Organizado pela família para celebrar os 100 anos do nascimento de Mário Ribeiro da Silveira, livro revela os percalços do médico e ex-prefeito de Montes Claros, no Norte de Minas, único irmão do antropólogo, escritor e senador Darcy Ribeiro (1922/1997) no período da ditadura militar. Acusado de ser “subversivo” e “comunista”, além de ter sido perseguido e preso pela ditadura militar, ele foi monitorado pelo regime, por meio do antigo Serviço Nacional de Informações (SNI).


Tal como Darcy, Mário Ribeiro, que faleceu em 1999, aos 75 anos, também atuou como educador. Em 1969, ele foi um dos fundadores e primeiro diretor da Faculdade de Medicina do Norte Minas (Famed), unidade da antiga Fundação Mineira de Ensino Superior (FUNM), atual Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). Na época da implantação da Faculdade de Medicina, idealizou um projeto de bolsas rotativas para alunos de baixa renda, que serviu de modelo para a criação do programa federal de Crédito Educativo, atual Fies. Nesta segunda-feira (23/9) é comemorado os 100 anos de nascimento de Mário Ribeiro.



A pedido da família do médico e ex-prefeito, foi lançado o livro “Marão – Mário Ribeiro da Silveira – Um visionário progressista do Norte de Minas”, com tiragem limitada. A obra foi organizado pelo antropólogo e pesquisador João Batista Almeida Costa, professor aposentado da Universidade Estadual de Montes Claro e apresenta a biografia e passagens da vida política, acadêmica e social do irmão de Darcy. O livro foi lançado em comemoração ao centenário do nascimento de Mário Ribeiro.

 


Além de artigos de familiares, amigos e pessoas que trabalharam com o ex-prefeito, a publicação revela como Mário Ribeiro foi perseguido pela ditadura militar. No final do livro, são publicadas cópias de “relatórios confidenciais” do antigo SNI sobre o monitoramento e informações levantadas pelo órgão em torno da atuação de Mário Ribeiro no período mais duro do regime militar, no final da década de 1960. Os documentos sigilosos foram mantidos por mais de 40 anos no Arquivo Nacional e liberados para a família em 2011, pelo Ministério da Justiça, a pedido de um dos filhos do médico e ex-prefeito, Mário Ribeiro Filho, o Ucho, auditor da Receita Federal aposentado. No entanto, somente agora, os arquivos do SNI sobre o irmão de Darcy Ribeiro chegam ao público.

 


Entre outras revelações, os “relatórios secretos” do SNI descrevem que Mário Ribeiro teve os direitos políticos cassados pelo Ato Institucional nº 5, o AI-5, editado pelo presidente Artur da Costa e Silva em 13 dezembro de 1968. O ato foi a medida mais dura do regime, que resultou no fechamento do Congresso Nacional.

 

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Os relatórios

 

Nos relatórios do “monitoramento” do SNI, Mário Ribeiro é apontado como “comunista” e “subversivo”, sendo atribuídas a ele várias ações contra o governo militar e a ordem. É acusado ser incentivador da formação de ligas camponesas e que até teria sido o “chefe de um movimento subversivo para conseguir a paralisação dos transportes na Bahia”. Entretanto, a família e as pessoas que conviveram com Mário Ribeiro rebatem o relatório do SNI, garantindo que o irmão de Darcy Ribeiro nunca foi comunista nem liderou ou incentivou nenhum movimento subversivo contra a ordem pública.

 

 

Ele se destacou como médico e empresário, além de político, sendo vereador, vice-prefeito e prefeito de Montes Claros. Foi também secretário de Estado de Trabalho e Ação Social, do primeiro governo Hélio Garcia (1986).

 


Os relatórios fazem referência a uma viagem que Mário Ribeiro fez ao Uruguai para visitar o irmão Darcy, exilado no país vizinho. “Político filiado ao PR. Tem tendências esquerdistas. É irmão de Darcy Ribeiro. Tem muito prestígio na região e é contra a Revolução. Viajou ao Uruguai acompanhado do seu amigo Sinval Amorim, para visitar seu irmão, ao que disse.”

 


Em outro trecho, o relatório do SNI faz a seguinte menção ao médico e educador perseguido pelo regime: “Irmão de Darcy Ribeiro, pessoa de inteligência notória, de grande capacidade de ação. Dono de três cinemas em Montes Claros e outras cidades vizinhas. Conhecido desde os tempos escolares como ‘Mário comunista’. Consta que atua contra o regime e vem levando a efeito vigorosa campanha esquerdista, ameaçando os fazendeiros locais”.

 


Perda de direitos

Os documentos do SNI revelam como o ex-prefeito perdeu direitos políticos por meio do AI-5 e foi preso. Foi ainda indiciado em Inquérito Policial Militar, que acabou sendo arquivado pela 4ª Região Militar (RM) do Exército. Com a suspensão dos seus direitos políticos, ele foi afastado da direção da Faculdade de Medicina do Norte de Minas, que tinha ajudado a fundar no mesmo ano. Ainda em 1969, junto com mais três pessoas de Montes Claros, entre elas o líder trabalhista Porfírio Souza, foi preso em Montes Claros e levado para Belo Horizonte, onde ficou detido por 10 dias, segundo o filho dele, Mário Ribeiro Filho, o Ucho. 

 

“Conhecido desde os tempos escolares como ‘Mário comunista’. Consta que atua contra o regime e vem levando a efeito vigorosa campanha esquerdista, ameaçando os fazendeiros locais”

Citação a Mário Ribeiro da Silveira em documentos do antigo SNI

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