito envolvido na campanha.
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Prefeito na mira
A reprodução da rivalidade na política nacional, embora chame a atenção, não foi tanto a tônica do debate na Band como as críticas a Fuad Noman (PSD). Todos os oponentes dedicaram parte significativa de seu tempo para atacar a atual gestão da cidade. De certa maneira, não há nada de novo nessa estratégia, mas o prefeito não reagiu exatamente bem. O candidato à reeleição ficou nervoso em algumas respostas e apostou em uma metáfora curiosa envolvendo pés de manga para dizer que só era atacado por ter produzido muito à frente da cidade.
Mais alternativas
O ataque em pelotão a Fuad no debate talvez deva levar a campanha de Gabriel Azevedo (MDB) a diversificar sua frente. Embora contundente e eloquente, o presidente da Câmara Municipal teve dificuldades em se destacar ao apostar nas críticas à atual gestão da capital (postura que carrega há ao menos dois anos) em um cenário em que o pessedista esteve na vitrine de todos os outros cinco concorrentes à cadeira que ele atualmente ocupa.
Reta final
Faltam cinco dias para o encerramento do prazo para a divulgação de candidaturas para concorrer no pleito municipal deste ano. A partir de 16 de agosto, a campanha começa oficialmente. Em consulta feita ontem, apenas os nomes de Fuad Noman, Gabriel Azevedo e Indira Xavier (UP) constam no sistema do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). No site é possível observar a discrepância patrimonial entre os três que já aparecem na plataforma: o prefeito declara mais de R$ 15 milhões em bens, o vereador tem R$ 1,2 milhão e a líder social tem R$ 592,97.