O que é o tal “retrofit” que os candidatos à Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), da esquerda à direita, estão prometendo para solucionar o déficit habitacional na capital mineira e também o problema da população morando nas ruas? O termo em inglês não tem tradução literal para a língua portuguesa, mas significa algo como modernizar, atualizar, remodelar ou reformar.

 


No caso dos postulantes à PBH, o retrofit prometido nada mais é do que reformar imóveis abandonados cidade afora para que sirvam de moradia popular. Essa proposta vem sendo feita em entrevistas dadas pelos candidatos e também aparece em quase todos os planos de governo, às vezes definida pelo próprio estrangeirismo ou com outras palavras, mas sempre de maneira vaga, sem detalhes de como esse tal “retrofit” poderia de fato sair do papel para solucionar um dos graves problemas de Belo Horizonte.

 


A cidade tem um dos maiores déficits habitacionais do país. Estudo da Fundação João Pinheiro (FJP), divulgado em 2022, aponta a existência na capital mineira de um déficit habitacional de 108.986 domicílios, segundo dados compilados entre 2016 e 2019.


Do outro lado, números do Censo 2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontam a existência em BH de cerca de 108 mil imóveis permanentemente não ocupados.


O número equivale a 9,6 vezes a população em situação de rua na capital mineira, estimada em cerca de 11,3 mil pessoas segundo dados do programa Polos de Cidadania da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Como fechar essa conta?


Um projeto de lei de autoria do prefeito , Fuad Noman (PSD), que prevê o retrofit e a requalificação do Centro da capital foi aprovado na semana passada pela Câmara Municipal de Belo Horizonte, depois de mais de um ano de tramitação.

 


Ele flexibiliza regras de licenciamento e regularização de edificações e concede benefícios para incentivar a transformação de imóveis comerciais em residenciais. Prevê também a possibilidade de a PBH conceder benefícios e incentivos a empreendimentos situados no Centro voltados à habitação popular para famílias de baixa renda.

 




CLAREZA

Mas para uma das coordenadoras do Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM), Edneia Aparecida da Silva, o “tal retrofit” nem precisava de tanta promessa para sair do papel.


Bastava, segundo ela, colocar em prática o Plano Diretor e o Estatuto das Cidades, que prevê a transformação em moradias populares de imóveis com débitos elevados junto ao Poder Público ou que não cumprem sua função social.

 


“O que a gente precisava saber de maneira mais clara dos candidatos é retrofit para quem? Porque moradia popular é diferente de moradia para a população de baixa renda”, frisa Edneia, para quem “a moradia é o princípio de todos os direitos”.


Para ela, o modelo ideal seriam projetos como o que está sendo feito pelo governo federal na Ocupação Zezeu Ribeiro e Norma Lúcia, que fica na Rua dos Caetés, no hipercentro de Belo Horizonte.


O nome é referência ao deputado federal e arquiteto José Eduardo Vieira Ribeiro, autor da Lei da Assistência para a Moradia de Interesse Social, e a Norma Lúcia, militante dos movimentos populares de moradia.

 


O imóvel que hoje abriga a ocupação foi sede do Laboratório Central do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps). Abandonado por duas décadas, ele foi ocupado em 2015 por famílias de baixa renda. Ano passado, o governo federal anunciou a transformação do prédio em moradia para 88 famílias de baixa renda. O projeto arquitetônico para a readequação do prédio comercial para transformação em moradia já está sendo elaborado sob orientação da arquiteta e urbanista Cláudia Pires. A profissional foi eleita em 2022 arquiteta do ano pela Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA). A expectativa é que a obra comece em 2025.

 


Segundo ela, existem no Centro de Belo Horizonte vários imóveis vazios e subutilizados, que não cumprem sua função social, e por isso poderiam fazer parte de uma política pública de retomada desses edifícios para transformação em moradia, incentivadas pelos instrumentos do Plano Diretor.


Na avaliação da arquiteta, a medida combateria o esvaziamento do Centro e traria mais “pujança” à região. “Um exemplo forte disso, que poderia ser um paradigma, é a ocupação Zezeu Ribeiro. Ela será totalmente requalificada e vai passar por um processo de retrofit para abrigar 88 famílias no Centro da cidade. É uma sinalização precisa de que o governo federal quer isso e o governo municipal pode fazer a diferença acompanhando essa política”.

 

“MODELO NACIONAL”

 

Enquanto a obra na Ocupação Zezeu Ribeiro não começa, os moradores seguem vivendo no local.


Leila Soares Ferreira, de 61 anos, é uma das moradoras e coordenadoras da ocupação. Integrante da União Metropolitana por Moradia Popular (UMML), ela afirma que a reformulação do antigo laboratório do Inamps vai ser “modelo nacional” e o primeiro retrofit de BH para moradia popular. “Foi uma vitória a gente conseguir fazer esse retrofit aqui. Foi na luta, na labuta que a gente conseguiu. Tomara que outros prédios abandonados virem moradia para as pessoas pobres”, defende.


Solange Soares de Oliveira, de 42, cozinheira e empregada doméstica, vive no local com os três filhos desde o primeiro dia da ocupação. Ela morava de aluguel no Barreiro e, apesar das condições precárias, elenca diversas vantagens. Segundo ela, as escolas públicas da região central são bem melhores.

 


E mais: “O meio de ir e vir é melhor, porque pegar todos os dias dois ônibus é muito cansativo. Às vezes, dependendo do horário de trabalho, (quando se mora longe) nem tem ônibus para a gente voltar para a casa, além de ser difícil para arrumar emprego”, diz. “Se for concretizar, vai ser maravilhoso, pois têm muitos prédios vazios e muita gente sem casa”, afirma Solange sobre as promessas que vêm sendo feitas pelos candidatos.

 

Siga nosso canal no WhatsApp e receba em primeira mão notícias relevantes para o seu dia


O que é retrofit?

Retrofit é um processo de revitalização de construções antigas que visa adaptar as edificações às necessidades atuais, enquanto preserva a sua arquitetura original. O termo vem do latim retro, que significa "movimentar-se para trás", e do inglês fit, que significa "adaptação, ajuste". No caso da habitação, o termo é usado para a requalificação de edifícios comerciais para uso residencial

compartilhe