Embora as explosões na Praça dos Três Poderes, algumas em frente ao STF, tenham sido consideradas por alguns um ato isolado, a ação do ex-candidato a vereador do PL em Santa Catarina Francisco Wanderley Luiz, conhecido como Tiü França, é reflexo de um fenômeno da radicalização que ainda persiste no país e um risco para a democracia, alertaram autoridades e políticos. Por isso, ações de ativistas políticos radicais como o o homem-bomba de Brasília, que andou pela Esplanada dos Ministérios e pela Praça dos Três Poderes com explosivos no corpo e horas antes circulou pela Câmara dos Deputados, precisam ser investigadas e monitoradas, enfatizaram as mesmas autoridades.
Tiü França jogou duas bombas em frente ao STF e lançou outras contra o próprio corpo, morrendo no local. Ele chegou a entrar no prédio do Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 24 de agosto. Já era famoso por publicar ameaças contra os ministros do STF, políticos e outras figuras públicas nas redes sociais. O autor do atentado contou à sua ex-mulher, identificada como Daiane (ouvida informalmente pela Polícia Federal), que iria matar Alexandre de Moraes e “quem mais estivesse junto na hora do atentado”.
Para Moraes, o ato de Tiü França não deve ser visto como fato isolado. O ministro do STF disse que as explosões em Brasília tiveram origem no chamado “Gabinete do Ódio”, criado na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). “Não podemos ignorar o que ocorreu. O que aconteceu ontem não é um fato isolado do contexto. O contexto se iniciou lá atrás, quando o Gabinete do Ódio começou a destilar discurso de ódio contra as instituições, contra o STF, principalmente, e contra a autonomia do Judiciário”, disse o ministro ao participar de evento no Conselho Nacional do Ministério Público.
O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, rejeitou a expressão “lobo solitário”, usada para definir Tiü França, porque ativistas como ele “têm acesso a pessoas que alimentam o ódio” e “a pessoas que fabricam bombas”. Rodrigues vê ligações entre o ato e os participantes da tentativa de golpe no 8 de janeiro. “Particularmente eu tenho algumas ressalvas dessa expressão ‘lobo solitário’. Ainda que a ação visível seja individual, por trás dessa ação nunca há só uma pessoa. É sempre um grupo ou ideias de um grupo. Ou extremismos e radicalismos”, afirmou.
‘Efeito Trump’
Logo após o atentado, o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, que estava em Montevidéu, em uma reunião de ministros da Justiça do Mercosul, conversou com o presidente Lula e o diretor-geral da PF. Em conversas reservadas, houve uma avaliação de que o atentado já possa ser resultado do “efeito Trump”, a vitória do presidente Donald Trump, na eleição nos Estados Unidos, que estaria fortalecendo ações de grupos de direita e extrema direita no país, identificados com o republicano.
Na Polícia Federal, há uma avaliação também de que o atentado na Praça dos Três Poderes “fortalece” o resultado das investigações do inquérito sobre o golpe do 8 de janeiro, que será encerrado na próxima semana. O ministro Lewandowski, em nota, afirmou que as forças federais de segurança “estão preparadas para assegurar o pleno funcionamento dos poderes constituídos”. De acordo com ele, a PF “está trabalhando com rigor para elucidar, com celeridade, a motivação das explosões na Praça dos Três Poderes, em frente ao Supremo Tribunal Federal, e nos arredores do Congresso Nacional”.
‘Não existe pacificação com anistia’
Entre políticos e autoridades, há quase um consenso de que a anistia aos envolvidos no 8 de janeiro se torna agora uma medida quase impossível depois do atentado na praça dos Três Poderes. “(O atentado) é uma demonstração de que só é possível essa necessária pacificação do país com a responsabilização de todos os criminosos. Não existe a possibilidade de pacificação com anistia a criminosos”, disse Alexandre de Moraes, que também ficará encarregado da investigação sobre o atentado desta quarta.
“O criminoso anistiado é o criminoso impune. E a impunidade vai gerar mais agressividade, como gerou ontem (na quarta, 13). As pessoas acham que podem vir até Brasília e tentar entrar no STF para explodir o STF porque foram instigadas por muitas pessoas, lamentavelmente várias com altos cargos na República”, afirmou Moraes, referindo-se, sem citar nomes, ao ex-presidente Jair Bolsonaro, o investigado principal dos inquéritos que miram os atos antidemocráticos.