"As pautas municipais não são originalmente ideológicas. Um buraco na rua não é o Bolsonaro ou o Lula que resolve; os dois querem resolver. Tem que focar no que nos une e ir negociando projeto a projeto" -  (crédito: Leandro Couri/EM/D.A Press)

"As pautas municipais não são originalmente ideológicas. Um buraco na rua não é o Bolsonaro ou o Lula que resolve; os dois querem resolver. Tem que focar no que nos une e ir negociando projeto a projeto"

crédito: Leandro Couri/EM/D.A Press

Com a quinta maior votação para a Câmara Municipal de Belo Horizonte (CMBH) entre todos os eleitos, Marcela Trópia (Novo) atribuiu o seu resultado nas urnas a um trabalho consistente realizado ao longo de seu primeiro mandato, marcado por uma atuação técnica, focado nas necessidades da população e uma comunicação transparente e acessível. A vereadora foi reeleita para o segundo mandato com 17.878 votos, 7 mil a mais do que nas eleições de 2020.

 

Secretária-geral da Casa Legislativa, a parlamentar acredita que a nova composição da Câmara Municipal será marcada por uma fragmentação ideológica maior entre os vereadores. A parlamentar acredita que com os novos nomes que irão compor a próxima legislatura, a polarização vai se intensificar, com grupos políticos mais fortes e definidos, o que pode também dificultar a aprovação de projetos de interesse do próximo prefeito e exigir um esforço maior de diálogo e negociação para a aprovação de propostas.

 

 

 

Em entrevista ao Estado de Minas e Portal Uai ontem, Marcela também comentou sobre as suas expectativas e propostas para o próximo mandato, além dos problemas da cidade. A parlamentar afirmou também que não irá declarar apoio à candidatura do deputado estadual Bruno Engler (PL) ou do prefeito Fuad Noman (PSD), que disputam o segundo turno pela Prefeitura de Belo Horizonte, pois aguarda o posicionamento partidário. Apesar disso, afirmou que o partido está em diálogo com o bolsonarista. “Acredito que para a bancada (do Novo) vai ser mais interessante uma neutralidade, porque, para nós, literalmente, tanto faz quem ganhar essa prefeitura”, afirmou. Confira os principais trechos:

 

Ao que a senhora atribui o crescimento expressivo de votos?

Acho que o resultado de uma votação expressiva é resultado de um trabalho ao longo dos três anos e meio que nós tivemos para mostrar para a cidade que dá para fazer política fora da polarização, dá para fazer política de um jeito técnico, atendendo as bases, atendendo a ponta da cidade e carregando isso tudo com uma comunicação muito versátil, muito jovem, muito acessível nas redes sociais. Eu falo que vitória nas urnas nunca é um fator só. Nunca é só um partido muito bom, um padrinho muito bom. Você tem que ter uma somatória de fatores e o mandato representa um trabalho entregue, um trabalho técnico, uma rede social muito forte e uma capilaridade ao redor da cidade que eu consegui manter ao longo desses quatro anos.


Teve alguma proposta que a senhora não conseguiu avançar e que pretende lutar agora nesse segundo mandato?

Eu consegui cumprir todas as propostas que eu prometi em 2020. Algumas delas, ainda não estão em vigência em função da crise política que nós vivemos com a prefeitura. Eu apresentei um pacote de inovação, vale destacar que é um projeto para trazer mais startups para Belo Horizonte resolver problemas da cidade usando tecnologia, e eram três projetos. Eu consegui aprovar dois. Falta o Marco Municipal das Startups, que já está protocolado novamente com 21 assinaturas, e eu espero que, agora, passado o segundo turno, a gente consiga retomar o diálogo com o prefeito atual e o futuro prefeito que assumirá em 1º de janeiro.

 

O outro projeto que, infelizmente, a gente não conseguiu avançar foi a Lei de Liberdade Econômica. Belo Horizonte é uma das poucas cidades de Minas Gerais que ainda não tem uma lei que traz essa nova cultura de como tratar o empreendedor, com mais confiança e mais agilidade no setor público. Essa lei também já está protocolada novamente, agora neste segundo semestre, com a assinatura de vários colegas da Câmara, da esquerda, da direita, da base.


Quem você acha que irá ganhar as eleições?

Pergunta de um milhão de dólares, né? Eu não vou me arriscar. Eu acho que os dois têm pontos a favor e contra nessa eleição. Acho que o Bruno traz um frescor, uma jovialidade, ideias muito parecidas com as minhas, inclusive na pauta econômica, e tem defendido o Marco das Startups abertamente, o que é bom. A gente vê que a equipe econômica dele estudou o que a Câmara já vinha fazendo. Mas a campanha do Fuad tem mais entregas, porque está no cargo, traz essa segurança que o belo-horizontino gosta, né, de reeleger prefeito. Desde quando a gente não reelege prefeitos? Então é uma briga boa de se assistir. Acho que nos próximos 15 dias muita coisa pode acontecer. Eu não vou arriscar nem um palpite.

 

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Não vai declarar apoio? 

Não, por enquanto vou ficar neutra por conta da posição do partido. O partido está em conversa, sim, com o Bruno Engler, mas, mesmo que declare apoio, acredito que, para a bancada (do Novo), vai ser mais interessante uma neutralidade, porque, para nós, literalmente, tanto faz quem ganhar essa prefeitura.

 

O Novo não conversou com o Fuad?

Não, não teve conversa. Apesar da boa base de apoio que o governador Romeu Zema tem na Assembleia, não tem como caminhar junto em função até da atuação de oposição que a bancada teve lá na Câmara, né?


Caso o Fuad seja reeleito, como a senhora espera que seja a relação entre vocês? Houve momentos de conflitos e falta de diálogo direto com a prefeitura, e a senhora chegou a reclamar disso. As coisas melhoraram depois, mas como a senhora espera que a dinâmica se desenvolva, se ele for reeleito?

Eu gosto sempre de dar uma chance para as pessoas. Não é porque o prefeito Fuad e o ex-prefeito Alexandre Kalil fizeram um mandato distante da Câmara Municipal que uma nova gestão não possa começar do zero, até porque o Fuad, nesse momento, se reeleito, vai compor uma prefeitura conforme ele gostaria, conforme as novas alianças que ele trouxe gostariam, e não herdar uma prefeitura de um ex-apoiador.

 

Eu acredito também que com Álvaro Damião como vice-prefeito, que é uma liderança sem igual lá na Câmara Municipal, o diálogo pode se restabelecer. Então, eu conto muito com o Álvaro como uma ponte, como ele sempre gosta de dizer, que ele gosta de ser ponte, e pode trazer um pouco mais dessa visão da importância da Câmara Municipal para a gestão da prefeitura. Eu acho também que as pessoas merecem segundas chances. Não é porque teve uma gestão distante que a segunda não vai abrir portas. Para mim, o jogo começa do zero, sem nenhum rancor, sem nenhuma mágoa. A gente começa de novo, porque o importante é cuidar de Belo Horizonte.

 

Qual é a sua avaliação da capital?

A minha avaliação eu deixo para os telespectadores. Eu não preciso ditar aqui para ninguém. A gente hoje tem vergonha de mostrar a nossa cidade para as pessoas que vêm aqui. Antigamente, era um prazer levar um turista à Praça do Papa, era um prazer mostrar a Praça da Liberdade, ir lá na Lagoa da Pampulha, mostrar a igrejinha. Hoje, a gente fica falando assim: "Então, a praça está em obra, mas era muito bonito aqui, viu? A vista era bacana. Então, a cidade está meio suja, mas é porque está em época de seca, né?" A gente está dando desculpa para explicar um trabalho mal feito da prefeitura.


De modo geral, você acha que a Câmara tem fiscalizado menos a prefeitura?

Pelo contrário, eu acho que por estar fiscalizando muito é que está aparecendo mais coisa que não está sendo bem feita. Muitas vezes o cidadão está percebendo uma coisa meio esquisita, mas na hora que o vereador traz a razão, traz a causa raiz, entende que tem um problema crônico ali. A Câmara mostra a raiz de muitos dos problemas que estão acontecendo na cidade, que o cidadão, ou por não ter tempo, ou por não se interessar, ou por muitas vezes não entender como funciona a gestão pública, não consegue saber de onde vem a culpa, né? Às vezes prega a culpa no prefeito, prega a culpa no governador e não sabe de onde vem muito bem, e o vereador consegue canalizar esses problemas da forma certa. Eu acho que a Câmara está fiscalizando muito mais, dando mais trabalho para a prefeitura.


Como você analisa a nova composição da Câmara de Belo Horizonte?

É uma Câmara com grupos mais fragmentados. Então, a gente tem as pessoas que vão continuar sendo base, independentemente do prefeito que ganhar, tem a direita, tem a esquerda, tem grupos políticos ali dentro também, vinculados a um deputado ou a outro, uma figura mais forte ou outra, mas eu sinto que esses grupos estão mais fortes em termos de identidade. Têm pautas mais claras, estão aglutinados por uma razão mais clara, e vai ser interessante acompanhar a composição dos próximos meses. Aquela massa de vereadores que atende localmente, que não se importam muito com pautas mais ideológicas, esse número se reduziu. A gente tem cada vez mais vereadores preocupados com pautas ideológicas e também regionais, mas sabe aquela grande massa que tinha ali de vereadores que você conseguiria aglutinar 10, 12 vereadores que não têm problema em estar no mesmo bloco de um outro vereador que pensa um pouco diferente, porque o propósito ali da pessoa é trabalhar pela região, pelo bairro, por uma causa, causa animal, pessoas com deficiência, eu acho que esse grupo se reduziu e agora vem uma identidade muito forte. Eu acho que deu uma polarizada meio de um pentágono, de um grande grupo.


 

Com essas correntes políticas diferentes, como você dialoga com os vereadores de outros partidos, de ideologias diferentes, para conseguir apoio para a aprovação das suas propostas?

Eu tento manter um diálogo muito aberto e muito franco com os meus colegas, e eu tenho uma grande premissa: eu não vou sentir raiva ou ranço de nenhum colega vereador, a não ser que eu tenha um motivo muito claro. Porque muitas vezes os colegas chegam na Casa e falam: ‘Ah, fulano é do PT, não vou nem conversar’, ‘Ah, beltrano é meu concorrente de região, não vou nem dialogar’. Eu sou o contrário, eu tento ver o que eu posso extrair de cada relação, o que a gente tem em comum. Porque eu tenho certeza que as minhas colegas do PSOL, por exemplo, que estão diametralmente do lado oposto, conseguem concordar comigo no Marco das Startups. Por outro lado, quando eu vejo lá de cá, na direita, que eu teria mais similaridades com a turma do PL, que às vezes é muito radical em alguns pontos, eu consigo trazer esses votos para uma pauta, por exemplo, de educação, de melhoria do IDEB, do mutirão oftalmológico. As pautas municipais não são originalmente ideológicas. Um buraco na rua não é o Bolsonaro ou o Lula que resolve; os dois querem resolver. Tem que focar no que nos une e ir negociando projeto a projeto.

 

 

Como está a discussão da Mesa Diretora?

Está tudo muito frio. Pós-segundo turno eu acho que as discussões vão se intensificar. Acho muito preliminar para falar "Fulano tem tantos votos, Beltrano tem tantos votos". Eu acho que tem cinco grandes grupos na Câmara e aí tem que esperar o segundo turno. Eu vejo um grupo ligado ainda ao (presidente da Câmara) Gabriel, vejo um grupo ligado ao secretário da Casa Civil, Marcelo Aro, vejo um grupo da direita, um da esquerda e um grupo que aguardam a reeleição do prefeito para fazerem os seus pedidos e comporem a base de governo. Nenhum deles consegue a eleição sozinho, porque afinal, 40 dividido por 5 não chegam a 21, e não são composições simples. Tem polos aqui que se repelem, né? Não vejo direita e esquerda se unindo em um nome de consenso, eu não vejo o grupo do Marcelo Aro e Gabriel se juntando para eleger um nome também. Vai ser uma composição interessante.